Em sessão que durou seis horas, o Tribunal de Justiça do Ceará (TJ-CE) elegeu ontem cinco mulheres para vagas de desembargadoras e instaurou procedimento interno que pode vetar a presença de um magistrado que pleiteava assento no pleno da instituição.
Das oito cadeiras de magistrados abertas, o TJ-CE votou o preenchimento de sete delas nessa quinta-feira, 17, cinco das quais foram ocupadas por juízas que atuam em Fortaleza: quatro por merecimento, quando são levados em conta para admissão critérios como produtividade, e uma por antiguidade, no qual se encontram os nomes mais experientes.
Na lista por antiguidade, que contemplava nove quadros da entrância final, o tribunal elegeu para a função de desembargador os juízes Carlos Augusto Gomes Correia, José Evandro Nogueira Lima Filho e Maria Ilna Lima de Castro.
Outras quatro magistradas de primeira instância foram indicadas para posto no TJ-CE na lista por merecimento, que tinha 22 concorrentes. São elas, por ordem de classificação, as juízas Rosilene Ferreira Facundo, Jane Ruth Maia de Queiroga, Silvia Soares de Sá Nóbrega e Andréa Mendes Bezerra Delfino.
Duas vagas restantes, destinadas ao quinto constitucional, devem começar a ser definidas a partir da semana que vem, quando o TJ-CE volta a se reunir, agora para reduzir as duas listas sêxtuplas preparadas pela OAB-CE a duas listas tríplices, a serem encaminhadas ao governador Camilo Santana (PT), a quem cabe apontar os escolhidos.
Até o fim do mês de março, o tribunal deve designar dez novos desembargadores para atuação imediata, incluídas as duas vagas da advocacia e as oito postuladas por magistrados.
Na mesma sessão de ontem, que começou às 9 horas e se estendeu até as 14h51min, o TJ-CE aprovou por unanimidade a abertura de procedimento cujo desfecho pode recusar o nome do juiz Francisco Chagas Barreto, que encabeçava a lista de candidatos por antiguidade.
Com a deflagração da medida administrativa, proposta pela presidente do TJ-CE, Nailde Pinheiro, o provimento da vaga foi suspenso e o caráter de antiguidade do postulante, preservado até que a corte volte a se debruçar sobre o assunto, analisando o mérito da questão.
O posicionamento da presidente, inédito na instituição, foi acompanhado integralmente pelos membros do tribunal. Em seu voto, lido na abertura da sessão, a desembargadora afirmou que, “como é de todo sabido, o referido magistrado foi punido com a pena de censura por atos que violaram o dever de imparcialidade, ignorando regras de competência e ferindo de morte a garantia do juiz natural”.
Nailde Pinheiro considerou que esses “fatos gravíssimos que foram cometidos pelo magistrado” não devem ser postos de lado ao se avaliar a possibilidade de admissão de Barreto como desembargador – a lista por antiguidade continha outros três nomes.
“A questão não pode ser ignorada. Em passado ainda recente, todos vivenciamos esforço do nosso Tribunal de Justiça para, cortando na nossa carne, expurgar aqueles que não eram dignos da toga que envergavam. Indispensável, portanto, manter o estado de vigilância”, enfatizou a chefe do Judiciário, para quem cabe ao pleno, ao discutir o processo, avaliar se “há fatos que o inabilitem para tanto” (ocupação da vaga).
Com a abertura do procedimento de recusa, a definição do eleito para a primeira cadeira por antiguidade é suspensa e a antiguidade de Barreto, mantida. O relator designado para o caso é o desembargador Paulo Airton Albuquerque Filho, considerado de linha mais rigorosa.
No curso do processo, o juiz Barreto poderá apresentar defesa. Ao final, elaborado o parecer do relator, a análise volta ao pleno do TJ-CE, que vai examinar o mérito da recusa. O nome do candidato pode ser vetado caso se atinja o quórum institucional, que é de dois terços dos 43 membros ou 29 votos.
Já durante a manifestação de votos nessa quinta-feira, porém, alguns integrantes da corte sinalizaram concordância na íntegra com o entendimento da presidente do tribunal, sugerindo alinhamento também em relação ao mérito.
Apenas dois desembargadores alegaram suspeição para não votar. Um terceiro arguiu impedimento – o irmão, também membro, já votara na mesma sessão.
Como O POVO tinha mostrado na edição da última quarta-feira, 16, véspera da sessão, havia desconforto no pleno do TJ-CE com a presença do juiz Barreto entre os pretendentes a uma das vagas de desembargador.
Fontes consultadas pela reportagem confirmaram que integrantes da corte abririam insurgência durante a votação para rejeitar o magistrado, que foi condenado com censura pública em 2015 pelo próprio TJ-CE.
Então à frente da 2ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza, Barreto foi acusado de conceder irregularmente decisões liminares e dirigir ações durante os plantões em 2011 e 2013, atuando em processos cujo juiz natural não era ele, relacionados com concursos para a Polícia Militar do Ceará e postos de combustíveis em situação ilegal.
A defesa de Chagas Barreto, à época do julgamento, sustentou não existirem provas concretas de ilícitos ou de dolo e argumentou que todos os elementos se alimentavam de ilações. Também apontou ainda não haver sinais de enriquecimento e a condição financeira era condizente com a remuneração.
Em nota enviada ao O POVO ontem logo depois de encerrada a sessão do TJ-CE, o advogado do juiz, Robson Halley, lamentou a decisão da corte.
“Num dia que deveria ser de júbilo do magistrado Francisco Chagas Barreto Alves, juiz da capital desde o ano de 1996, sobreveio a surpresa da instauração de procedimento para aferir a presença das suas condições para o acesso, por antiguidade, ao último degrau de sua carreira jurídica, que, momentaneamente, restou suspenso”, escreveu.
Segundo ele, “a ampla defesa é primado da democracia e ela será exercida perante o local competente: o Tribunal de Justiça”, acrescentando que o Judiciário por certo “avaliará as razões que, serenamente, serão postas pela defesa técnica”.
O advogado, porém, ressalvou que “é prudente que se evite desenterrar fatos já marcados por avaliações antigas e usá-los, de forma inverídica, inclusive, em circunstância midiática que só se prestam ao único propósito de desacreditar e impor dupla punição ao magistrado”.
Com a instauração de procedimento de recusa, previsto no regimento interno do TJ-CE, abre-se prazo para que o relator elabore parecer sobre o objeto do processo, a possível rejeição ao nome do juiz Francisco Chagas Barreto ao cargo de desembargador.
Invocado pela presidente do tribunal, Nailde Pinheiro, o procedimento prevê a defesa do magistrado, que será apresentada no bojo do processo, conforme assegurou a defesa do juiz à reportagem.
A instauração do processo, por si, não inviabiliza o magistrado, apenas suspende a postulação à vaga, mantendo a sua antiguidade – Barreto era o primeiro da lista nessa categoria. Em seguida, o relator, desembargador Paulo Airton Albuquerque Filho, prepara o parecer e o submete ao pleno, que deverá examinar o mérito do caso.
Para tanto, a corte vai avaliar se o fato de já haver sido punido com censura pública pelo TJ-CE constitui razão suficiente para afastá-lo da lista de pretendentes ao cargo de desembargador.
Sete novos desembargadores
APROVADOS POR ANTIGUIDADE
CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA, titular da 7ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza: ocupará 5ª vaga da 3ª Câmara de Direito Privado
JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO, titular do 9º Juizado Especial Cível de Fortaleza: ocupará 4ª vaga da 4ª Câmara de Direito Privado
MARIA ILNA LIMA DE CASTRO, titular da 12ª Vara Criminal de Fortaleza: ocupará 5ª vaga da 2ª Câmara Criminal
Vaga indefinida para o 1º por antiguidade: ocupará 4ª vaga da 3ª Câmara de Direito Privado
APROVADAS POR MERECIMENTO
ROSILENE FERREIRA FACUNDO, titular da 5ª Vara de Execuções Fiscais de Fortaleza: ocupará 5ª vaga da 3ª Câmara Criminal
JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, titular da 12ª Vara de Família de Fortaleza: ocupará 2ª vaga da 3ª Câmara de Direito Privado
SÍLVIA SOARES DE SÁ NÓBREGA, titular da 2ª Vara de Registros Públicos de Fortaleza: ocupará 5ª vaga da 1ª Câmara Criminal
ANDRÉA MENDES BEZERRA DELFINO, titular da 6ª Vara de Execuções Fiscais de Fortaleza: ocupará 4ª vaga da 3ª Câmara Criminal