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Covid-19: vacinação reduz óbitos e internações, mas variante Delta deve aumentar casos
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Covid-19: vacinação reduz óbitos e internações, mas variante Delta deve aumentar casos

Com imunização lenta no País, pessoas não vacinadas ou com vacinação incompleta estão sob maior risco. Com aumento de casos da variante, Europa vive risco de 4ª onda e discute restrições. Capacidade de infecção é no mínimo o dobro do vírus original
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Primeira pessoa a morrer com variante Delta no Ceará não estava vacinada (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil Primeira pessoa a morrer com variante Delta no Ceará não estava vacinada

Confirmada em pelo menos nove estados brasileiros, a variante Delta tende a provocar aumento de casos nas próximas semanas no Brasil. Conforme pesquisadores da área de epidemiologia e modelagem computacional em saúde, a vacinação deve atenuar aumento de internações e óbitos. Entretanto, pessoas não vacinadas ou com vacinação incompleta estão vulneráveis à variante, cuja capacidade de infecção é no mínimo o dobro do vírus original. Disseminação de novas cepas e afrouxamento das medidas de proteção, bem como imunização a passos lentos foram elementos observados em países da Europa, que estão sob risco de quarta onda.

A cepa tornou-se rapidamente preponderante em lugares como o Reino Unido, França e os Estados Unidos. No Brasil, já registraram casos Rio de Janeiro (87), Paraná (13), São Paulo (9), Maranhão (6), Santa Catarina (5), Minas Gerais (1),Goiás (2), Rio Grande do Sul (3), Pernambuco (2).

Pesquisa publicada no New England Journal of Medicine indica que duas doses das vacinas da Pfizer e da AstraZeneca são altamente eficazes contra a variante Delta. O estudo alerta, contudo, que apenas uma dose não garante tal proteção. A questão é que apenas 16,49% da população brasileira está completamente imunizada contra a Covid-19. O equivalente a 43% dos habitantes receberam a primeira dose.

Conforme Domingos Alves, professor e líder do Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), a segunda onda no Brasil está em descida mas há risco de agravamento. "Nas próximas semanas, vamos ver o quadro de infectados mudar. O número de óbitos deve demorar a crescer ainda", prospecta o pesquisador, membro do Covid-19 Brasil.

A projeção pode ser feita com base no atual cenário da Europa, que, na análise de Alves, tem antecipado em algumas semanas os movimentos da pandemia no Brasil. "O alerta dado para a Europa é extremamente importante para a gente. Decretamos transmissão comunitária da variante delta com delay de um mês com relação à Europa. Estados Unidos passou de 50% para 80% de pessoas infectadas com a Delta. Mas, eles têm cobertura vacinal muito maior. Cerca de 50% da população vacinada completamente, em média, nos Estados Unidos e na Europa", compara.

Levando-se em conta a parcela da população já vacinada, é possível que o número de internações e de óbitos não seja tão impactado "mas proporcionalmente vai aumentar", avalia o físico, que pesquisa modelagem computacional e sistemas de informação em saúde.

A epidemiologista Lígia Kerr, professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), corrobora: "Se não conseguirmos avançar na vacinação, poderemos ter problemas em todos os estados, incluindo o Ceará".

A vacinação deve dar um certo fôlego para vencer de forma melhor a variante Delta mas ela aponta que pessoas não vacinadas, ou com apenas uma dose, estão ainda sob maior risco. É o que está ocorrendo nos Estados Unidos. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou nessa quarta-feira, 21, que o país sofre uma pandemia entre os não-vacinados. Isso porque a grande maioria dos novos casos e óbitos pela doença vem ocorrendo entre os que não foram imunizados. "Se você for vacinado, não será hospitalizado e nem morrerá", afirmou.

"Mesmo as completamente vacinadas podem ser infectadas, pois houve uma redução na efetividade das vacinas em relação à proteção contra a Delta", alerta a médica. Conforme estudo, no caso da Pfizer, há 88% de eficácia na prevenção de casos sintomáticos da variante Delta, em comparação com 93,7% contra a variante Alfa. Para a AstraZeneca, eficácia é de 67% contra a Delta, ante 74,5% contra a Alfa. Ela frisa que população não pode abandonar o uso de máscaras, o distanciamento físico e as medidas de higiene, mesmo os vacinados.

Controle nos estados

O que deve ser feito agora é intensificar "medidas de controle entre estados para impedir a circulação da variante Delta", alerta o professor Domingos Alves. Há cerca de uma semana, Ceará implantou Centro de Testagem no Aeroporto Internacional de Fortaleza, com testagem aleatória de passageiros escolhidos de todos os voos que chegarem. Serão até 10% das pessoas, com previsão de inclusão de voos internacionais. "Tem de fazer isso. Detectou, isolou, não tem como transmitir. Deveria ampliar a amostra", avalia.

Quarta onda na Europa

Enquanto o Brasil enfrenta o risco da terceira onda, Europa está na iminência da quarta. Isso se deve às diferenças nas curvas epidemiológicas. "A nossa segunda, terceira onda acabou sendo uma onda só. Teve quedas intermediárias mas não o suficiente para caracterizar uma nova onda. A segunda onda foi cheia de altos e baixos. Por isso falam de uma terceira onda embutida", explica o pesquisador. Na flutuação de indicadores na segunda onda se deve muito provavelmente pela forma de coleta, com diferença e atrasos entre estados, conforme o pesquisador.

Exemplo da Europa

Exemplo da Europa

De acordo com o pesquisador da USP, recrudescimento no continente europeu se deve à decisão de colocar como prerrogativa principal a recuperação econômica. "Todos fizeram um plano de recuperação econômica precedendo a recuperação da pandemia e tiveram a terceira onda grave. Israel está fazendo retomada lenta e a Austrália com um, dois casos decretam lockdown", avalia, citando exemplos positivos de enfrentamento à pandemia.

A epidemiologista Lígia Kerr destaca que muitos países que haviam liberado o não uso de máscaras dentro de espaços fechados estão voltando atrás ou prolongando o relaxamento das medidas de prevenção acima citadas. "Israel voltou a exigir máscaras dentro dos ambientes, assim como regiões dos Estados Unidos, como Nova York e Los Angeles, voltaram a exigir máscaras", analisa. Disseminação de fake news tem contribuído para que parte da população americana não quer ser vacinada, prejudicando a imunização coletiva. 

"Holanda relaxou todas as medidas. Mais de mil casos foram diagnosticados após um festival de arte com ampla participação de jovens, que exigia prova de duas doses de vacina ou resultado negativo recente para RT-PCR para o SARS-CoV-2", acrescenta.

Ela cita ainda as disparidades no processo de imunização. Enquanto 26,6% do mundo está vacinado com pelo menos uma dose, somente 13,2% está completamente vacinado. "Este percentual varia enormemente entre países ricos e pobres. Países como Reino Unido passou de 50% de vacinados com duas doses, enquanto que apenas 1,1% dos habitantes de países de baixa renda o foram com apenas uma dose", evidencia.

Mundo está no começo de nova onda, diz diretor da OMS

O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que o mundo está no começo de outra onda de infecções e mortes por Covid-19. A fala foi realizada durante discurso aos membros do Comitê Olímpico Internacional de Tóquio nessa quarta-feira, 21. Tedros destacou que, após 19 meses do início da pandemia e sete meses após as primeiras vacinas, o mundo está nos estágios iniciais de outra onda de infecções e mortes pela doença.

Isso porque, segundo ele, a forma como a pandemia vem sendo tratada na maior parte dos países é reprovável. Adhanon classifica como uma "enorme injustiça" que 75% das vacinas do mundo contra a Covid-19 estejam concentradas em apenas dez países. Ele aponta que os países falharam em compartilhar vacinas, testes e medicamentos, e que isso está alimentando uma “pandemia de duas vias”.

Segundo o diretor-geral da OMS, a discrepância das vacinas é epidemiológica e economicamente autodestrutiva. Tedros ainda destacou que a pandemia pelo novo coronavírus permanecerá até que todos os países possam ter o controle total sobre a doença.

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