Mas, de que vida falamos, quando no mundo existem 733 milhões de famintos, segundo estima a ONU? A quem responsabilizar pela morte à mingua de haitianos, palestinos, sudaneses? Arma de guerra milenar, usada para aniquilar inimigos, segue impune o proposital bloqueio alimentar do estado sionista à Gaza. A fome não é uma fatalidade, resulta de uma concepção em que guerra e desenvolvimento se complementam: o imperialismo. Um contraponto a este sistema traz esperanças. Nesse sentido, compartilho os resultados do Seminário Internacional Movimentos Agrários, Agroecologia, Soberania Alimentar e Cambio Climático no Sul Global, realizado em Fortaleza, nos dias 8 e 9 de julho de 2025.
O evento reuniu centenas de pessoas dedicadas ao trabalho de auto-organização e ação coletiva desenvolvido em comunidades de resistência aos setores contrários à reforma agrária popular. Oportunidade ímpar de troca de saberes entre movimentos sociais e universidades! Em uma conjuntura internacional desfavorável, os participantes discutiram a questão agrária e socioambiental, as estratégias de defesa da agroecologia e dos territórios dos povos originários, quilombolas e camponeses ameaçados pelo agronegócio e pelas grandes corporações.
A apresentação das iniciativas em curso no Brasil, Chile, Colômbia, México e Moçambique despertaram interesse pela clareza ao expor como e por que tais experiências se tornaram referência de organização econômica, socioambiental, política e cultural na disputa com o modelo produtivo-tecnológico e ideológico dominante, o propalado agronegócio. A cooperação agrícola, as práticas agroecológicas, a diversificação de atividades produtivas, o trabalho coletivo, a posse e uso de bens indivisíveis, as reivindicações por apoio à produção e por equipamentos comunitários, são procedimentos rotineiros das famílias agrupadas em entidades associativas.
Apesar de bem-sucedidas - preservação da biodiversidade, produção de alimentos saudáveis, geração de renda, melhoria da qualidade de vida, impactos positivos no âmbito municipal, estadual e nacional -, as experiências alternativas esbarram, por um lado, na negação de uma política massiva de Reforma Agrária. E, por outro, nos limites impostos pelo capitalismo: persistem as relações de poder entre as classes sociais e a dinâmica da concentração fundiária, associada a graves problemas: degradação ambiental, desigualdade social, dominação política etc.
Talvez o elemento-chave para compreender a abrangência e o significado das conquistas relatadas no Seminário Internacional esteja em seu objetivo estratégico: a primazia do trabalho sobre o capital. Para os defensores desta ideia, a terra é um bem comum e a produção resulta da cooperação entre os produtores diretos, na qual participam uma pluralidade de atores sociais. É dessa esperança em um mundo livre da fome e da opressão que nos fala Paulo Freire: esperançar é se levantar, não desistir, juntar-se com outros para fazer de outro jeito!