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Relações trabalhistas: a falta de direitos para cerca de 1,9 milhão de trabalhadores informais no Ceará
Reportagem

Relações trabalhistas: a falta de direitos para cerca de 1,9 milhão de trabalhadores informais no Ceará

Sem uma regulamentação para esses trabalhadores, os direitos acabam sendo deixados de lado.
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Nos 80 anos da CLT, não são todos os trabalhadores que contam com a proteção das leis (Foto: Joao Paulo Tinoco)
Foto: Joao Paulo Tinoco Nos 80 anos da CLT, não são todos os trabalhadores que contam com a proteção das leis

Tecnologia, pandemia, reivindicações. Todas essas questões afetaram - e algumas ainda afetam - as relações trabalhistas. Porém, atualmente, um dos pontos mais discutidos nesse âmbito são os direitos dos trabalhadores informais, ou seja, quem está no mercado sem carteira assinada.

Com a taxa de informalidade em 53,3%, o que representa cerca de 1,9 milhão de trabalhadores, é perceptível para o auditor fiscal da Superintendência Regional do Trabalho do Ceará, Péricles Marques, que a pandemia ampliou essa situação.

“Devido a pandemia, as pessoas não saíam de casa, evitavam contato e até faziam o supermercado através dos trabalhadores de aplicativo. E, por conta da perda de postos de trabalho formais, houve uma expansão muito grande desse fenômeno, que já estava aumentando nos anos anteriores.”

Crescimento da informalidade traz problemas

No entanto, para o auditor fiscal, esse crescimento da informalidade vem com vários problemas. Um deles é o avanço das tecnologias e o fato do homem estar sendo substituído pela máquina. Isso faz com que postos de trabalho sejam excluídos em detrimento do uso das tecnologias e, consequentemente, mais trabalhadores recorrem à informalidade para sobreviver.

"Essas tecnologias não podem ser totalmente refutadas, já que aumentam a produtividade e a competitividade da nossa economia. Mas a perda de postos de trabalho também é um fator que empobrece o país. Então, é preciso que haja um equilíbrio.”

Além disso, o professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, Enéas Arrais Neto, aponta o fato de que quem está inserido nesse meio se considera autônomo, mas, na verdade, está dentro de uma lógica produtiva da empresa.

Modelo e lógica produtiva

“É uma realidade social que exige que ele produza um valor e se submeta a determinar uma quantidade de horas, muitas vezes além do que deveria. Assim, ele pensa que está sendo autônomo. Mas, caso decida trabalhar poucas horas, ou a empresa te corta ou você não ganha o que precisa para sobreviver”, defendeu.

Como solução, o professor recomenda, por exemplo, para o caso dos motoristas de aplicativos, que seja utilizado o mesmo método da França, a qual controla as horas da jornada de trabalho. “Eles têm um relógio com os números vermelhos bem visíveis no para-brisa dianteiro e traseiro. Então, quando sai para rodar, o relógio começa a cronometrar e assim que completa a quantidade de horas, é obrigado a parar. E, se forem pegos trabalhando depois do limite permitido, podem perder o direito de ser motorista.”

Aposentadoria é desafio maior

Outro ponto negativo é o fato do nicho não ter os direitos regulamentados. “São trabalhadores que podem não fazer contribuições previdenciárias e, por isso, podem ter dificuldade para conseguir a aposentadoria. Também é capaz de não terem a devida assistência em caso de acidente de trabalho e nem existe uma segurança salarial, porque, se não trabalham, não recebem”, explicou.

Por essa razão, o advogado trabalhista, Fernando Férrer, ressalta que antes mesmo de discutir se existe ou não um vínculo empregatício, é preciso pensar nos direitos que esses trabalhadores devem ter.

“As pessoas que aderem a prestação de serviços precisam ter, no mínimo, um seguro de vida oferecido por todas essas empresas e devem receber os equipamentos de proteção individual. Essas questões já deveriam estar postas e legisladas para fornecer a todos os trabalhadores.”

Para mais, ele também critica o fato dos congressistas brasileiros não trabalharem com a celeridade e a dedicação necessária que a informalidade precisa para garantir os direitos básicos aos empregados.

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Saiba mais sobre os 80 anos da CLT

Em 2023, o principal normativo trabalhista completa 80 anos de existência. Publicada em 1943, 2 anos após a instituição da Justiça do Trabalho no Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) concentrou diversas leis esparsas em um único texto.

Antes mesmo da CLT, os direitos trabalhistas foram sendo conquistados passo a passo, como o Decreto 3.724 de 1919, que tratava de acidente de trabalho, o Decreto 17.943-A de 1927, que proibia o trabalho de menores de 12 anos e, em horário noturno, também o de menores de 18 anos, dentre outros.

Além de consolidar leis já existentes, a CLT também instituiu novos direitos, como por exemplo o aviso prévio, pelo qual o empregado ou empregador que quisesse encerrar o contrato de trabalho deveria informar a outra parte com antecedência de 3 dias se o pagamento fosse realizado diariamente, 8 dias para pagamento semanal e 30 dias nos demais casos.

Desde a sua publicação, a CLT sofreu alterações que representam, em sua trajetória, a história da própria Justiça do Trabalho e do Direito do Trabalho. Dentre as mais recentes, destaca-se a Lei nº 13.467/2017 (chamada de Reforma Trabalhista).

Preservar e difundir a documentação custodiada pela Justiça do Trabalho, em especial os processos trabalhistas, possibilita a análise dessas alterações e as suas repercussões na vida dos trabalhadores.

Questões sociais, econômicas e políticas estão estampadas nessa documentação histórica aguardando para serem reveladas, confirmadas ou demonstradas por pesquisadores dos diversos campos do saber.

Discussões como essa farão parte do III Encontro Nacional da Memória do Poder Judiciário, em maio. Acompanhe as notícias relacionadas ao evento e a série de posts sobre gestão documental e memória que será publicada semanalmente, pelos cinco Tribunais organizadores do evento e pelo Conselho Nacional de Justiça.

Fonte:
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região

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