Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Há um conjunto importante de brasileiros hoje para os quais a realidade dos fatos não se basta como informação orientadora do dia a dia.
É o que consegue justificar algumas reações, inclusive de gente que se tem como esclarecida e capaz de guardar distância do ambiente tóxico em que a política nacional está transformada faz algum tempo, às descobertas recentes de investigadores da Polícia Federal sobre os movimentos de pessoas ligadas ao governo anterior, na gestão Jair Bolsonaro, que de maneira muito clara indicavam a organização de um plano para impedir que fosse respeitado o calendário eleitoral que previa uma passagem de comando no poder em 1º de janeiro de 2023. No caso, para mãos oposicionistas.
Há quem opte por permanecer silente, evitando emitir opinião acerca dos eventos que cercaram os momentos tensos do fim de 2022 e que resultaram em coisas como aquele 8 de janeiro de 2023 assustador em Brasília.
Ficar calado parece um ato de covardia individual que, no caso, até entendo como menos grave do que abraçar de maneira aberta a ideia de que se deve minimizar as descobertas da investigação porque, afinal, nada aconteceu de concreto.
Havia muito plano, bastante intenção, energia de sobra no discurso, mas, no final das contas, alega-se, Jair Bolsonaro deixou o poder, Lula instalou-se no Palácio do Planalto e vida que segue.
Não é assim, porém. A recuperação de parte do que se conversava nos bastidores dos círculos ligados ao poder na época, entre eleição e posse, mostra que estivemos muito próximos de um rompimento institucional que, ironicamente para quem o vende como um obstinado na defesa do que acredita, somente não foi levado adiante porque faltou coragem a Bolsonaro, muito embora vontade lhe sobrasse.
Uma fragilidade pessoal que não tira um só pedaço de sua responsabilidade objetiva e que nos parece hoje bem vinda porque no entorno dele havia malucos suficientes dispostos a levar adiante uma ideia que não tinha como prosperar, concordo com quem defende a tese de que um golpe de Estado seria insustentável a médio prazo diante do contexto geopolítico.
O que assusta, hoje, é que muita gente, embora represente uma minoria barulhenta e que influi no debate, busque naturalizar o que está revelado nos relatórios policiais encaminhados à justiça.
Conversas graves, ameaças explícitas, diálogos que envolviam até um plano organizado de eliminar autoridades, monitoramentos definidos e já em execução, quase nada ali dizia respeito a um interesse coletivo real, à preocupação em proteger o Estado e a democracia. Pelo contrário.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por exemplo, não tem nada oficialmente a dizer sobre tudo isso? Entidades representativas de magistrados, no plano federal ou em suas representações estaduais, calam por quê?
As cúpulas de UNE, Ubes e outras representações de estudantes estão de férias? Centrais sindicais acham mesmo que manter distância é o que o momento histórico espera delas?
As próprias entidades que se organizam em torno dos jornalistas e do jornalismo não acham que deveriam ter posição pública mais enfática em defesa da democracia, que era o alvo real dos ataques?
A verdade é que no contexto dos silêncios há alguns que parecem difíceis de aceitar ou mesmo de explicar.
O marasmo coletivo, fora da briga direta entre lulistas e bolsonaristas, é cortado apenas por manifestações isoladas indignadas nos espaços jornalísticos e plenários de disputas políticas, preocupando tanto quanto aquilo que está relevado nas conversas de militares e agentes de segurança diretamente envolvidos com uma operação que teria dado certo e nos trazido para a incerteza caso houvesse gente mais competente organizando-a e, na ponta das decisões finais, estivesse um líder realmente desassombrado, que é como Jair Bolsonaro se vende e como é visto pelos seus adoradores. Foi o destino, portanto, que nos salvou do pior.
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