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Constelação Familiar não é ciência, nem religião
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Psicoterapeuta sistêmico com especialização em Psicologia Transpessoal e Psicoterapia Somática Integrada. Viveu na Índia onde se aprofundou em diversas abordagens terapêuticas e de meditação. Fez cursos e supervisão em Constelação Familiar com Bert e Sophie Hellinger e foi o introdutor da Constelação no Ceará; Ashara atende individualmente e ministra cursos de formação em Constelação em diversas cidades do Brasil. Veja mais: www.ashara.com.br

Guilherme Ashara comportamento

Constelação Familiar não é ciência, nem religião

Entenda porque a Constelação não é psicoterapia, nem religião, como também não é ciência da forma que muitos definem a ciência
Tipo Opinião

Nessas últimas semanas vieram à público através do Jornal O Globo uma crítica bem negativa sobre a Constelação Familiar no Judiciário. Uma das críticas é a de que Constelação não é ciência. Resolvi falar um pouco sobre o tema para explicar que Constelação não é psicoterapia, nem religião, como também não é ciência da forma que muitos definem a ciência.

Primeiramente a Constelação não é um processo psicoterapêutico porque ela foi desenhada por Bert Hellinger para acontecer em apenas uma sessão. Você traz uma questão de relacionamento, um problema de saúde ou uma questão organizacional e o constelador lhe ajuda a olhar para o seu sistema - familiar ou organizacional - na busca de descobrir o quê está travado, emaranhado ou incompreendido.

Se, por exemplo, um membro de uma família ou sistema organizacional foi desonrado, excluído ou não visto, esse sistema vai, de alguma forma, compensar essa exclusão. Se houve um crime e o mesmo não foi reparado, é provável que alguém desse sistema vá inconscientemente repará-lo ou expiá-lo.

Isso acontece porque o sistema não admite exclusões. Uma das Ordens do Amor do Bert Hellinger – idealizador das Constelações, é traduzida na expressão: “Todos têm o mesmo direito de pertencer.” Quando negamos esse direito a alguém do sistema, um outro membro ‘é escolhido’ pela força sistêmica e vai compensar essa exclusão. Ele pode fracassar, adoecer ou até mesmo morrer para compensar (inconscientemente, repito) aquela exclusão.

"O constelador precisa chegar a um nível de consciência que é além da crença, além do julgamento. Ele precisa aprender a olhar para o sistema familiar do cliente como quem não sabe e não como quem sabe."

A Constelação Sistêmica trabalha muito com casos de aborto. Compreendemos através das Constelações que o aborto é uma espécie de exclusão. O filho abortado foi negado, rejeitado, excluído. E esse ato de abortar gera muitas consequências para a mãe, como também para o casal. Nas constelações olhamos para os efeitos de um aborto e, através de ‘frases de solução’, damos passos para que esse filho abortado seja visto e acolhido pelo sistema familiar.

Isso não significa dizer que a Constelação é contra o aborto, ou mesmo que ela é a favor do aborto. Ela simplesmente diz que o aborto traz consequências e que precisamos perceber e assumir essas consequências.

Porém, se o constelador tem uma crença que renega o aborto, ele vai provavelmente pregar que a constelação é contra o aborto. Ele vai transformar a constelação em uma religião. Essa talvez seja uma das grandes dificuldades de ser um constelador. O constelador precisa chegar a um nível de consciência que é além da crença, além do julgamento. Ele precisa aprender a olhar para o sistema familiar do cliente como quem não sabe e não como quem sabe.

"Cada pessoa tem uma experiência única de vida e a solução das suas questões terá que ser única e individual."

E eu ampliaria essa compreensão para todos as psicoterapias. Quando olhamos para uma questão de um cliente como quem sabe, estamos na verdade olhando para o nosso conhecimento, para a nossa crença e consequentemente já perdemos contato com o cliente e com aquilo que ele está trazendo naquele momento.

Bert Hellinger chamou esse olhar de ‘fenomenológico’, isto é, a capacidade de olhar para o fenômeno sem julgamento, da forma que ele se apresenta no momento.

E por fim a Constelação não é ciência, porque a ciência é por definição lógica, cartesiana e comprovável. A Constelação, por outro lado, lida com questões humanas e sabemos que cada ser humano é único e incomparável. Então, não podemos aplicar em um aquilo que serviu para o outro. Cada pessoa tem uma experiência única de vida e a solução das suas questões terá que ser única e individual.

Por exemplo, quando trabalho com relacionamentos nunca sei de antemão se aquela relação vai continuar ou se vai haver uma separação. Para alguns casais a solução será a separação, porém para outros a solução pode ser a continuidade da relação, mas para que eu, como terapeuta, veja isso não posso ter o ‘pré-conceito’ de que o melhor é a união ou ter a crença de que o casamento é indissolúvel.

Então, o que é Constelação Familiar?

Em poucas palavras, Constelação Familiar é a compreensão que vivemos num organismo unificado que aqui chamamos de sistema. Esse organismo como o nosso sistema corporal é interdependente, isto é, um órgão depende do outro, mas cada um deles é um sistema individual e único. Então, tudo que acontece no sistema unificado se reflete no sistema individual e vice-versa.

Se olharmos para a família, tudo que acontece com os membros da família se reflete no sistema familiar como um todo; e tudo que o sistema familiar experimenta se reflete no indivíduo - membro desse sistema.

"Vocês acham que tudo o que existe precisa ser incluído dentro da ciência ou da religião?"

Termino com uma pergunta para reflexão: vocês acham que tudo o que existe precisa ser incluído dentro da ciência ou da religião? Será que existe algo na existência que não pode ser enquadrado nessas duas áreas da vida? Onde enquadramos o amor, a música, a poesia, a dança? Em ciência ou em religião? Não, certamente não precisamos enquadrar tudo!

Na minha percepção, a Constelação é uma dessas ferramentas existenciais que não necessariamente precisa ser enquadrada. Nos a valorizamos pelo efeito que ela produz em quem a utiliza. Pra mim, isso já é mais que suficiente.

Namastê!

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