O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em julgamento realizado ontem, permitir a validade de acordos individuais entre empregadores e trabalhadores para reduzir salários e suspender contratos de trabalho durante a crise do coronavírus. Com a rejeição do pedido de medida cautelar da Rede Sustentabilidade, anteriormente deferida pelo ministro Ricardo Lewandowski de forma parcial, a Medida Provisória (MP) 936/2020, que era alvo de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), foi mantida em sua integralidade.
Ao todo, sete ministros - Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e o presidente da Corte, Dias Toffoli - votaram pela manutenção dos acordos individuais. Apenas os ministros Edson Fachin e Rosa Weber defenderam a necessidade de acordos coletivos, acatando pedido da Rede. O relator, ministro Lewandowski, proferiu voto "intermediário" prevendo a validade dos acordos individuais, mas com possibilidade de o sindicato deflagrar negociação coletiva.
Em seu voto, Fux disse que "o sindicato não pode fazer nada, absolutamente nada que supere a vontade entre as partes". A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, destacou que o quadro de emergência temporária se conjuga ao fato de o programa proposto pelo governo também ser provisório e lembrou que a MP ainda está sujeita ao crivo político do Congresso. "A MP veio trazer uma alternativa que é multidisciplinar para garantir-se o emprego, garantir-se o trabalho. A alternativa, segundo ela, "seria o não salário, seria o desemprego".
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No Ceará, os setores econômicos, de um modo geral, comemoraram a manutenção dos acordos individuais para auxiliar na manutenção de empregos. "É algo que beneficia toda a economia, não só o varejo", destaca o presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas (FCDL) do Estado, Freitas Cordeiro. Segundo ele, o STF "trouxe um alento" às empresas que ainda não haviam fechado acordo por receio de os mesmos não serem validados. "Muita gente foi prejudicada por essa instabilidade na aplicação da MP, mas sempre acreditei que essa exigência de homologação por parte dos sindicatos não tinha como prosperar", afirma.
Sobre a MP 936, o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Ricardo Cavalcante chegou a dizer que "a flexibilização das relações trabalhistas é uma necessária adequação das regras ao momento de crise" e ajuda a evitar o desemprego em massa. Conforme diz, as medidas auxiliam de forma mais efetiva os pequenos negócios. "Para os médios e grandes é uma ajuda relativa", complementa.
Para alguns economistas e especialistas em relações trabalhistas, entretanto, os acordos individuais para redução de salário e suspensão do contrato são nocivos aos trabalhadores, devendo ser encarados com cautela. "Manter o emprego nessas condições de redução salarial é camuflar as estatísticas de desemprego, porque não serão contabilizados como demissão e sim suspensão temporária", pondera o economista Henrique Marinho. Já o pesquisador da área de finanças pessoais e comportamentais da Universidade Federal do Ceará (UFC), Érico Veras Marques, diz que, no acordo individual, "o funcionário fica em uma situação muito mais fragilizada". Ele frisa, porém, que não é correto burocratizar esse processo para empresas pequenas. "Acho que deveria haver um critério com base no porte da empresa", comenta.
Segundo Erle Mesquita, analista do Mercado de Trabalho do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT), representantes dos governos, empresários e trabalhadores precisam construir saídas pactuadas, pois o que se tem "visto nos últimos anos tem sido a retirada de direitos trabalhistas, especialmente em tempos de crise". "O empobrecimento da classe trabalhadora só prejudicará ainda mais o processo de recuperação da economia", opina. Já o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT-CE), Wil Pereira, reforça que "sozinho, frente ao patrão, o empregado fica fragilizado e sem condições de defender seus direitos em um momento tão dramático como este". (Com informações da Agência Estado)
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Entenda quando vale acordo coletivo e quando vale o individual pela MP 936
Acordo individual é permitido na redução de salário em 25%. Nos percentuais de 50% e 70%, a permissão traz apenas para quem ganha até três salários mínimos (R$ 3.1315) e para quem tenha ensino superior e receba a partir de R$ 12.202,12. Outros percentuais e outras faixas salariais permanecem com acordo coletivo.