Uma das áreas mais fascinantes das Relações Internacionais é a forma como as imagens moldam nossa percepção sobre os acontecimentos. Elas não apenas retratam, mas interpretam e influenciam guerras, conflitos e grandes transformações globais. Imagens da Segunda Guerra Mundial ou da Guerra do Vietnã, por exemplo, transcendem os fatos e revelam como esses eventos foram sentidos, vividos e compreendidos em diferentes contextos. Nesses e em outros casos, a fotografia foi importante para influenciar e mobilizar a opinião pública, bem como pressionar os governos.
Nesse sentido, a obra de Sebastião Salgado adquire uma dimensão única. Suas fotografias sempre iluminaram aspectos da realidade nem sempre centrais nos debates internacionais. Ele levou ao mundo imagens de regiões esquecidas - como a icônica fotografia da Serra Pelada, no Pará, ou os registros da degradação ambiental na Amazônia - forçando fóruns internacionais a enxergarem a vida concreta que se desenrola longe das grandes conferências e cúpulas governamentais.
A agenda global sempre esteve presente em seu trabalho, como na coleção Êxodos, em que retrata as condições dos deslocados forçados, ou em Trabalhadores, onde documenta realidades dos trabalhadores em diferentes regiões do mundo.
Do ponto de vista das Relações Internacionais, sua fotografia constitui um poderoso instrumento de denúncia e sensibilização. Salgado foi capaz de dar rosto a debates sobre desigualdade, injustiça e degradação ambiental, traduzindo em imagens o que a linguagem diplomática muitas vezes não consegue expressar na sua plenitude.
Nesse contexto, é inevitável pensar na realização da COP 30, que acontecerá em Belém. De um lado, surgem críticas quanto à infraestrutura da cidade e sua capacidade de sediar um evento dessa magnitude. De outro, a COP trará ao centro das atenções internacionais as contradições vividas por países que enfrentam, simultaneamente, pobreza e desafios ambientais profundos.
É possível imaginar como Sebastião Salgado retrataria essa dualidade - negociadores debatendo metas climáticas, enquanto a poucos quilômetros distância pessoas vivendo em meio a realidades marcadas pela exclusão social e pela desigualdade. Ao escolher uma das regiões mais pobres do país e com uma rica diversidade ambiental, o Brasil pretende sinalizar para a comunidade internacional o quanto é necessário superarmos os impasses e que avançarmos para além das promessas.
Num mundo cada vez mais multipolar, em que parte dos atores resiste ao avanço de pautas ambientais e em que, a cada dia, perdemos a sensibilidade diante dos temas globais, pode parecer utópico acreditar em avanços significativos.
No entanto, é justamente por isso que precisamos da visão de quem, como Salgado, enxerga além dos círculos diplomáticos. Seu legado pode inspirar novos olhares capazes de traduzir em imagens o que tantos discursos não conseguem mover. Sua trajetória nos faz lembrar que a política internacional se constrói também pelas imagens e que estas podem sim influenciar para avanços concretos.