O Estado possui 249 mil km² de mar, quase 170% a mais do que sua ocupação terrestre, que podem ser utilizados para a criação do Ceará Azul. Seria um novo modelo de desenvolvimento econômico sustentável, nas regiões litorâneas e das encostas, com alicerces ambientais e sociais bem definidos.
De acordo com o titular da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), Artur Bruno, estão sendo discutidas duas possibilidades de leis que devem ter aprovação no primeiro e no segundo semestres deste ano. Mas o governo ainda trabalha em prol de levantamento de dados, estes fundamentais para ser o balanço entre a atração de investimentos nacionais e internacionais e a preservação do meio ambiente.
A possível Lei da Política Estadual de Gerenciamento Costeiro, que está mais avançada, em fase final de discussão, após dois anos, com 23 municípios, comunidades locais e empreendedores, deve seguir em breve para encaminhamento da Procuradoria Geral do Estado (PGE). “Quando voltar da PGE a governadora analisa o melhor momento para enviar para a Assembleia Legislativa. Acredito que até fim de junho possa estar aprovada”, declarou o titular da Sema.
A segunda é a Lei do Mar que, segundo Artur Bruno, deve ter votação até fim de 2022, para definir as obrigações e os direitos relativos à exploração no mar. Essa agenda iniciou há cerca de seis meses e inclui acadêmicos, advogados, cientistas e diferentes setores do governo.
O comitê técnico fará a discussão final nesta semana. Ela tem a finalidade de orientar a utilização de recursos marinhos vivos e não vivos, visando a promoção da conservação e o seu uso sustentável, a partir de uma gestão equitativa, eficiente e compartilhada.
Na visão da professora de Direito do Mar da Universidade Federal do Ceará (UFC), Tarin Mont´Alverne, que faz parte do comitê, é fundamental a aprovação desta lei.
“Se queremos pensar no Ceará Azul, precisamos avançar na criação de uma Política Estadual de Conservação e o Uso Sustentável dos Recursos do Mar (PERM), como instrumento de proteção dos ecossistemas marinhos e desenvolvimento sustentável do Estado. Com a finalidade de orientar a utilização de recursos marinhos vivos e não vivos, visando promover a conservação e o uso sustentável a partir de uma gestão equitativa, eficiente, compartilhada, adaptada, integrada e sustentável”, afirma.
Para o titular da Secretaria Executiva de Modernização, Célio Fernando, é importante conhecermos as interações entre as atividades socioeconômicas e o ambiente marinho, oferecendo na conservação oportunidades como a erradicação da fome, mas também proteção da vida marinha.
“Para isso, precisa-se desse contrato social por novos marcos regulatórios que alcancem todas as áreas de forma inteligente. A cultura oceânica é um grande desafio para a sociedade. O Ceará Azul dos Verdes Mares se traduz como uma fronteira das mais importantes para vencermos os muitos hiatos da sociedade cearense”, afirma.
Todo esse movimento em torno do mar, atualmente, não está sendo promovido apenas pelo Ceará, ou pelo Brasil, mas sim em todo o mundo, por conta da Década do Oceano, entre 2021 e 2030, criada pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Segundo Tarin, este tema cobre 71% do planeta e se conhece apenas 5% dele. Se a Economia Azul fosse uma economia de um país, seria a sétima maior no mundo. Até 2030 os oceanos podem produzir até 40 vezes mais energia do que temos na atualidade.
Entre os eixos temáticos trabalhados relativos ao mar no Ceará estão os setores de pesca e indústria do pescado; aquicultura; biotecnologia marinha; energias renováveis; recursos minerais; turismo; lazer e desportos; reparos e construção naval. Eles já apresentam algum nível de desenvolvimento que deverá ser estruturado e ampliado nos próximos anos.
Para se conhecer melhor o que o Estado possui em seu litoral, o governo, por meio do programa Cientista Chefe do Meio Ambiente, priorizou estudos em relação ao mar e sua costa. Produtos foram criados com a missão não apenas de proporcionar um ambiente para o desenvolvimento econômico do mar, com geração de renda e emprego, mas que tenha um olhar preservação e manutenção da beleza natural cearense, premissas da Economia Azul.
O professor Luis Ernesto Arruda do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da UFC, é o responsável pelo Cientista-Chefe e destaca que o Estado tem o primeiro Observatório Costeiro e Marinho (OCM) do Nordeste. “Atualmente, estamos trabalhando nos dados referentes a linhas e à costa. O Plano Estadual de Contingência deverá ser lançado ainda neste mês e é ele que orientará como lidar com problemas, como derramamento de óleo, desabamento de falésias, entre outros.”
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Biotecnologia marinha
Uma área que tem alto potencial de exploração no âmbito da Economia Azul no Ceará é a da biotecnologia marinha. O professor Alexandre Holanda Sampaio, do departamento de Engenharia de Pesca da UFC, coordena o laboratório de biologia marinha e destaca que o Ceará, por estar localizado num ambiente tropical, tem vantagens bastante elevadas em relação aos demais países.
Já foi encontrada no mar, nas praias do Pacheco, Paracuru, Flexeiras e Guajiru, uma substância chamada lectina, que é extraída de organismos marinhos, como, por exemplo, as algas, e que podem ter muitas aplicações biotecnológicas. Um exemplo é na oferta de novos fármacos.
Ela serve para produzir novos tipos de antibióticos, antiflamatórios, possíveis medicamentos para o câncer e, associada a outras substâncias, é um excelente cicatrizante. O ambiente marinho é promissor para a indústria farmacêutica pela variedade de que habitam esse ecossistema.
"No laboratório estamos trabalhando, atualmente, com algas marinhas, invertebrados marinhos, ouriço e esponja do mar que apresentam moléculas que têm mostrado algum potencial de Lectina. Estamos buscando novos antibióticos e o ambiente marinho é um grande tesouro", afirma Sampaio.
Após a descobertas dos materiais e confirmação da sua utilidade para a indústria farmacêutica, o próximo passo é que as empresas interessadas continuem os estudos até que novos fármacos possam chegar ao mercado.
Aquicultura e pesca
Um setor que já é bem consolidado e pode ampliar ainda mais a sua atuação, especialmente em relação à exportação é o dos pescados. De acordo com dados da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Ceará (Sedet), a lagosta ocupa o terceiro lugar entre as principais exportações do agronegócio do Estado.
Entre janeiro e março deste ano, foram comercializadas U$ 4.780,611, uma alta de 40,7% ante igual período de 2021, que fechou os doze meses com comercialização de R$ 64.380,484.
Entre os tipos de pescados mais exportados nos primeiros três meses de 2022, em ordem de valores, estão pescado total, U$ 19.757,20; peixe total U$14.973,70 e lagosta U$ 4.780,611. Na última semana, o secretário-executivo do agronegócio da Sedet participou de uma feira em Barcelona, na Espanha, para divulgar o Ceará.
O pesquisador de Aquicultura e Pesca Artesanal, João Felipe Matias, do programa Cientista Chefe também acredita que o Ceará tenha uma grande oportunidade de negócio com a Economia Azul.
"Temos toda a extensão litorânea, o turismo e muito para explorar da fauna marinha. O Ceará hoje já trabalha muito com essa questão dos crustáceos, camarão e lagosta, e agora está se tornando também uma referência no atum. Não podemos esquecer também que existem muitas riquezas minerais no mar", destaca.
Atlas e planos estratégicos
Para conseguir atrair investidores nacionais ou estrangeiros, há fatores fundamentais também quando se fala em Economia Azul: a pesquisa e os dados. Pois com estas informações em mãos que se tem uma noção do que, onde e como pode ser explorado determinada região ou produto. Saber se já existe alguma comunidade com trabalho artesanal naquela localidade e de que forma a chegada de novos meios de exploração irá impactar em todo o ecossistema.
O Ceará criou o Atlas Digital Costeiro e Marinho do Ceará, desenvolvido pelo Programa Cientista-Chefe. Em formato online, ele tem atualizações constantes na Plataforma Estadual de Dados Espaciais (Pede).
"Para mim ele é um hub, pois não existe planejamento sem dados. Vimos a necessidade de criá-lo por ouvir experiências de pessoas que não conseguiram empreender em determinada área por criarem projetos e não saberem que naquela determinada região tem alguma questão ambiental", conta o professor pesquisador do Labomar da Universidade de Fortaleza (UFC), Marcelo Soares.
O pesquisador detalha que em até três meses a plataforma terá um avanço e dará as informações não apenas por imagens, como é atualmente. E, na segunda fase, até dezembro de 2022, o Atlas será disponibilizado de forma impressa e as principais informações servirão de base e diagnóstico para a elaboração do Planejamento Espacial Marinho (PEM) do Ceará.
Outra fonte de estudos que tem ajudado em toda a composição do Ceará Azul é o Fortaleza 2040, que traz a agenda da Economia do Mar há alguns anos. "Todos os planos de Fortaleza, do Ceará e da Fiec (Federação das Indústrias do Estado) em relação ao mar se convergem para fortalecer a economia e a torne a principal Economia do Mar do Brasil", confirma o vice-prefeito Élcio Batista.
No Ceará 2050 muitos estudos têm como tema o mar. Barros Neto, coordenador do projeto e professor da UFC, acredita que as oportunidades são grandes, além dos pescado, do turismo, é possível explorar o minério do mar e as energias offshore; das correntes marinhas; e das ondas.