Bióloga e mestre pela Universidade Federal do Tocantins, Raquel da Silva Acácio possui mais de 15 anos de experiência em gestão ambiental, coordenação de equipes multidisciplinares e condução de programas de monitoramento de fauna, flora e ecossistemas aquáticos na Amazônia e no Cerrado. Na Fazenda do Futuro e no Hotel EcoAraguaia, atua na interface entre ciência, regeneração e gestão territorial, promovendo modelos inovadores de convivência entre natureza, comunidades e economia local — onde liderança e cuidado caminham lado a lado, como expressão viva de amor pela Terra.
Aqui na Fazenda do Futuro, sentimos essas raízes pulsarem sob os pés. O solo vermelho do Araguaia é mais do que matéria: é memória
Há sementes que nascem antes de serem plantadas. Germinam em silêncio, no húmus do tempo, à espera do instante certo para romper a terra. Assim também é com a Economia Profunda — uma semente antiga
que agora encontra solo fértil para florescer.
O que chamamos de “nova economia” é, na verdade, o desabrochar de algo muito antigo: um modo de viver que reconhece a Terra como mãe e mestra, e o humano como parte do seu próprio corpo.
Foto: Acervo pessoal
Biblioteca Floresta
Na base dessa economia viva estão três raízes entrelaçadas, como filamentos subterrâneos que sustentam a mesma árvore:
A Ecologia Profunda, de Joanna Macy, convida-nos a sentir a dor do mundo e transformá-la em ação regeneradora. É a consciência que desperta o interser, reconhecendo que toda forma de vida está intrinsecamente ligada à teia do existir.
O Soil–Soul–Society, de Satish Kumar, recorda-nos que a alma humana é inseparável do solo e da comunidade. Nessa espiritualidade cotidiana, o simples ato de plantar, cozinhar ou cuidar deixa de ser rotina e se torna ritual — parte de um ciclo sagrado que devolve sentido à vida.
A Perspectiva Gaia revela a Terra como um organismo vivo e consciente, do qual somos células pulsantes. Essa cosmovisão planetária nos chama a pensar, sentir e agir como parte do próprio metabolismo da Terra — uma economia que respira, se move e floresce com o planeta.
Quando essas três forças se encontram, forma o sistema radicular da regeneração — um modo de viver que une ciência, espiritualidade e ação comunitária. Mas o que isso nos mostra? Que a economia não é uma engrenagem isolada, mas um fluxo contínuo de energia, matéria e significado que sustenta a vida.
Não há separação entre espiritual e material, entre cultura e natureza, entre eu e nós. Tudo é relação. Tudo é dádiva. O que oferecemos à vida retorna multiplicado; o que negamos à Terra, negamos a nós mesmos.
Aqui na Fazenda do Futuro, sentimos essas raízes pulsarem sob os pés. O solo vermelho do Araguaia é mais do que matéria: é memória. Cada passo revela a sabedoria das águas que correm invisíveis sob a superfície, lembrando-nos que toda abundância vem da profundidade.
Um exemplo concreto desse florescimento é a Escola Floresta, que abriga também a Biblioteca Floresta — um espaço de aprendizagem viva onde natureza, cultura e comunidade se entrelaçam.
Ali, as aulas acontecem sob as árvores, e os livros convivem com sementes, insetos e sons de pássaros. Na Biblioteca, o saber da floresta ganha voz — livros, desenhos e experiências se tornam pontes entre o conhecimento científico e o saber ancestral, a educação deixa de ser transmissão e se torna relação: corpo, território e espírito aprendendo juntos.
Essa experiência sintetiza o que é a Economia Profunda em ato: um processo educativo que regenera o solo e, ao mesmo tempo, o sentido de comunidade.
Viver a partir dessas três raízes é viver no ritmo da regeneração.
Significa desacelerar para escutar o que a Terra pede.
Significa redesenhar nossos sistemas produtivos — mas também nossos gestos diários.
No coração do Araguaia, compreendemos que regenerar é lembrar. Lembrar que a Terra nunca deixou de falar conosco — fomos nós que esquecemos sua língua. As raízes vivas da Economia Profunda nos convidam a reaprender essa linguagem: a linguagem do ciclo, da partilha e da presença.
E quando voltamos a escutá-la, descobrimos que a nova economia já está acontecendo — silenciosa e persistente — em cada gesto de cuidado, em cada comunidade que se reconecta, em cada semente que insiste em brotar. O futuro floresce no solo das nossas relações.
Este artigo integra a série “Economia Profunda”, um conjunto de ensaios sobre as múltiplas dimensões da regeneração da vida.
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