A poucas semanas de completar um ano do encerramento das atividades da indústria calçadista Paquetá no Ceará, a empresa segue com um passivo de processos trabalhistas no Estado. Segundo o Tribunal Regional do Trabalho (TRT-CE) da 7ª Região, mais de 1 mil trabalhadores aguardam na Justiça do Trabalho os valores a que têm direito.
Conforme O POVO apurou, grande parte dos trabalhadores prejudicados são ex-funcionários das fábricas da Paquetá em Pentecoste (localizado a 91 km de Fortaleza), Itapajé (a 130 km de Fortaleza) e Uruburetama (a 115 km da Capital).
Em meio às cobranças judiciais, a Paquetá realizou nessa segunda-feira, 25, leilão judicial dos prédios que compõem a matriz da empresa, em Sapiranga-RS, por R$ 75 milhões. Mas, no primeiro certame, nenhum lance foi efetuado, o que promete complicar a situação de quem espera receber valores devidos Brasil afora.
O POVO falou com José Robson, ex-coordenador de serigrafia da fábrica da Paquetá no município de Itapajé. Ele confirma que é um das pessoas que entrou na Justiça do Trabalho contra a empresa para receber valores devidos.
Robson conta que já conseguiu recolocação no mercado de trabalho - agora como operador de produção em uma outra fábrica calçadista, mas enfatiza que precisa do dinheiro a que tem direito pelo período trabalhado na Paquetá.
"A situação da Paquetá realmente está pendente, muita gente colocou na Justiça e estamos aguardando essa causa. Muita gente está com dívidas, mas aguardando o veredito da Justiça", afirma.
As denúncias de funcionários sobre a empresa remontam ao período em que ela anunciou o fim de sua operação. Em processo de recuperação judicial que perdurou entre abril de 2019 a novembro de 2023, a Paquetá Calçados tinha uma dívida de R$ 428 milhões e mais de 12,4 mil credores.
A crise financeira da empresa ficou numa situação crítica em 2022, com desabastecimento de fábricas e falhas nas entregas, com a operação no Ceará sendo afetada por demissões até meados do ano de 2023.
No Estado, após o anúncio do fim da operação nas cidades em sete cidades (Apuiarés, Irauçuba, Itapajé, Pentecoste, Tururu e Uruburetama) a empresa demitiu mais de 5 mil funcionários.
O prejuízo só não foi maior pois a Arezzo & Co comprou a unidade fabril de Uruburetama, absorvendo os funcionários demitidos e prometendo ampliações na unidade, que já empregava pouco mais de 1,2 mil funcionários.
A Paquetá também encerrou a operação no Ceará com dívidas pelo adiantamento de créditos tributários junto à Secretaria da Fazenda do Estado (Sefaz). Seriam liberados um total de R$ 23 milhões, com adiantamento de R$ 9 milhões numa primeira parcela no momento da assinatura.
Cinco meses antes de fechar a operação, a empresa havia assinado um Termo de Compromisso com o governo estadual para não fechar as unidades fabris e evitar a demissão de mais de 3,1 mil funcionários. O que não ocorreu.
Em meio a esse cenário, o impacto direto aos trabalhadores veio a partir de 28 de dezembro de 2023. Nesta data ocorreram os primeiros relatos de que a empresa não estaria realizando todos os depósitos previstos para o desligamento.
A Paquetá à época informou ao O POVO que "as tratativas com relação ao pagamento das rescisões está sendo feito diretamente com o Ministério Público (do Trabalho - TRT) e o término da entrega das chaves da conectividade (para saque do FGTS) vai ocorrer na próxima semana (no início de janeiro de 2024)."
No entanto, passados alguns dias de janeiro de 2024, os trabalhadores seguiram reclamando de falta de acesso aos recursos aos quais teriam direito. Mais uma vez demandada, a Paquetá admitiu problemas, postergou os prazos para resolução, mas efetivamente não realizou a pagamento para todos os funcionários.
O POVO entrou em contato com a Paquetá para ter detalhes de como a empresa tem atuado no diálogo junto à Justiça do Trabalho do Ceará e aos ex-funcionários prejudicados, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
Primeiro leilão judicial da sede da Paquetá no RS falha; no Ceará, Justiça também prepara certame
Em meio às cobranças judiciais, a Justiça realizou um leilão judicial para os bens imóveis da sede da Paquetá. O certame, no entanto, foi realizado na segunda-feira, 25, e não obteve lances, sendo esvaziado. Outro leilão judicial deve ser realizado.
A nova data prevista é o dia 5 de dezembro, pelo site oficial da Leiloeira Oficial Joyce Ribeiro (www.jrleiloes.com.br) ou presencialmente na Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Sapiranga, Nova Hartz e Araricá (Acisa).
O leilão visa fechar a arrematação de cinco lotes avaliados em pouco mais de R$ 75,3 milhões. Mas que podem agora ser arrematados por pouco mais de R$ 45,2 milhões nesta segunda tentativa.
O maior complexo industrial, com quatro edificações, tem a maior delas, área de 31,9 mil metros quadrados (m²).
O certame realizado no Rio Grande do Sul é apenas o primeiro da intervenção da Justiça para que a empresa pague suas dívidas trabalhistas. No Ceará, o TRT-CE da 7ª Região confirmou que a Paquetá deve ter bens que somam R$ 5,7 milhões e que devem ser vendidos para pagar dívidas.
A medida é coordenada pela Vara do Trabalho de São Gonçalo do Amarante e deve beneficiar 43 dos trabalhadores prejudicados que eram ex-funcionários da Paquetá de Uruburetama.
São dois imóveis alienados, sendo registrados no município de Uruburetama. O primeiro com valor de avaliação de R$ 1,26 milhão e o segundo avaliado em R$ 4,44 milhões.
Os processos de venda serão realizados separadamente. Dentre as regras da venda pública está a de que o negócio será confirmado com pagamento de, no mínimo, 25% do valor do arremate à vista.
A decisão foi proferida pelo juiz de Trabalho titular Mauro Elvas Falcão Carneiro, no último dia 19 de novembro.
SDE diz que adota medidas para manter empregos
Procurada pelo O POVO para saber como estavam as negociações com a empresa, a Secretaria do Desenvolvimento Econômico do Estado do Ceará (SDE) informou, por meio de nota, que, desde o início da situação envolvendo a Paquetá, adotou medidas para buscar a manutenção da empresa no Estado, com o objetivo principal de proteger os empregos dos trabalhadores cearenses.
"Não sendo possível evitar o fechamento das unidades da empresa, a SDE redobrou esforços para atrair novas indústrias e, assim, preservar os postos de trabalho na região afetada"
A pasta acrescenta que não tem ingerência sobre decisões administrativas ou judiciais relacionadas às dívidas e procedimentos da Paquetá, mas reforça que todas as ações ao alcance do Estado foram realizadas visando minimizar os impactos para os trabalhadores e suas famílias.
"A Secretaria permanece comprometida com a atração de novos investimentos que gerem emprego e renda para os cearenses"