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Governo Elmano: o que foi, o que precisa e o que virá?
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Governo Elmano: o que foi, o que precisa e o que virá?

Reforma no secretariado visa realinhar a gestão rumo à consolidação de um marca que descole governador do protagonismo do antecessor. Desafios são administrativos, mas principalmente políticos
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Governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT) (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT)

O mandato do governador Elmano de Freitas (PT) se aproxima da metade. Os dois anos que restam se desenham cruciais para continuar as entregas destinadas à população e fincar uma identidade que conquiste os cearenses, facilitando o processo de tentativa de reeleição em 2026.

Não à toa, poucos meses após a última reforma administrativa, anunciada no fim de maio, o primeiro escalão da gestão passará por mudanças. Aliados garantem que as novidades trarão "um salto positivo" no gerenciamento da máquina pública.

O primeiro anúncio foi, na verdade, um retorno. Elmano informou na última terça-feira, 10, que a Casa Civil voltará a ser conduzida pelo jornalista Chagas Vieira, "a fim de melhorar, cada vez mais, as ações e projetos do Governo em prol dos milhões de cearenses".

Chagas desempenhou essa função entre 2020 e 2022 quando o hoje ministro da Educação, Camilo Santana (PT), foi governador do Ceará. Eles são muito próximos. É ideia do aliado o nome do principal programa não apenas do ministro, mas do governo Lula, o Pé-de-Meia. Uma marca valiosa e forte construída nesses dois anos de comando petista.

No Ceará, o secretário-chefe terá missão parecida. Além de reorganizar a Casa, terá de penetrar a imagem do que Elmano faz na gestão na mente do eleitor. Ao colunista Henrique Araújo, do O POVO, Chagas elencou que o compromisso fundamental dele será "intensificar o diálogo em todas as áreas e potencializar as entregas para a população, com as secretarias em permanente movimento".

O desafio de Chagas no governo Elmano, na prática, é apresentar uma gestão com cara própria. Vencer o ônus de um governo de continuidade. O do chefe do Executivo, por sua vez, é de saber "conduzir o barco" tendo em vista que o antecessor é a principal liderança política do Estado na atualidade. Isso é o que avalia Monalisa Torres, cientista política vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará (Lepem-UFC).

"Camilo era uma figura que dependia muito do ex-governador Cid Gomes (PSB), e foi a forma como ele conduziu dois grandes episódios que lhe deu protagonismo: o motim e a pandemia. Claro, foram episódios atípicos, mas ele já vinha construindo internamente uma imagem de facilitador, de alguém afeito ao diálogo. Contudo, nessas ocasiões, foram acentuadas as habilidades dele, que culminaram na liderança que se tornou hoje", complementou a pesquisadora.

O líder do bloco do PT na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), De Assis Diniz, considera que "é muito mais elevado" o nível de entrega de Elmano se comparado aos dois primeiros anos dos governos Cid e Camilo. "Ele expressa em todas as áreas, a começar pela política de combate à fome", avalia. A reforma, para o deputado, é sinal de que “o governo dará condições eficientes e eficazes de ações concretas”.

Monalisa Torres aponta que o momento é crucial para as alterações no secretariado. “Quanto mais próximo do período eleitoral, mais tem essa pressão interna, e externa também, de encontrar nomes que, do ponto de vista técnico, sejam capazes de entregar as políticas que foram prometidas”.

Nos bastidores, circula tese de que Elmano deverá mexer no comado da Secretaria da Fazenda (Sefaz), gerida por Fabrízio Gomes. Interlocutores informaram ao colunista Carlos Mazza, do O POVO, que há insatisfação por parte do empresariado, que questiona falta de aproximação e resolutividade da pasta, e até de servidores, que não sentem liderança "dentro de casa". Um dos entraves envolve conquista recente da nota A no índice de Capacidade de Pagamento do Estado (Capag).

Líder de Elmano na Alece e presidente eleito da Casa, o deputado Romeu Alguideri (PDT) é cauteloso ao ser questionado sobre o assunto. "Possíveis mudanças em quaisquer pastas cabem ao governador comentar. O Ceará tem mantido excelente nível de investimento e está com as finanças equilibradas, tanto que se tornou Capag A recentemente, que é a principal nota atribuída pelo Ministério da Fazenda", disse à reportagem.

Outra pasta que terá novo comando é a da Proteção Social (SPS) devido à ida da titular, Onélia Santana, para o Tribunal de Contas do Estado (TCE-CE). Preterido do comando da Alece, Fernando Santana (PT) é cotado para a função.

Já quem tem intenção de voltar ao Legislativo estadual é Salmito Filho (PDT), secretário do Desenvolvimento Econômico (SDE). Ao O POVO, ele revelou pretensão de sair da pasta para cumprir o mandato de deputado estadual.

"É verdade essa minha intenção de retornar para a Assembleia, mas eu não vou tomar nenhuma decisão sem antes conversar com o governador", disse na última sexta-feira, 13. Fabrízio, da Sefaz, foi na mesma linha. "Estou à disposição do governador, mas isso é uma decisão de governo. Eu sou servidor público, então eu trabalho pelo Estado do Ceará aonde quer que eu esteja", destacou.

O desafio administrativo: segurança pública

A segurança pública é o principal gargalo dos últimos três governos do Ceará e continua sendo um peso para Elmano de Freitas (PT). Até mesmo a base reconhece o entrave. A conta, no entanto, é dividida com esfera superior. De fato, é um problema que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) despende esforço em solucionar conjuntamente com os Estados, reunindo governadores e estabelecendo um plano de enfrentamento ao crime organizado.

"Estive representando o governador Elmano recentemente numa reunião com os governadores e o tema era unânime: segurança pública. Todos os governadores do Brasil hoje têm esse como principal desafio a ser vencido, mas eu acredito que o Estado nunca perdeu nenhuma guerra", explicou ao O POVO a vice-governadora Jade Romero (MDB).

Da bancada de oposição, o deputado estadual Felipe Mota (União Brasil) vai na mesma linha. "Os principais desafios para os próximos dois anos do Elmano estão muito interligados a Brasília, até porque o Lula tinha proposto um projeto de segurança onde envolvesse a União. A segurança pública, apesar de demonstrar a melhora em alguns índices no Estado do Ceará, ela ainda não gerou o que todo cidadão espera: a sensação de segurança".

Em maio, Elmano exonerou o então secretário de Segurança Pública, Samuel Elânio, após repercutir negativamente fala do titular da pasta estadual de que a taxa de homicídios no Estado estava em aumento, mas ainda se tratava de um número “razoável”.

No lugar, assumiu o delegado Roberto Sá, que já desempenhou a função no Rio de Janeiro e no Espirito Santo. Em seguida, o governador anunciou pacote de cinco medidas para fortalecer a área. De lá para cá, Fortaleza, por exemplo, registrou o novembro com menos homicídios desde 2009, com 57 assassinatos. Esse também foi o mês menos violento na Cidade desde junho de 2023. 

Em todo o Ceará, foram registrados 270 Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) em novembro. São 17 mortes a menos, ou uma redução de 5,9%, em relação a novembro do ano passado, quando 287 homicídios foram registrados.

Entretanto, houve aumento no número de homicídios no Interior: 144 assassinatos foram registrados nos municípios interioranos em novembro passado, enquanto, no mesmo período de 2023, esse número havia sido de 118 — acréscimo de 22,03%.

Além disso, no acumulado do ano, o Ceará já registra mais homicídios em 2024 do que em todo o ano de 2023. Neste ano, de janeiro até novembro, 2.983 assassinatos foram registrados no Estado. Em todo o ano passado, ocorreram 2.970 CVLIs. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) analisados pelo O POVO.

Para o líder de Elmano na Alece, Romeu Aldigueri (PDT), os indicadores revelam que o governo está "no caminho certo". "O principal desafio, sem dúvida, é a segurança. Mas, os resultados já estão aparecendo, graças ao grande investimento em pessoal e tecnologia que o governador tem realizado".

O desafio político: preservar aliados

Além de consolidar uma marca que se descole do protagonismo do antecessor, o governador Elmano de Freitas (PT) tem o desafio político de manter o amplo arco de alianças político-partidário e atender aos anseios da base dele.

"Estabelecer-se como liderança internamente, dentro do partido e dentro do governo, vai exigir do Elmano uma folga maior para não ficar tão dependente da figura do Camilo Santana", aponta a cientista política Monalisa Torres, do Lepem-UFC.

Segundo a pesquisadora, haverá reivindicação de aliados de peso por mais espaços de atuação, a exemplo do que aconteceu na discussão sobre quem presidiria a Assembleia Legislativa do Ceará (Alece). Situação que causou insatisfação no senador Cid Gomes (PSB) e culminou na troca de Fernando Santana (PT), nome de Elmano, para Romeu Aldigueri (PDT), nome que supostamente atende ambos.

"O desafio agora para ser enfrentado, do ponto de vista de se pensar a reeleição em 2026, é conseguir manter essa base organizada. Ele vai precisar se colocar como essa liderança que articula, e consolidar esse arco. Não vai ser fácil porque tem muitos nomes fortes do lado dele, pessoas que vão cobrar do governo esse compartilhamento de funções", projeta Torres.

A reforma no secretrariado também deve ponderar esse aspecto. "Não é só a questão técnica. Os cargos também são políticos. São indicações que, em alguma medida, atendem ou devem atender esse grupo que está compondo a base do governo. É uma equação difícil de resolver: atender aliados e entregar política", acrescenta.

Romeu Aldigueri, líder de Elmano na Alece, diz que a manutenção do arco de alianças será um exercício de "diálogo, respeito e transparência" no trato com os partidos da base. Já o líder do bloco do PT na Casa, deputado De Assis Diniz (PT), avalia que há "um conjunto muito positivo" resultante desses dois primeiros anos do governo.

"Tenho certeza que serão mantidos o arco de aliança e a força política eleitoral. São quase 176 municípios, ou seja, situação ou oposição que estejam ao lado do governo. A tendência é que a gente consolide essa tranquilidade da gestão, expressa dentro dos mais diferentes parâmetros de votação na Assembleia, sempre confortável. E, agora, continuar trabalhando para fazer as entregas necessárias", finalizou.

Os desafios em andamento: fila de cirurgias e Ceará sem fome

Os programas estaduais do Ceará Sem Fome e para a Redução de Filas de Cirurgias Eletivas são considerados pilares no balanço desses dois anos de governo feito pela vice-governadora Jade Romero (MDB). "É difícil se fortalecer outras políticas sabendo que ainda tinham milhares de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social", avaliou em entrevista ao O POVO na terça-feira, 10.

Em setembro, completou um ano da inauguração da primeira cozinha do Ceará Sem Fome. Na época, o governador Elmano de Freitas (PT) informou que, ao todo, o programa conta com 1.300 unidades, espalhadas em todo o Estado. Em Fortaleza, são 389 unidades. São entregues 125 mil refeições por dia em todo o Ceará.

O programa estadual de Redução de Filas de Cirurgias Eletivas foi criado em abril de 2023. O objetivo é reduzir o tempo de espera dos pacientes por procedimentos programados, de não urgência. Na sexta-feira, 13, manchete do O POVO destacou que o Ceará realizou 150 mil cirurgias eletivas em 2024, superando a quantidade executada no ano anterior, sendo até a quarta-feira, 11, 21,8% maior.

De acordo com relatório do Programa Nacional de Redução de Filas, do Ministério da Saúde, o Ceará é o quinto Estado que mais expandiu a quantidade de procedimentos na rede pública, ficando atrás da Paraíba, Maranhão, Rondônia e Santa Catarina.

A taxa de expansão é calculada comparando a quantidade de cirurgias da fila realizadas pelas unidades federativas entre fevereiro e agosto de 2023 e 2024. O Ceará figurou com 1,36, correspondendo a um aumento de 36% no número de procedimentos executados no período.

Para o deputado estadual Felipe Mota (União Brasil), que integra a oposição do governo petista, essas iniciativas precisam de uma fiscalização maior. “A única política pública que ele conseguiu implementar, mas não atende a um número vasto de pessoas que necessitam, foi o Ceará Sem Fome, que inclusive eu votei favorável. Ele parece não ter pegado na sociedade como um programa que deixasse uma marca registrada do governo Elmano de Freitas”, avaliou.

Já o colega de bancada e correligionário Sargento Reginauro (União Brasil) considera o Ceará Sem Fome um "projeto eleitoreiro". "Não contribui com a emancipação do mais pobre, com a mudança do perfil social dessa grande camada da população", avalia.

Em outubro, o governo do Ceará e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-CE) assinaram um convênio para capacitar participantes do programa. A meta é incentivar a criação de, pelo menos, mil pequenos negócios até 2026.

Outro pilar destacado pela vice-governadora Jade Romero são os investimentos em infraestrutura. Ela menciona Eixão das Águas, que neste dezembro teve assinado contrato com garantia de recursos para três lotes restante de obras. Um trabalho que permitirá a duplicação da capacidade de transmissão de água para a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) e para o Complexo Industrial e Portuário do Pecém.

Além disso, a Jade destaca as obras da ferrovia Transnordestina, que é uma das prioridades do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal. Em novembro, o presidente Lula (PT) assinou o repasse de R$ 3,6 bilhões para garantir a continuidade das obras no Ceará. Ele também assinou a contratação de mais um pedaço da obra no Estado. O trecho 7 liga os municípios de Quixadá e Itapiúna.

Até o momento, os trechos 1, 2 e 3 já foram concluídos, entre os municípios de Missão Velha a Iguatu. Enquanto isso, os trechos 4, 5 e 6 estão em obras, que perpassam as cidades de Acopiara a Quixeramobim. A Transnordestina tem extensão de mais de 1.200 quilômetros e passa por 53 municípios no Piauí, Ceará e Pernambuco.

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