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Como nasce (e renasce) um teatro
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Magela Lima é jornalista e professor do Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), doutor em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Magela Lima opinião

Como nasce (e renasce) um teatro

.O Teatro Carlos Câmara de hoje pode, e deve, encontrar o de ontem, sem medo de errar, permitindo que os artistas e seus públicos se arrisquem e se deslumbrem diante do novo, que tarda, mas sempre vem.
Tipo Opinião
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FORTALEZA-CE, BRASIL, 04-11-2025: Reabertura do Teatro Carlos Câmara. Nas fotos, o teatro passa pelos últimos ajustes antes de sua abertura. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo) (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA-CE, BRASIL, 04-11-2025: Reabertura do Teatro Carlos Câmara. Nas fotos, o teatro passa pelos últimos ajustes antes de sua abertura. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)

Na história do teatro, são muitos os desejos envolvidos na decisão de abrir uma sala ou uma casa de espetáculos. No Brasil, desde o século XVIII, o que se tem visto é o cruzamento de interesses os mais variados, nem sempre pautados por uma provocação de natureza propriamente artística. Dito de outra forma: nem todo teatro nasce para receber uma cena anterior, carente de um palco para chamar de seu. Teatros nascem para ornar cidades, teatros nascem para elevar valores moreis e nascem também - muitas vezes, inclusive - simplesmente por nascer.

Contrariando esse panorama, o Teatro Carlos Câmara (Rua Senador Pompeu, 454 - Centro, Fortaleza) veio ao mundo com um plano muito bem traçado. Inaugurado em 5 de outubro de 1974, reinaugurado em 5 de setembro de 2012 e (re)reinaugurado no último dia 5 de novembro, o equipamento abriu suas portas já com a coxia e a plateia ávidas pelo momento do encontro. Da lavra do gigante Haroldo Serra, o Carlos Câmara surge para abarcar uma criação e uma geração para as quais o Theatro José de Alencar, de 17 de junho de 1910, havia ficado, por incrível que pareça, pequeno.

Seu Haroldo viveu na própria pele o esforço de dotar o teatro em Fortaleza de uma dinâmica menos esporádica. Ele sonhou com companhias estabelecidas, criou sua Comédia Cearense em 1957, brigou para regularizar temporadas para os espetáculos locais, vibrou com a possibilidade de formação continuada de novos artistas. Fato é que, na década de 1970, para alegria de Seu Haroldo e outros santos rebeldes como ele, havia mais teatro em Fortaleza do que o velho José de Alencar era capaz de comportar. Isso, sem contar, o que, frequentemente, mambembava entre nós.

Assim, o Carlos Câmara nasce com o compromisso de receber e difundir não um teatro qualquer, mas um teatro em franco e deliberado processo de experimentação. O Carlos Câmara era o teatro público possível para quem estava começando trajetórias e projetos, era o teatro público onde o risco, o improviso, o novo, enfim, eram possíveis e intensamente desejados. O Carlos Câmara, estrategicamente, servia como vitrine ao que ainda era da ordem do processo, da elaboração.

A geração da década de 1970, politicamente aninhada em torno da tese do teatro independente, fez ali sua morada. De algum modo, a filiação poética desse movimento ainda pulsa na cidade e pode voltar a ocupar o (re)reinaugurado Carlos Câmara. Garantir possibilidade de criação e circulação ao que ainda não se entende por acabado e definitivo é de um valor simbólico imenso. O Carlos Câmara de hoje pode - e deve - encontrar o de ontem, sem medo de errar, permitindo que os artistas e seus públicos se arrisquem e se deslumbrem diante do novo, que tarda, mas sempre vem.

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