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"Apolo": documentário se apoia na força da família e do amor
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Jornalista, repórter do O POVO+ e professor de Linguagens, graduado em Letras/Inglês pelo Centro Universitário Unicesumar. Homem pansexual, foi ativista organizado do Movimento LGBTQIA+ de 2014 a 2021. Em 2020, foi um dos idealizadores do festival artístico Tomada Drag, que mais tarde se tornaria o Coletivo Tomada.

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"Apolo": documentário se apoia na força da família e do amor

Dirigido por Tainá Müller e Isis Broken, o filme ganhou o prêmio de Melhor Longa-Metragem Documentário no 27º Festival do Rio e chega aos cinemas em 27 de novembro
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Primeiro trabalho na direção da atriz Tainá Müller e da artista musical e mulher trans Isis Broken, o documentário em longa-metragem está em exibição no 33º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, maior evento cultural LGBTQIAPN+ da América Latina (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Primeiro trabalho na direção da atriz Tainá Müller e da artista musical e mulher trans Isis Broken, o documentário em longa-metragem está em exibição no 33º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, maior evento cultural LGBTQIAPN+ da América Latina

Do que você abriria mão em nome do amor?

O documentário "Apolo", dirigido por Tainá Muller e Isis Broken, vai a fundo nessa questão a partir de uma narrativa sensível e íntima: a gestação e o nascimento de Apolo, o primeiro filho de Isis e do seu companheiro, Lourenzo.

O casal, formado por duas pessoas trans, narra memórias dispostas na tela como um álbum de fotos, que revisitamos quando tiramos caixas guardadas nos fundos dos armários.

Algumas são doces e gentis, enquanto outras são doloridas e amargas. Mas a honestidade com que todas são tratadas é a grande marca do filme e da história dessa família.

A narrativa não esconde, em momento algum, os conflitos entre os parentes e nem as violências que os pais de Apolo sofrem no carro de aplicativo, na rua e no hospital.

Esse é o grande acerto do documentário. Mostrar tudo, sem retoques, inclusive pela perspectiva de uma câmera digital que não sai das mãos de Isis.

A sinceridade da câmera funciona também como um manifesto muito bem escrito. Sem rodeios e sem excesso de didatismo, o público é apresentado ao core da violência transfóbica e expõe a urgência da luta pela manutenção e ampliação de direitos, como o ambulatório especializado.

O elemento íntimo também é muito bem trabalhado, afinal, trans ou cis, a experiência da maternidade e da paternidade de primeira viagem só é vivida uma vez por cada indivíduo.

"Apolo" acompanha a jornada de uma família formada por um casal transgênero revelando as nuances do amor(Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação "Apolo" acompanha a jornada de uma família formada por um casal transgênero revelando as nuances do amor


O casal enfrenta dilemas impossíveis pensando no que é possível proporcionar ao filho sem que se coloquem em uma posição de mais vulnerabilidade física e emocional.

Isis, por exemplo, deixa sua própria cidade, sua família e seus amigos para trás em busca de um pré-natal digno para Lourenzo.

As mudanças no corpo e na mente dos pais aparecem no tempo certo e na medida suficiente para emocionar sem sensacionalismo.

Eu, que naturalmente sou uma pessoa chorona, não contive as lágrimas em alguns momentos. Especialmente durante a visita aos avós de Lourenzo.

A simplicidade do amor e das palavras reconfortantes daquela figura de vestido florido falam de uma forma de ver o mundo que é mais simples e acolhedora.

Quando a avó se recorda da própria experiência, uma gestação solitária e sem rede de apoio, deixa de lado quaisquer expectativas, preconceitos e julgamentos e se coloca no lugar do neto, morando a milhares de quilômetros de distância e enfrentando enjoos incapacitantes.

"Seja para essa criança o que você mesmo não pôde ter. Aproveite a família que você tem agora", diz ela.

Me parece oportuno, aliás, centrar a narrativa em torno da família.

Apolo vem para lembrar que é, sim, preciso proteger as famílias e as crianças, sobretudo daqueles que insistem em destilar ódio e preconceito.

Em um mundo fragmentado, onde parece que só essa instituição milenar é capaz de resistir às cisões e aos conflitos, a política institucional não hesitou em sequestrar o conceito de família para propor todo tipo de atrocidades em seu nome.

E se há quem insista em deslegitimar a vida de pessoas trans, "Apolo" responde com o registro inegável da vida que pulsa. É um grito de amor que exige respeito, direitos e, acima de tudo, a chance de viver.

Foto do Mateus Mota

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