Quando o ex-candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PDT) disse na tumultuada reunião do PDT, no Rio de Janeiro, que ganharia com José Sarto (PDT) "em cima de vocês", indiretamente fez uma promessa ao irmão e senador Cid Gomes e a seus liderados, entre prefeitos e deputados estaduais, que testemunhavam aquela briga sobre o Ceará: o ciclo iniciado por Roberto Cláudio (PDT) em Fortaleza será o primeiro a obter quatro vitórias eleitorais consecutivas na Capital pelo menos desde a redemocratização do País, em 1985. É o ineditismo que a eleição de 2024 pode apresentar, caso o atual prefeito supere a debandada de pedetistas, consiga formar uma aliança robusta, além de demonstrar força administrativa no ano decisivo.
Sarto completa nesta quarta-feira três anos desde que foi eleito prefeito. A vitória no segundo turno contra Capitão Wagner (União Brasil) ocorreu em 29 de novembro de 2020, num ano de calendário eleitoral alterado por causa da pandemia de Covid-19. Aquela foi a terceira vitória eleitoral consecutiva do à época unificado grupo Ferreira Gomes. Ciro, Cid, Roberto Cláudio e também o então governador Camilo Santana (PT) estavam todos juntos. Em menos de um ano, ele tentará a reeleição em cenário muito distinto.
Nunca um ciclo político se manteve no Paço Municipal com quatro vitórias eleitorais consecutivas (ver infográfico). A Era Juraci teve quatro mandatos, contabilizando 14 anos e 9 meses. Contudo, assumiu o Executivo municipal pela primeira vez quando o mesmo Ciro deixou o cargo para disputar o Governo do Ceará, em 1990. O então vice-prefeito Juraci herdou o comando da Cidade, rompeu com o antecessor e deu início a um tempo de poderio emedebista. Se o atual gestor de Fortaleza for reeleito em 2024 e completar o mandato, serão 16 anos do mesmo grupo à frente do Poder.
Depois de Sarto, já anunciado candidato à reeleição, outra força que se organiza para a disputa também tem a participação de um Ferreira Gomes: Cid. O senador integra a cúpula da coalizão do ministro da Educação, Camilo Santana (PT), e do governador Elmano de Freitas (PT), cuja intenção é de lançar Evandro Leitão, que anunciou a saída do PDT e é cogitado no PT. O partido tem outras pré-candidaturas, notadamente a da deputada e ex-prefeita Luizianne Lins.
Se em 2022 o mote da campanha de Elmano era "o Ceará três vezes mais forte", em 2024 o nome que sair destas fileiras provavelmente anunciará a promessa de uma Fortaleza quatro vezes fortalecida, com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do ministro-senador Camilo e do governador do Estado. Na disputa interna com Luizianne, Evandro contabiliza a vantagem de ter mais proximidade com Camilo, de quem foi líder do governo e, em seu governo, ter assumido a presidência da Assembleia Legislativa do Ceará.
Professor do departamento de Ciências Sociais da UFC, o cientista político Uribam Xavier nota os ciclos políticos de Fortaleza como completamente diferentes entre si. O primeiro, diz, iniciou-se com Maria Luiza Fontenele num momento em que a Prefeitura de Fortaleza se voltava para a "arrumação da casa". Entretanto, persistiu na população a sensação de disfuncionalidade e desorganização.
"A casa ficou arrumada, com muitos projetos de desenvolvimento para a cidade, que depois foram tocados por Ciro Gomes. Acho que a partir daí você não tem mais que arrumar a cidade, a disputa pelo poder se dá mais ou menos no sentido de criar gastos e intervir em espaços públicos, criar vários equipamentos importantes para a cidade. Abriram-se vias, recuperaram-se equipamentos, mas era a estratégia de fazer grandes obras para capitalizar o setor da construção civil", diz o cientista social.
Xavier dá o nome de "estratégia Juraci" ao movimento de converter a cidade em canteiro de grandes obras, prática da qual, diz, o ciclo iniciado por Roberto Cláudio e sequenciado por José Sarto seria adepto.
A prática de Luizianne, localizada entre os dois momentos, é definida pelo acadêmico como de priorização das necessidades da periferia. Contudo, ele destaca como traço comum de todas as gestões a ausência de pensamento da Cidade como indutora do desenvolvimento.
"Assim como se teve no Ceará nos Governos das Mudanças (1985-2002). Acho que, pela deficiência das cidades, você não tem gestor pensando na cidade como indutora do desenvolvimento. Fica coisa de administrar recursos em função de algumas obras. Fica à reboque do Estado e daquilo que o Governo Federal vai sinalizando", pontua Uribam Xavier.