A menos de uma semana para começar a valer a tarifa de 50% de todas as exportações brasileiras enviadas aos Estados Unidos, governos federal e estaduais começam a preparar medidas na tentativa de blindar a economia e amenizar os catastróficos efeitos que as medidas anunciadas por Donald Trump podem causar ao Brasil.
No plano federal, as medidas em estudo no “plano de contingência” incluem a criação de linhas emergenciais de crédito e a criação de um fundo específico para empresas afetadas pela crise. Ele seria abastecido com crédito extraordinário (fora das regras fiscais) e usado como lastro para operação de crédito, de modo a reduzir a taxa de juros.
Governos estaduais anunciaram medidas no mesmo sentido. A liberação de créditos do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços (ICMS), principal tributo estadual, foi uma das medidas anunciadas pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Amilcar Silveira, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Ceará (Faec), ainda acredita numa saída no campo diplomático para o “tarifaço” americano. Mas, caso a questão não se resolva, o setor já reivindicou junto ao governador cearense, Elmano de Freitas (PT), a liberação imediata dos créditos do ICMS que as empresas exportadoras cearense têm direito e encontram-se retidos.
De acordo com ele, durante reunião com o setor produtivo, Elmano teria mencionado a possibilidade de compra dos peixes que estão no porto, parados em contêineres aguardando solução para o impasse nas tarifas. “O governador sugeriu essa compra para o Programa Ceará Sem Fome. Mas seria uma medida muito pontual. Foi quando apresentamos esse nosso pleito pela liberação dos créditos do ICMS”, informou Amílcar. O líder classista não quis informar o montante retido de ICMS, mas assegurou que o valor é muito alto e que Elmano teria dito na ocasião que iria estudar a reivindicação.
O pedido, segundo o presidente da Faec, foi feito, semana passada, quando o governador Elmano de Freitas recebeu empresários dos setores de aço (siderurgia), pescados, castanha-de-caju, peças e pás eólicas. Na mesa, governo e setor produtivo exportador expuseram possíveis ações com foco na economia do Ceará, a fim de evitar possíveis impactos negativos.
“Essas medidas (do tarifaço), se elas se concretizarem, serão uma machadada na nossa cabeça”, avalia Amilcar. O temor encontra respaldo no fato de os EUA serem o principal destino das exportações cearenses. Em 2024, as exportações cearenses para o país norte americano totalizaram US$ 659,07 milhões (44,9% do total).
Subsídios e entrega de crédito de ICMS foram possíveis medidas citadas pelos governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).
Em Goiás, Caiado se comprometeu em ofertar linha de crédito voltada ao setor agroindustrial com juros inferiores a 10% ao ano, abaixo dos 15% ao ano da Selic, a taxa básica fixada pelo Banco Central (BC), referência mínima para os empréstimos de mercado. Apesar do subsídio, segundo o governo goiano, não haverá aporte de recursos públicos na medida.
No Rio, o governador Cláudio Castro também anunciou, ainda na semana passada, a criação de um grupo de trabalho para elaborar estudos de avaliação dos impactos. Em 2024, o estado exportou US$ 7,4 bilhões em produtos para os EUA, especialmente petróleo refinado e semimanufaturados de ferro e aço.
No Paraná, o governo também vai reunir, ao longo da semana, os setores econômicos que poderão ser impactados pelo tarifaço. Entre eles estão madeira e derivados (como MDF, esquadrias e portas), café e suco de laranja. O Paraná vende para os EUA, em média, US$ 1,5 bilhão em bens.
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSD), reuniu-se, na última sexta-feira, com representantes da indústria gaúcha, de entidades empresariais e da diplomacia americana para debater os efeitos da sobretaxa. Uma linha de crédito estadual específica para empresas exportadoras não está descartada, mas ainda não há decisão.
O governo da Bahia prevê anunciar, nos próximos dias, um conjunto de medidas de apoio aos segmentos econômicos mais impactados pelas tarifas. Também foi formado um grupo de trabalho, em parceria com a Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), com o objetivo de avaliar os impactos do tarifaço.
Impacto na economia será grande para os dois países
Carlos Rifan, consultor internacional, especialista em Relações Institucionais e Governamentais e presidente da Associação Nacional dos Profissionais de Relações Internacionais (Anapri), aposta no recuo dos EUA devido à pressão interna. Mas que, no início, os impactos serão grandes para os dois países.
O tarifaço é visto por ele como uma "queda-de-braço" entre os EUA e o Brasil. E vai ganhar a disputa, segundo o analista, quem tiver maiores condições para resistir. "De um lado, os Estados Unidos com a pressão interna da inflação, do mercado consumidor interno fazendo pressão; dos preços dos alimentos subindo nos supermercados, porque vai faltar alimento nos supermercados. Do outro, o Brasil com aumento da taxa de desemprego."
Para ele, as medidas de contingenciamento servirão para ganhar tempo, enquanto os dois países tentam uma saída negociada. Mas o governo brasileiro precisará injetar dinheiro na economia e oferecer subsídios.
Carlos explicou que, em um primeiro momento, sentirá os impactos negativos, como desemprego e redução nas exportações, mas, a longo prazo, tem a capacidade de se recuperar, já que países menores não conseguirão suprir a demanda dos EUA.
Comitiva
Uma comitiva de oito senadores iniciará na tarde de sexta-feira, 25, um viagem a Washington para debater com empresários e parlamentares as tarifas de 50% dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros