Os números que demonstram o impacto do tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump na balança comercial do Ceará com os Estados Unidos têm rostos no interior do Estado. Em Paraipaba, a 92,71 km de Fortaleza e 6.186 km de Washington DC (EUA), O POVO encontrou produtores e catadores preocupados com a taxa de 50% aplicada à agroindústria que compra deles a maior fatia da produção mensal de 4,5 milhões de cocos.
A cidade é repleta de coqueirais do Centro até as áreas mais afastadas e construiu, desde o declínio da cana de açúcar há mais de 40 anos, um dos principais polos produtores de coco verde no Estado, com área de 2,5 mil hectares no distrito irrigado Curu-Paraipaba. Mas, longe das mesas de interlocução, o município tem esse indutor da economia ameaçado pelos planos do presidente dos EUA.
Informação que sequer fazia parte do dia a dia do negócio deles. Na cadeia produtiva do setor, os produtores estão na base, fornecendo a matéria-prima para que a agroindústria extraia a água, envase e engarrafe para a venda no mercado internacional.
Tarifa de exportação/importação era um ponto fora das negociações que passou a ser assunto recorrente. Afinal, após o anúncio da ordem executiva pela Casa Branca na última semana, o componente foi responsável pela renegociação do valor do litro da água de coco com as indústrias, que caiu de R$ 1,80 para R$ 1,60.
A quebra do preço no meio do ano em contratos fechados a cada 12 meses deixou os negócios no limite da viabilidade econômica, segundo contaram os produtores Vandecarlos Lima, Jonas Oliveira e Wellington Sousa ao O POVO.
“Quando eu ouvi essa zoada aí, eu liguei para o industrial e perguntei: vai mexer com a gente? Ele disse que ainda não. Mas mexeu. Agora, a gente espera que essas autoridades entrem num acordo e se resolvam. A nossa esperança é essa, hoje”, desabafa Vandcarlos despejando nas promessas dos governos estadual e federal de novos mercados um novo fôlego também.
E há quem sofra mais. Aqueles que optam por vender os cocos sem contratos, a partir da lei da oferta e da demanda, têm o litro pago a R$ 1 e amargam perda de 200%, uma vez que chegaram a comercializar a produção de até R$ 3 por litro.
“Realmente, quem vai sofrer danos gerais é aquele que está na ponta, né? A cadeia da cocoicultura vai sofrer danos. Dependendo da formatação do cálculo dos caras que mandaram até chegar aqui, a gente vai para mais ou para menos nesse sofrimento”, lamenta Wellington.
A cocoicultura de Paraipaba reúne diversos perfis na atividade. Além dos industriais que mantêm a produção para ter domínio de mais uma parte da cadeia, há quem viu oportunidade de crescer no negócio, como é o caso de VandCarlos e Wellington.
O primeiro deles começou a lida do coco quando saiu de Mombaça, a 304,5 km de Fortaleza, para São Paulo. Na região de Santos, ele viu os tios lidando com o comércio de coco e viu em Paraipaba, nos idos de 2001, a oportunidade de entrar no negócio. Hoje, na companhia dos pais, lida com área de 12 hectares arrendados em Paraipaba e mais 40 hectares próprios em Acaraú, a 244,7 km da Capital.
Welligton nasceu em Fortaleza e se criou em Paraipaba, mas só após servir o Exército e empregar esforços em uma mercearia resolveu investir na cultura do coco, ainda nos anos de 1990. Atualmente, tem o ponto comercial alugado e o trabalho focado em cerca de 40 hectares de coco.
Já Jonas é neto dos chamados colonos da área. Essas pessoas foram trazidas pelo Dnocs para ocupar a área com a condição de produzir uma cultura específica que era aposta agrícola da época, no caso a cana de açúcar. “Quando eu comecei a me entender como gente já estava dando bem o coco, aqui”, conta. Hoje, ele e o pai possuem 4 hectares próprios e mais dois arrendados de 4 hectares cada, também.
“Quando o coco está bom, a economia de Paraipaba fica movimentada. Mas quando está ruim o nosso bem-estar social vai embora. O poder de compra, a saúde… É tão bom a gente ver o povo ganhando o seu dinheiro e gastando com seu filho na praça. Agora tá ameaçado”, diz Wellington enquanto os outros assentem.
A preocupação deles tem no sustento de milhares de trabalhadores o principal motivo. Atualmente, nas contas feitas por Vandcarlos, há cerca de 30 caminhões por dia carregando coco em Paraipaba, entre carretas da indústria e alugadas pelos produtores. Além do condutor, “cada carrada precisa de quatro a dez trabalhadores para colher e fazer o carregamento”.
Os 2,5 mil hectares também demandam mão de obra. Para dois hectares, os produtores estimam entre dois e quatro trabalhadores mantendo irrigação, adubação e limpeza das áreas. Dinheiro que, na mão desse pessoal, movimenta a cidade.
Mas sofre pela fragilidade de uma mão de obra empregada predominantemente por contratos informais de trabalho. A carteira assinada não é regra e, quando encontrada, é destinada aos chamados moradores dos terrenos, aos quais o proprietário da plantação cede uma casa.
Somado a isso, os produtores reconhecem que falta articulação entre eles para defender as demandas e os preços pela produção. Na base, a cadeia não é organizada por sindicatos ou associações, seja de trabalhadores ou produtores. Apenas a agroindústria do coco tem representação e articulação no Ceará.
É esse pessoal que tem chegado ao governador Elmano de Freitas (PT) e ao vice-presidente e ministro da Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin para defender a cadeira produtiva que movimentou, apenas nos primeiros seis meses de 2025, US$ 8,8 milhões entre o Ceará e os Estados Unidos.
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O que pensam aqueles que dependem da colheita para sobreviver?
A jornada de 10 horas de trabalho braçal de derrubar os cachos, amontoá-los na carroça puxada por burros e depois carregar os caminhões rende cerca de um salário mínimo aos catadores de coco verde em Paraipaba e atrai jovens ainda cursando o ensino médio ou recém-formados, os quais reagem à palavra tarifaço com um sincero "diabéisso".
O dia de cada um deles varia entre R$ 90 e R$ 130, a depender do empregador. A diária é paga aos sábados e, quem estiver disposto a fazer um extra, ainda pode ir para o serviço aos domingos. A alimentação no trabalho depende da vontade do patrão e os equipamentos de proteção não fazem parte do traje.
O POVO encontrou quatro jovens com histórias semelhantes, de busca por melhoria de vida quando esteve em Paraipaba. Dois deles largaram funções em uma padaria da cidade para catar cocos. Renato Silvia, 19, abandonou o serviço neste comércio e está "com uns meses" trabalhando na cocoicultura para ajudar em casa, enquanto o pai e a mãe estão desempregados.
Saimon Sales, 21, foi o responsável por levar Renato para a cocoicultura. "Aqui, o cara ganha mais", contou sobre o trabalho que o ajuda a sustentar o filho de 11 meses e a esposa, que cuida da casa alugada.
Alan Costa, 18, também vê na jornada braçal a melhor forma de cuidar da família, formada por duas filhas, de 1 ano e 3 anos, e pela esposa de 23 anos, que cuida da casa. Com a mesma idade do colega de trabalho, Magno Barros está com um ano como catador, apesar de ainda não ter terminado o ensino médio. Nascido e criado em Paraipaba, segue os passos do pai, que trabalha "colocando os peões para trabalhar".
Os quatro finalizavam a jornada semanal enquanto O POVO esteve lá e levaram para casa o pagamento ainda sem perda de valor, após a renegociação entre os produtores de coco e a agroindústria devido ao tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump.
O que pensam aqueles que dependem da colheita?
A jornada de 10 horas de trabalho braçal de derrubar os cachos, amontoá-los na carroça puxada por burros e depois carregar os caminhões rende cerca de um salário mínimo aos catadores de coco verde em Paraipaba e atrai jovens ainda cursando o ensino médio ou recém-formados, os quais reagem à palavra tarifaço com um sincero "diabéisso".
O dia de cada um deles varia entre R$ 90 e R$ 130. A diária é paga aos sábados e, quem estiver disposto a um extra, pode ir aos domingos. A alimentação no trabalho depende do patrão e os equipamentos de proteção não fazem parte do traje.
O POVO encontrou quatro jovens com histórias semelhantes, de busca por melhoria de vida. Dois deles largaram funções em uma padaria para catar cocos. Renato Silvia, 19, está "com uns meses" na atividade para ajudar em casa, enquanto o pai e a mãe estão desempregados.
Saimon Sales, 21, foi o responsável por levar Renato. "Aqui, o cara ganha mais", contou sobre o trabalho que o ajuda a sustentar o filho de 11 meses e a esposa.
Alan Costa, 18, também vê na jornada braçal a melhor forma de cuidar da família, formada por duas filhas e pela esposa de 23 anos. Magno Barros, 18, está há um ano como catador. Nascido e criado em Paraipaba, segue os passos do pai, que trabalha "colocando os peões para trabalhar".
Os quatro finalizavam a jornada semanal enquanto O POVO esteve lá e levaram para casa o pagamento ainda sem perda de valor, após a renegociação entre os produtores e a agroindústria.
Saídas
O setor pleiteia a inclusão do produto na lista de exceções ao tarifaço. Caso não seja possível, pede, dentre outros pontos, a compra de água de coco pelos governos para inclusão nos cardápios das escolas e programas sociais como o Ceará sem Fome