
Fernanda Oliveira é cientista ambiental e pesquisadora na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Membra da Liga das Mulheres pelo Oceano. Atualmente, atua nas áreas de conservação e impactos das atividades humanas nos ecossistemas costeiros
Fernanda Oliveira é cientista ambiental e pesquisadora na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Membra da Liga das Mulheres pelo Oceano. Atualmente, atua nas áreas de conservação e impactos das atividades humanas nos ecossistemas costeiros
Antes de explicar o que está por trás da fuga de cérebros que acontece no Brasil, é importante contextualizar a realidade da ciência no País. Embora a maior parte das grandes descobertas científicas brasileiras venha de universidades públicas, a profissão “cientista” não é regulamentada aqui.
Então, quem faz ciência nas universidades? As pesquisas são coordenadas por pesquisadores (professores concursados com grande experiência) mas as equipes são formadas em sua maioria por estudantes de graduação, mestrado e doutorado.
Esses estudantes não estão apenas “estudando”: eles entram com projetos próprios, desenvolvem pesquisas científicas, escrevem artigos, analisam dados e até orientam colegas. Muitos alunos de graduação também participam, por meio da iniciação científica.
Ou seja, todos eles já atuam como cientistas, embora sociedade e mercado raramente reconheçam isso. Essa é a primeira razão da fuga de cérebros.
Pense no seguinte: você fez a graduação e passou 2 anos em iniciação científica, depois 2 anos de mestrado e 4 de doutorado.
Ao todo, 8 anos de experiência em pesquisa, que incluem coleta e análise de dados, escrita e publicação de artigos, gestão de projetos, liderança, trabalho em equipe, comunicação científica, uso de ferramentas tecnológicas e estatísticas, além de pensamento crítico, resolução de problemas e capacidade de adaptação. Habilidades valorizadas em qualquer mercado.
Mas, ao sair do doutorado, não há emprego porque o mercado não reconhece essas competências e acredita que, nesses 8 anos, tudo o que você fez foi “apenas estudar”. É natural que, nessa situação, muitos decidam mudar de área ou até de País.
Agora, imagine que todo esse período foi financiado apenas por bolsas de pesquisa que raramente são reajustadas, sem Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), férias, décimo terceiro, limite de horas trabalhadas ou qualquer outro direito trabalhista. Esse é o segundo motivo.
E, por fim, pense que todo o conhecimento produzido, artigos publicados e resultados obtidos nesse tempo não têm o devido reconhecimento da sociedade. Você precisa explicar e justificar a importância do seu trabalho quase sempre, até para as pessoas mais próximas.
Essas são as principais razões pelas quais cientistas brasileiros migram para outras áreas ou países: desvalorização, falta de investimento e ausência de reconhecimento.
E, mesmo diante desse cenário, grandes descobertas continuam sendo feitas no Brasil, como as mais recentes: o fármaco desenvolvido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com potencial para reverter a paralisia e a pesquisa da Universidade Federal de Goiás (UFG) que mostrou a possibilidade de usar cera de ouvido como marcador para detectar câncer.
Reconhecer o trabalho dos cientistas é essencial, e isso começa pela sociedade. É preciso valorizar nossos pesquisadores e lutar para que tenham as condições necessárias para desenvolver suas pesquisas. Só assim continuaremos conquistando grandes avanços científicos.
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