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MADE IN CHINA: Como o país asiático se desenvolveu e caminha para ser a principal potência do planeta
Reportagem

MADE IN CHINA: Como o país asiático se desenvolveu e caminha para ser a principal potência do planeta

China passou de economia planificada e comunista para uma economia de mercado que deve ao fim da década ser a maior economia do mundo. Mesmo em ano de pandemia, país fechou 2020 com crescimento do PIB
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O crescimento da China no mercado internacional (Foto: O crescimento da China no mercado internacional)
Foto: O crescimento da China no mercado internacional O crescimento da China no mercado internacional

Analisar o desenvolvimento econômico chinês nas últimas décadas é observar o espantoso sucesso de um país que saiu dos fundos do terceiro mundo para pouco mais de 40 anos depois rumar à economia mais pujante do planeta. Maior parceira comercial do Brasil, contribuindo com US$ 33,6 bilhões dos US$ 50,9 bilhões de ganho em 2020, a China ainda é bastante desconhecida pelos brasileiros - ainda pior: muitas discussões se restringem a visões sinofóbicas marcadas por desinformação.

O ponto inicial dessa mudança social e econômica da China foi em 1979, com a ruptura do modelo de governo da Revolução Cultural, que fechou o país para o comércio internacional. Para reabrir a economia, planejamento e decisões com base em dados - o chamado desenvolvimento científico, e não mais a ideologia tão somente.

O especialista em relações Brasil-China, professor de Direito Internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV) e consultor do China Desk do Veirano Advogados, Evandro Menezes de Carvalho, explica que a ideologia, apesar de ser presente no dia a dia chinês, não é levada em consideração nos negócios. A abertura econômica, porém, foi regulada, por meio das Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), em que algumas regiões do país se abriram para investimentos externos. Nas ZEEs, os investidores encontravam regime jurídico e econômico o mais próximo possível do praticado no mercado internacional. Tudo foi realizado de forma gradual, por experimentações que se dessem errado seriam descontinuadas. As Zonas, porém, foram um sucesso e o início do "socialismo com características chinesas".

A abertura dessa gigante com a maior população do mundo (atualmente 1,4 bilhão), que na época tinha uma mão de obra baratíssima e produtividade alta foi muito positivo para as indústrias vindas do ocidente. A contrapartida do governo chinês para as instalações era, em parte, o compartilhamento tecnológico. "A China assim vai se tornando uma grande fábrica para o mundo", analisa o professor da FGV.

Essa troca de conhecimento, destaca Evandro, foi fundamental para que a China deixasse de ser a grande fábrica do mundo, para fabricar para o mundo. Hoje, grandes marcas chinesas têm produtos de boa qualidade e lideram alguns segmentos. Isso fez com que a qualidade de vida na China aumentasse com a revolução econômica e fossem espantados velhos fantasmas do passado.

"Agora, no século XXI, a China passou a ter grandes marcas. Mais de 600 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema desde a abertura econômica. Afirmar que o trabalho escravo impera na China é coisa de quem desconhece completamente o cenário", afirma. A entrada do país na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, acelerou essa evolução.

Um levantamento de 2017 da consultoria Euromonitor revela que o salário médio na indústria chinesa já supera os valores pagos aos trabalhadores do Brasil. Entre 2005 e 2016, o custo da hora de trabalho na China triplicou de US$ 1,20 para US$ 3,60. No Brasil, o valor no mesmo período caiu de US$ 2,90 para US$ 2,70.

Esse desenvolvimento econômico, com a melhoria da qualidade dos serviços, maior tecnologia e produtividade na indústria, aliado ao desenvolvimento social, com a erradicação da pobreza extrema (pessoas com renda per capita superior a US$ 1,52 por dia) em 2020, está ligada à educação. Atualmente, dez universidades chinesas estão entre as 100 melhores do mundo. O Brasil, por exemplo, não tem representantes.

(Foto: AGÊNCIA BRASIL)

Essa evolução ameaça a grande economia do mundo. Na época da Revolução Cultural, a China tinha PIB de US$ 59 bilhões, enquanto os Estados Unidos eram de US$ 543 bilhões. Somente em 1998, o PIB chinês bateu US$ 1 trilhão, ao mesmo passo em que a economia americana era nove vezes maior. Em 2019, tudo mudou: A China passou dos US$ 14 trilhões e os Estados Unidos chegaram a US$ 20,8 trilhões.

No mundo pós-crise de 2008, temos uma nova superpotência, para alguns até com poder imperialista. "(Com) Diplomacia forte ao redor do mundo, pois agora é a China que vai para o mundo, com lógica "made by china", além do "made in china", afirma Evandro.

 

PIB 2020

A soma das riquezas produzidas na China teve alta de 2,3% em 2020. Foi o pior resultado nos últimos 44 anos. Porém, no restante da economia mundial, o cenário é desolador, de recessão por causa da crise causada pela pandemia. No Brasil, por exemplo, o tombo esperado para o PIB é de 4,5%.

EM BUSCA DE PARCEIROS

A China flexibilizou mais ainda a sua abertura econômica em 2020. Anunciou que vai suavizar as limitações para investimentos estrangeiros em propriedades de empresas que atuam em mercados futuros, de valores e de seguros de vida. O número de atividades restritas (chamada "lista negativa") caiu de 40 para 33.

PREVISÃO PRÉ-PANDEMIA

As previsões do Boletim Focus do Banco Central, no início de janeiro de 2020, eram bem mais otimistas. Alta de 2,3% para o PIB e superávit de US$ 38,2 bilhões para a balança comercial, com entrada de US$ 80 bilhões em investimentos estrangeiros. O que se concretizou e superou a meta foi o comércio exterior.

China na geopolítica internacional

ANTAGONISMO NORTE-AMERICANO
O peso geopolítico dos americanos será um ponto importante a ser observado, uma vez que a beligerância de Trump será substituída pelo tom diplomático de Biden. Neste novo desenho, a Rússia assume o papel de maior antagonista de Washington, com Pequim sendo monitorada, contudo sem o enfrentamento exposto e direto exercido por Trump.

REGIÕES AUTÔNOMAS
A China, que acredita possuir uma província rebelde em Taiwan, decidiu usar todo seu poder para cercear Hong Kong. O receio internacional é que use esta experiência e momento para avançar sobre Taipei, colocando a região em estado de alerta. A comunidade ocidental internacional se mobiliza para defender Taiwan de qualquer avanço chinês sobre seu território autônomo.

COVID-19
Pequim possui outras frentes de batalha. A principal é uma ofensiva de reconstrução de sua imagem, dilacerada após a disseminação da covid-19. O controle inicial da doença foi falho. Uma administração caótica do problema ampliou o alcance do surto, transformando a doença em uma pandemia com reflexos mundiais. Uma intervenção inicial e combinada teria sido crucial para evitar a propagação viral. Um fato que marcará para sempre a imagem de Wuhan.

PERSEGUIÇÕES
A reconstrução da imagem chinesa, entretanto, precisa ir muito além disso. A perseguição aos uigures ganhou espaço na mídia e precisa cessar. Se Pequim deseja reconstruir sua imagem depois da covid-19, deveria respeitar os Direitos Humanos da minoria uigur, cessar a pressão sobre Taiwan e as ameaças diplomáticas aos países que não desejam adotar seu padrão de 5G da Huawei. Hoje já são mais de 50 nações. A liberdade de expressão sofre ataques em Hong Kong e na China continental e a soberania de Taiwan é colocada em xeque por Pequim.

Márcio Coimbra é coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e Diretor-executivo do Interlegis no Senado Federal.

Para entender sobre a China

Para a promoção de um curso a distância, a ser realizado pela Fundação Demócrito Rocha e de curta duração, sobre o maior parceiro comercial do Brasil, vem sendo realizada pesquisa para identificar a imagem predominante do gigante asiático entre os brasileiros. Para participar basta acessar aqui.

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