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Por que tiramos os enfeites da caixa sob a cama
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Marília Lovatel cursou Letras na Universidade Estadual do Ceará e é mestre em Literatura pela Universidade Federal do Ceará. É escritora, redatora publicitária e professora. É cronista em O Povo Mais (OP+), mantendo uma coluna publicada aos domingos. Membro da Academia Fortalezense de Letras, integrou duas vezes o Catálogo de Bolonha e o PNLD Literário. Foi finalista do Prêmio Jabuti 2017 e do Prêmio da Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil – AEILIJ 2024. Venceu a 20ª Edição do Prêmio Nacional Barco a Vapor de Literatura Infantil e Juvenil - 2024.

Por que tiramos os enfeites da caixa sob a cama

"Debaixo dos adereços importados, pulsa o coração de uma família brasileira em atmosfera de aconchego, saudade, gratidão, pertencimento..."
Os enfeites de Natal. (Foto: Tatiana Fortes, em 27/11/2012) (Foto: TATIANA FORTES)
Foto: TATIANA FORTES Os enfeites de Natal. (Foto: Tatiana Fortes, em 27/11/2012)

As festas se repetem porque é preciso alimentar o espírito com memórias. As celebrações acontecem anualmente para confirmar a importância do que as motiva e presentear as gerações vindouras com o direito garantido às que as antecederam.

Sempre me emociono vendo a árvore que minha filha ergue na sala, com o seu capricho habitual na escolha dos enfeites — são os mesmos retirados da caixa sob a cama, porém, em todos os Natais, ela elege um tom, uma cor predominante, realiza a proeza de obter um resultado único, singular, diferente a cada dezembro.

Ligar a iluminação — não reciclada — é instante mágico, momento solene. E, nessa hora, acendem dentro de mim os piscas-piscas de luzes grandes do meu passado, quando não havia caixinhas com leds descartáveis.

Não vinham da China o festão sintético nem as guirlandas temáticas nem os laços armados de cetim nem a estrela de plástico para o topo nem o saiote de feltro ou veludo de vestir a base.

A estrutura natural era colhida por meu pai no meio da mata do sítio em Guaramiranga. A neve era o algodão que minha mamãe enrolava nos galhos. E, igualmente, naqueles dias de afeto latente, experimentávamos a solenidade e o encanto do primeiro acendimento. Uma lindeza aquilo.

Olhos infantis e adultos arregalados para a Árvore de Natal improvisada pelo desvelo previsto. Organismo genealógico, que se ramifica e atravessa o tempo, me traz à reflexão diante do trabalho habilidoso de Marcelinha.

Debaixo dos adereços importados, pulsa o coração de uma família brasileira em atmosfera de aconchego, saudade, gratidão, pertencimento.

Dentro dessa tradição milenar, uma história de amor se abriga, floresce e se perpetua. É preciso que seja assim, que se conceda à alma a esperança num mundo que respeite e cuide de todas as crianças, que lhes permita crescer com recordações felizes e envelhecer se lembrando, décadas depois, de gestos que dão sentido à utopia do bem universal.

Foto do Marília Lovatel

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