Olhando o ano em retrospectiva, é possível perceber que o Ceará viveu uma escalada da violência letal, entre abril e maio, quando os números de homicídios passaram de 300 ao mês. Tratava-se da falência de uma proposta de segurança que havia permanecido desde a gestão anterior, mas que já não dava mais conta de conter os atos criminosos com eficácia.
Há quem diga que a política de segurança pública do Governo Elmano tenha começado efetivamente ali, a partir da nomeação do secretário Roberto Sá, delegado federal com experiência na gestão da segurança pública do Rio de Janeiro. Ajustes foram feitos no policiamento, a tropa foi reforçada com a chegada de novos policiais e a presença da PM foi percebida com mais intensidade nas ruas. A queda nos indicadores criminais foi repentina: os números desabaram de um mês para outro, mantendo-se em queda até outubro, mês em que os crimes violentos letais intencionais apresentaram certa elevação. Mesmo com todo esse esforço, o ano de 2024 já será mais violento que seus dois antecessores. A guinada nos índices ocorreu, mas de forma tardia.
Em paralelo, a letalidade policial está em alta no Ceará. Com 166 ocorrências até novembro, o Estado registrou o maior número de mortes por intervenção policial em um ano desde 2018, quando foram contabilizados 221 casos. Tais mortes não são consideradas como intencionais, pois possuem excludente de ilicitude, mas as circunstâncias em que elas ocorrem deveriam ser investigadas.
Em janeiro, o governador chega à metade de seu mandato. Sim, o calendário da política já está voltado para as eleições de 2026. A reforma do secretariado, ocorrida logo após o Natal, é um forte sinal dessa preocupação. Nem é preciso ser especialista para saber que a segurança pública, mais uma vez, estará no centro das atenções. O direcionamento das curvas de criminalidade nos dois próximos anos afetará bastante a avaliação da gestão.
Dentre as mais diversas ponderações, caberá ao eleitorado responder a seguinte pergunta: o Ceará ficou mais seguro nos últimos quatro anos? Dois fatores entram nessa equação: a análise dos números e a percepção da população. Nem sempre esses dois elementos estão em concordância. E isso representa um perigo aos governantes. Maquiavel já alertava, no século XVI, que não basta ao governante ser, ele precisa aparentar ser. A ideia de um Ceará mais seguro passa não só pela redução dos assassinatos, mas pelo sentimento popular de que se possa realmente estar seguro. Esse é o grande desafio de Elmano de Freitas nos próximos dois anos. Trata-se de uma tarefa árdua, haja vista o caráter aleatório da violência cometida pelo crime organizado, cujas vítimas não se restringem apenas a quem esteja "envolvido" no crime.
Por algum tempo, esse discurso pareceu razoável, sendo repetido até mesmo por agentes de segurança, mas quando mulheres e crianças são baleadas em uma aula de dança na praça a noção de que haja algum lugar seguro em Fortaleza perde sua validade. Como será a reação das colegas e dos familiares das pessoas atingidas após o ocorrido? Ainda terão a mesma tranquilidade em usar o espaço público para seu lazer? Mesmo que nenhuma ocorrência criminal aconteça no Jardim das Oliveiras, bairro em que se situa a praça, a sombra do temor se manterá. Como tais pessoas estarão convencidas de que o Estado ficou mais seguro?
Em outra frente, se avizinha um risco ainda maior. O turismo é nossa vitrine para o Brasil e o exterior. Em 2024, essa fachada foi arranhada por episódios que revelam a capilaridade e a ousadia das organizações criminosas. Dois turistas do Piauí foram assassinados por terem tomado um caminho errado, passando por dentro de uma comunidade dominada por facções.
Estabelecimentos comerciais fecharam suas portas na Beira Mar e em Canoa Quebrada a mando de lideranças criminosas. Por fim e mais recente, um adolescente de São Paulo foi sequestrado e morto, em Jericoacoara, pelo simples fato de fazer um gesto que remete a um grupo rival. Dez dias depois, a localidade registrou um duplo homicídio.
A soma desses casos gera uma má impressão não apenas internamente, mas para um público que vê, em nossas praias, o imaginário de um paraíso tropical construído pela propaganda. De uma maneira amarga, os turistas estão descobrindo que há serpentes nesse local paradisíaco. É preciso prover o mínimo de segurança para que haja o desejo de retornar e demonstrar, para quem ainda não veio, que se trata de um programa 100% seguro.
A repercussão mundial dos ataques ocorridos em janeiro de 2019, em plena alta estação, obrigou o então governador Camilo Santana (PT) a tomar medidas drásticas e a solicitar apoio de um presidente a quem o partido fazia oposição. Tudo em nome da manutenção de uma das principais atividades econômicas do Estado. Os ataques cessaram e a vida seguiu seu curso. Elmano conta com um secretário experiente que conseguiu fazer com que o pior momento da gestão fosse superado. O desafio, agora, é converter essa expertise em ampliação da percepção de segurança da população.
A coluna entra de férias em janeiro. Um feliz e seguro 2025 para todos nós!!!