A Lei de Emergência Cultural distribuiu R$3 bilhões em recursos para municípios e estados efetuarem ações de mitigação dos impactos da pandemia do coronavírus no setor a partir de três linhas: inciso I, voltado à renda emergencial de profissionais da cultura, de execução dos Estados; inciso II, de subsídio de espaços culturais, executado pelos municípios; e inciso III, para promoção de editais e prêmios, entre outras ações, promovido pelos dois entes. Ao V&A, o secretário da Cultura do Ceará, Fabiano dos Santos Piúba, e a secretária-adjunta, Luisa Cela, apresentam panorama das ações da pasta e respondem às reações críticas a aprovações de projetos do inciso III.
A lei estabelecia que no mínimo 20% dos recursos recebidos pelos entes deveria ser aplicado no inciso III, com possibilidade de reprogramação posterior. A Secult, inicialmente, destinou 30% dos valores para ele e 70% para o inciso I, da renda emergencial. Na prática, o número de aprovados até o momento é pouco mais de 10% da estimativa: 1633, somando as primeiras 1304 pessoas aprovadas e as 329 que tiveram recursos aceitos mais recentemente. No total, foram 4232 solicitações.
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"A justificativa que temos encontrado é que muita gente já recebeu o auxílio emergencial existente e não poderia ter duplicidade", afirma Fabiano sobre a diferença entre a estimativa e os resultados alcançados. Segundo a secretária-adjunta Luisa Cela, a maioria das 1,3 mil pessoas aprovadas inicialmente já começou a ser paga. Um segundo momento de recursos se desenrolará, o que pode aumentar o total.
Além do número significativo de beneficiados com o auxílio emergencial geral no Estado, os gestores avaliam que dificuldades de acesso podem ter impactado nas solicitações. "A gente sempre vai ter dificuldade de acesso, então sem dúvida deve haver um núcleo de pessoas que não conseguiram se inscrever porque a informação não chega, não tem internet, não consegue operar a plataforma", elenca Luisa.
Pelo contexto, a pasta pôde remanejar recursos previstos inicialmente para renda básica e aplicá-los no inciso III, de editais. "Num primeiro momento, a gente tinha lançado R$21 milhões em editais e, com esse deslocamento, ampliou lançando mais dois editais com valores maiores", contextualiza a secretária-adjunta. O investimento foi para R$ 50 milhões, divididos em 12 editais que estão em diferentes estágios de execução.
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Com a publicação dos primeiros resultados, a aprovação de projetos assinados por pessoas reconhecidas no circuito cultural do Estado - em certos casos, até com vínculos empregatícios a nível federal - ou por instituições ligadas a espaços culturais privados da cidade foi alvo de questionamentos nas redes sociais, que chegaram ao Vida&Arte. A reportagem levou as questões à secretaria.
Segundo Fabiano, a participação e a aprovação de projetos neste perfil não ferem o edital. "Essa lei tem dois braços. O braço de proteção social está no inciso I e no inciso II e é uma experiência singular na política cultural brasileira, porque é a primeira vez que a gente trata a questão da proteção social de maneira estrutural, com orçamento. Qual o outro braço? O fomento. O inciso III é de fomento às artes e à cultura no Brasil a partir dos projetos desenvolvidos por artistas, instituições culturais, coletivos, companhias", afirma.
A pasta estabeleceu, conforme o secretário, "a cidadania cultural, a diversidade e as políticas afirmativas" como três princípios na construção dos editais. Não há, porém, impeditivos referentes aos pontos questionados. Fabiano reconhece que o principal debate está em torno dos resultados da categoria V do Prêmio Fomento Cultura e Arte do Ceará, "Trajetórias artísticas e culturais", que premia artistas "pelo conjunto de sua obra". Foram 26 selecionados de 13 linguagens, cada um recebendo R$100 mil em recursos.
"Nas demais categorias não houve muito debate, a não ser (o projeto aprovado) de uma empresa. É a comissão quem define", reforça Fabiano, acrescentando: "Certamente, se eu estivesse na comissão não teria aprovado, porque acho que já há um grau de estabilidade para algumas (instituições)". O gestor ressalta que as comissões de seleção, formadas a partir do banco de pareceristas da Secult e pessoas da pasta, são "autônomas" nas definições.
"Às vezes, as questões que são colocadas não percebem que esse inciso III tinha outra possibilidade", aponta o secretário, que informa, ainda, que a proposta da categoria V, incluindo o valor destinado, foi do Conselho Estadual de Política Cultural do Ceará (CEPC). "Por que um Ednardo, um Rosemberg Cariry, uma Sílvia Moura e um Carlos Gomide ganharam? São pessoas que têm trajetórias", afirma.
"Compreendemos que é um reconhecimento muito importante para realizadores e fazedores de arte que têm trajetórias reconhecidas. Inclusive, numa reunião do CEPC, foi debatida a possibilidade de termos, assim como já há na fotografia, prêmios para todas as linguagens", adianta Fabiano.
Apesar do edital não prever as vedações questionadas, Luisa afirma que é possível discutir incorporações do tipo em editais futuros. "A gente pode até discutir com o Conselho, com os fóruns, vedações que devem ser incorporadas. É importante vedar todo tipo de servidor, seja municipal, estadual ou federal? A gente tem um regramento que é legal, está na lei e deve ser aplicado, regramentos que são colocados em editais específicos. A gente só não pode desconsiderar a lei, mas pode adicionar regras que não ferem a lei", finaliza Luisa.
Números da Lei Aldir Blanc no Ceará
INCISO I (renda básica)
Estimativa inicial Secult: 16 mil beneficiários
Aprovados até o momento: 1633 (1304 de início, mais 329 pessoas que tiveram recursos aceitos)
Total de solicitações: 4232
INCISO III (editais)
12 editais
Investimento total: R$ 50 milhões
Total de processos: 1002
Fonte: Secretaria da Cultura do Ceará. O inciso II foi de responsabilidade dos municípios.