É o(a) profissional cuja função é exclusivamente ouvir o leitor, ouvinte, internauta e o seguidor do Grupo de Comunicação O POVO, nas suas críticas, sugestões e comentários. Atualmente está no cargo o jornalista João Marcelo Sena, especialista em Política Internacional. Foi repórter de Esportes, de Cidades e editor de Capa do O POVO e de Política
Não foi a primeira vez que li na imprensa uma crítica gastronômica ou uma resenha de algo com um tom mais mordaz. A minha surpresa, assim como pareceu ser a de muitos pelo que pude acompanhar nos comentários, estava mais em ler um tipo de texto jornalístico que se tornou menos habitual ao longo dos últimos anos
Foto: FERNANDA BARROS
FORTALEZA, CEARÁ, 17-01-2024: Massa italiana e pudim de café, são os pratos diferenciais do restaurante Del Plata. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)
Eu estava num desses momentos desafortunadamente corriqueiros nos quais a mente entra em latência após uma porção de minutos rolando a tela do celular quando uma postagem no feed do Instagram da Folha de S.Paulo capturou minha atenção. A publicação era referente a avaliação crítica de um restaurante da capital paulista cujo título é: “Lasanha do Pappagallo, nos Jardins, é soco no estômago”.
O texto assinado pela crítica gastronômica da Folha Priscila Pastre começa dando “algumas dicas para você saber se o restaurante serve pratos que tentam disfarçar a inabilidade da cozinha: receitas com muito creme, muito alho, fritura onde não precisa e apresentações ostensivas que caem melhor nas redes sociais do que na sua boca”. Em seguida, arremata. “O Pappagallo tem tudo isso. O carro-chefe da experiência é a lasanha (R$ 94). Não por coincidência, é ela a opção mais instagramável do cardápio”.
A autora segue desenvolvendo a avaliação, sempre com um tom crítico à lasanha e a outros pratos da casa. “A entrada foi croqueta de ossobuco (R$ 60). Um empanado grosseiro envolvendo um recheio macio, mas com fiapos ressecados de carne. O pudim de cumaru (R$ 48) estava bom. Pena que muito doce, o que inibiu o sabor da especiaria”, complementa lá pelas tantas no texto. Importante destacar a ressalva de que as visitas realizadas para análise são anônimas e custeadas pelo jornal.
Curioso, fui logo aos comentários da postagem para ver a reação das pessoas. “Gosto de críticas verdadeiras, mas achei pesado e sarcástica essa, pra queimar mesmo o restaurante. Se eu fosse a dona tomaria medidas jurídicas com certeza”, lamentava uma seguidora. “Essas reviews agressivas da Folha tão demais, acabando com o hype de restaurante que contrata influencer”, se divertia outra. “Queria resenhas ‘realistas’ assim para o governo Tarcísio”, ironizava um terceiro.
Não foi a primeira vez que li na imprensa uma crítica gastronômica ou uma resenha de algo com um tom mais mordaz. A minha surpresa, assim como pareceu ser a de muitos pelo que pude acompanhar nos comentários, estava mais em ler um tipo de texto jornalístico que se tornou menos habitual ao longo dos últimos anos.
Em paralelo a isso, passou a ser parte da paisagem do dia a dia estarmos sujeitos ao bombardeamento de influenciadores fazendo as mais variadas “publis”. É nas redes que passamos a descobrir novos restaurantes e é para o público das redes que os estabelecimentos cada vez mais parecem estar voltados.
A cobertura de gastronomia do O POVO
O POVO, por exemplo, não tem como prática já há alguns anos uma avaliação mais crítica de restaurantes ou de bares de Fortaleza. As matérias do caderno Comes&Bebes, publicado no jornal impresso às sextas-feiras, habitualmente têm como mote a abordagem sobre um tipo de prato específico ou de um ingrediente. A partir disso, são elencados três ou quatro estabelecimentos como dicas de locais para que os leitores possam conferir os pratos tratados naquele conteúdo.
“A crítica gastronômica, para ser justa, embasada e não apenas opiniosa, demanda bastante repertório, conceitual e de experiência prática, daqueles que se dedicam a essa atividade. No O POVO, já tivemos, no passado, profissionais que atuaram neste campo. Atualmente, o caderno Comes&Bebes e todas as matérias que o Grupo realiza em suas diferentes mídias e plataformas têm como foco a oferta de serviços ao leitor”, afirma.
Perguntei a Clóvis se ele avalia que o público leitor vê a crítica gastronômica de uma forma diferente da que lê uma resenha de um filme, de um livro ou de um disco, por exemplo.
“A lógica da crítica é a mesma, mas quando falamos de gastronomia, diferentemente de um filme ou música, estamos tratando de uma experiência multissensorial que envolve relevante investimento financeiro, expectativas subjetivas, além de uma relação física com o objeto em análise, que será processado e apreciado na deglutição e depois absorvido pela digestão. Dada a complexidade do processo que forma o ciclo da cozinha, do cozimento à boca do comensal, é imperativa a necessidade de o crítico de gastronomia ter um amplo conhecimento e domínio de técnicas, insumos, noções das grandes cozinhas internacionais, como a francesa, a italiana e a japonesa, todas muito influentes na gastronomia mundial”, explica.
Por fim, Clóvis pontua que o trabalho de influenciadores digitais não pode ser considerado uma crítica gastronômica no sentido clássico da função e com todas as responsabilidades e critérios que a atividade impõe.
“O que não quer dizer que críticos tradicionais no mundo não tenham passado a usar as mídias digitais como plataforma de seus conteúdos. O que os profissionais da web geralmente fazem são experiências narradas, nas quais compartilham impressões pessoais sobre o que estão consumindo. Cabe ao espectador dar a importância e a relevância que lhe convier para tais postagens a partir do quanto aquele conteúdo for se mostrando informativo e relevante para cada uso”, finaliza.
A comida como símbolo cultural
Concordo com Clóvis quando ele cita a necessidade de que os profissionais tenham um embasamento para tecer uma avaliação crítica de um prato oferecido por um estabelecimento. Assim como este é fator indispensável na apreciação de um filme, de um álbum musical ou de um livro. Sem dúvida é importante que veículos de imprensa invistam em profissionais habilitados nesse tipo de avaliação se quiserem seguir também por esse caminho analítico.
Agora é preciso entender a gastronomia como uma linguagem cultural, assim como o cinema, a música, a literatura e as artes plásticas. Há cultura desde a colheita ou a produção do alimento, no preparo de um prato e na forma como ele é ingerido. Perspectivas históricas, sociais, políticas e econômicas estão intrinsecamente ligadas ao ato de comer, que deve ser entendido como uma forma de manifestação de um povo. Seja em um restaurante no qual vamos em ocasiões especiais, seja nas refeições do dia a dia. O aspecto cultural da gastronomia é um fator que o jornalismo sempre deve ter em vista.
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