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Pais e especialistas temem volta às aulas das escolas particulares em junho
Reportagem

Pais e especialistas temem volta às aulas das escolas particulares em junho

Comitê Científico do Consórcio Nordeste prepara documento sobre retorno gradual das escolas e outras atividades. Famílias questionam se distanciamento e outras medidas de segurança serão observadas
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SALA DE AULA NA ilha polinésia francesa do Taiti: salas de aula com carteiras distantes e uso obrigatório de máscaras (Foto: Suliane FAVENNEC / AFP)
Foto: Suliane FAVENNEC / AFP SALA DE AULA NA ilha polinésia francesa do Taiti: salas de aula com carteiras distantes e uso obrigatório de máscaras

Corrigida às 13h32min do dia 28/05/2020

O plano de retorno gradual às aulas em escolas privadas do Ceará a partir do próximo 17 de junho colocou especialistas em alerta. O Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino (Sinepe) enviou ao governador Camilo Santana uma proposta para que o Ensino Infantil, as séries iniciais do Ensino Fundamental e o 3º ano do Ensino Médio retomem estudos presenciais. No entanto, epidemiologistas pedem mais tempo para observar se, de fato, há uma estabilização dos casos e redução na ocupação de leitos em Fortaleza.

Lígia Kerr, epidemiologista que integra o Comitê Científico de Combate ao Coronavírus do Consórcio Nordeste, ― grupo integrado pelos nove governadores da região para tomada de ações conjuntas ―, afirma que um documento está sendo preparado e deve ser apresentado até a próxima segunda-feira, 1º. Nele, detalha Kerr, especialistas dispõem de parâmetros técnicos para mostrar que o retorno gradual das atividades econômicas, incluindo assim as escolas, ainda é inseguro.

"É precoce diante das altas taxas de ocupação dos leitos. A gente ainda não tem perspectiva real de estabilidade e queda do número de casos. Ainda não deveríamos está abrindo. A decisão é precipitada. A população mais pobre agora que está sendo mais atingida", considera a professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC).

A especialista remete ainda à artigos científicos publicados internacionalmente. Segundo ela, crianças entre quatro e 14 anos infectadas pela Covid-19 em países como Estados Unidos, França e Reino Unido têm apresentado uma nova síndrome, similar à Síndrome de Kawasaki, desenvolvida como uma resposta imunológica ao novo coronavírus. O registro de novos casos, inclusive com algumas mortes, destaca Lígia Kerr, fez com que a França revisse o retorno às aulas.

"Ainda não é possível saber se nós temos essa síndrome, ou se está aparecendo e ninguém está associando. São decisões muito sérias e que precisam de cautela. E se isso explodir outra epidemia? Nós temos uma situação mais desfavorável que a deles", compara. A epidemiologista elenca os sintomas que as crianças apresentaram: febre alta por longo período, rash cutâneo, alterações cardíacas e gastrointestinais.

"Honestamente, fico inseguro", confessa o presidente da Sociedade Cearense de Infectologia, Guilherme Henn. Mas o representante pondera que não pode dizer que o momento está errado. "De fato, a gente vê uma redução clara, desde a semana passada, da taxa de detecção de novos casos e da sobrecarga nos hospitais privados e públicos. Se seguir essa tendência, imagino que em três semanas, que bate com 17 de junho, a gente pode ter uma situação melhor", comenta. O cenário favorável, no entanto, ele alerta que pode ser alterado pelo retorno de algumas atividades econômicas, como foi antecipado pelo governador Camilo Santana.

Alana Firmeza, 39, engenheira e funcionária pública, teme pelo retorno do filho de 9 anos à escola. Para ela, é necessário mudança estrutural na unidade de ensino ou esperar mais um pouco para a retomada. “As crianças vão voltar, mas elas não têm discernimento correto para tomar os devidos cuidados. Se as próprias universidades adotam medidas para aulas online, como um estudante do ensino fundamental vai ter capacidade para enfrentar isso aí?”, questiona.

Além disso, Alana pontua que a maioria das crianças são assintomáticas. Grande parte delas convivem com os avós e podem levar a doença para dentro de casa. Conforme o relato da funcionária pública, há um grupo de mães contra a volta das classes presenciais.

“A gente sabe que é muito complicado para os pais este momento. Ficar no lugar do professor, assumir esse papel, ao mesmo tempo, é fundamental esse apoio. Até entendo que alguns pais têm de trabalhar, mas eu também tenho. Mas eu acredito que o retorno às escolas não é possível neste momento”.

Com o filho no 4º ano, a advogada Roberta Facundo, 35, frisa que as escolas de pequeno porte não oferecem estrutura para retorno seguro. “É preciso esperar mais um pouco. Pelo menos até julho. As instituições precisam dispor de álcool em gel. Além disso, não tem banheiros e pias suficientes para atender a todos sem aglomeração. O intervalo é curto. Não terão tempo de higienizar as mãos como devem e ainda lanchar”, afirma.

Roberta acrescenta ainda a falta de estrutura dentro da classe para dispor as carteiras e manter o distanciamento necessário. “Se um adulto descumpre as regras, imagina crianças? Muitas delas são mais conscientes que alguns adultos, mas nem todas. Sinceramente não sei se tenho coragem de mandar meu filho”.

 

Séries

O Sinepe propõe que as aulas do 4º ano do ensino fundamental até o 2º ano do ensino médio sigam previsão do Governo do Estado. O retorno ainda não está definido.

 

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