Em maio deste ano, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PSL), publicou um decreto que flexibilizava o porte e a posse de armas de fogo no País. No texto, o presidente pretendia estender o porte para quase 20 categorias profissionais, entre elas, caminhoneiros, advogados, agentes de trânsito, conselheiros tutelares e, até mesmo, jornalistas de cobertura policial.
Toda quarta-feira, até 25 de setembro, O POVO traz um tema para a Redação do Enem, em formato semelhante a este.
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O decreto — revogado pelo próprio Bolsonaro no último mês de junho — foi anunciado poucas semanas depois do episódio em que dois adolescentes entraram armados na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, São Paulo, e dispararam contra estudantes e funcionários de lá. Massacre que abalou o País e que resultou em dez pessoas mortas, incluindo os atiradores.
Na época da tragédia, o senador Major Olímpio (PSL-RJ), líder do partido do presidente no Senado, argumentou que, “se houvesse um cidadão com arma regular dentro da escola, professor, servente ou policial aposentado, poderia ter minimizado o tamanho da tragédia”.
Entenda, a seguir, como o debate armamentista afeta o ambiente escolar.
Legislação e controle nacional
Qual a diferença entre posse e porte de arma?
Posse
A posse consiste em manter a arma de fogo dentro de casa ou no ambiente de trabalho.
Porte
É, basicamente, andar armado fora de casa ou fora do ambiente de trabalho em que é permitida a posse da arma.
A posse, no Brasil, pode ser concedida pela Polícia Federal a cidadãos comuns desde que eles obedeçam às regras estabelecidas para a comercialização e registro do armamento. Já o porte é restrito a, por exemplo, profissionais de segurança, policiais e agentes das Forças Armadas.
O que a legislação nacional entende como crime?
Flexibilização
O presidente Jair Bolsonaro decretou a flexibilização do porte e da posse de armas em maio deste ano. Porém, pressionado pela repercussão, revogou o decreto no último mês de junho e optou por enviar suas propostas como projeto de lei para análise da Câmara, onde, até este momento, permanece.
Segurança pública
A flexibilização do porte e da posse de armas no Brasil desperta a preocupação de estudiosos da segurança pública com o aumento da circulação de armas e, consequentemente, a maior possibilidade de conflitos em ambientes e situações como num bar ou no trânsito.
Há evidências, no País, de que a cada 1% a mais de armas de fogo em circulação, há aumento de 2% na taxa de homicídio.
Segundo o Atlas da Violência 2019, a presença de armas de fogo nos lares também aumenta as mortes dos moradores, tanto por questões que envolvem crimes passionais e feminicídios como porque aumentam as chances de suicídio e de acidentes fatais, incluindo crianças.
No Brasil…
Em 2017, 47,5 mil homicídios foram cometidos com uso de arma de fogo. Esse dado é 6,8% maior do que o observado em 2016 e 39,1% maior do que o registrado em 2007. Se considerarmos a série histórica, entre 1980 e 2017, essa estatística chega a 955 mil.
Enquanto isso, no Ceará…
O número de homicídios por arma de fogo cresceu 283,8% entre 2007 e 2017.
“A restrição dificulta, num momento de conflito, de desavença, de a pessoa se valer da arma de fogo.” Ricardo Moura, pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC) e colunista do O POVO.
Mercado ilegal
Parte das armas legais pode ser extraviada ou roubada e, assim, cair no mercado ilegal.
Violência nas escolas
Armas nas escolas?
Ouvimos uma psicóloga, uma socióloga e um pesquisador. Os três garantiram que escola não é lugar de arma e, sim, de ensino, aprendizado e mediação de conflitos.
Miriam Abramovay, socióloga, pesquisadora, doutora em educação e coordenadora do programa Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, argumenta que alguns jovens podem ver nas armas de fogo símbolo de status e poder e, por isso, querer portá-las e exibi-las no ambiente escolar, sem que haja intenção de ferir ninguém.
A psicóloga, psicanalista e professora da Universidade de Fortaleza (Unifor), Sabrina Serra Matos, assegura que armar professores com a justificativa de oferecer proteção pessoal a eles ou para lidar com conflitos dentro da escola não faz diminuir a violência. “A via tem que ser do diálogo, do discurso e da educação, sempre."
Ricardo Moura observa que autorizar a professores o porte de arma coloca eles próprios em risco. “Essa proposta não tem o menor sentido. Professor está lá pra educar, dar aula, ministrar conteúdo.”
Medidas que os especialistas sugerem para melhorar a segurança do ambiente escolar
Casos de violência com arma de fogo em escolas do Brasil
Suzano, SP (13/03/2019)
Dois adolescentes entraram na escola em que estudavam e atiraram contra alunos e funcionários. Os dois se mataram logo após o massacre.
Medianeira, PR (28/09/2018)
Dois adolescentes entraram armados na escola e um deles atirou contra os colegas de classe. Um dos dois adolescentes (ambos foram apreendidos) disse à Polícia que sofria bullying.
Realengo, RJ (07/04/2011)
12 crianças morreram e 13 ficaram feridas depois que um homem entrou numa escola e atirou contra alunos em salas de aula lotadas. O atirador se matou.
Aposta do Enem
O tema desta inforreportagem foi escolhido por uma comissão de professores que compõem a banca do concurso “Redação Enem: chego junto, chego a 1.000”, uma parceria entre a Fundação Demócrito Rocha (FDR) e a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc).
A partir deste tema, estudantes da terceira série do ensino médio da rede pública e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) são convidados a escrever uma redação nos moldes do exame. As inforreportagens são publicadas às quartas-feiras até o próximo dia 25 de setembro.
Fontes: Atlas da Violência 2019 / Estatuto do Desarmamento / O POVO.Doc / Ricardo Moura, pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC) e colunista de segurança pública do O POVO / Sabrina Serra Matos, psicóloga, psicanalista e professora da Universidade de Fortaleza (Unifor) / Miriam Abramovay, socióloga, pesquisadora, doutora em educação e coordenadora do programa Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais.
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