Uma das figuras mais conhecidas do planeta, Jesus Cristo tem uma vida envolta em significados e mistérios. Entre dados e documentos factuais sobre a vida do homem que passou pela Terra, escritos canônicos e textos apócrifos (ou seja, não reconhecidos por parte dos cristãos), são inúmeras as tentativas de preencher "lacunas" na biografia de Cristo e também versões simbólicas baseadas na vida dele. De abordagens mais tradicionais às mais singulares, as linguagens artísticas trazem diferentes visões de Jesus.
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Auto da Compadecida
Originalmente escrito pelo dramaturgo Ariano Suassuna em 1955, o texto teatral reúne literatura de cordel, comédia e aspectos do catolicismo. Na obra, Jesus é representado como um homem negro. Diversas adaptações da peça foram produzidas ao longo dos anos. Menos conhecida, a versão cinematográfica de 1969 traz o ator Zózimo Bulbul no papel.
Versão cinematográfica original de 'Auto da Compadecida', o longa 'A Compadecida' (1969) traz Zózimo Bulbul no papel de Jesus
Já em 1987, "Os Trapalhões no Auto da Compadecida" reuniu o texto com o universo da trupe comandada por Didi, tendo Mussum representando Jesus.
Mais recente, a versão de 2000 traz Maurício Gonçalves interpretando o personagem.
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A Última Tentação de Cristo
Publicado em 1951, o livro do grego Níkos Kazantzákis apresenta uma humanização aprofundada de Jesus. Isso causou controvérsia em parte da comunidade católica do país à época, culminando na excomunhão do autor em 1955. Em 1988, a obra foi adaptada ao cinema em filme com roteiro de Paul Schrader e direção de Martin Scorsese. No filme, Willem Dafoe interpreta o protagonista. Assim como o livro, foi alvo de controvérsia, chegando a ser censurado em alguns países. No cinema ou na literatura, a obra defende que a "tentação" do título refere-se a ser um homem comum. Apesar dos ataques às obras nas épocas de seus lançamentos, as repercussões também tiveram partes positivas, ressaltando o caráter "honesto" da representação de Jesus.
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O Evangelho Segundo São Mateus
"O melhor filme de Jesus de todos os tempos" segundo o jornal L'Osservatore Romano, do Vaticano, o longa de 1964 tem direção de Pier Paolo Pasolini, um cineasta controverso, ateu, marxista e homossexual. O longa é uma adaptação direta da Bíblia, sendo considerada a mais fiel aos textos sagrados feita até hoje. A opção do filme é por uma abordagem realista, longe do espetáculo de adaptações hollywoodianas. Essa escolha se revela pelo elenco, majoritariamente composto por camponeses sem experiência em atuação. Jesus é interpretado pelo jovem militante anarquista Enrique Irazoqui, o que adiciona camadas de revolução à representação.
Onde ver: o filme pertence ao catálogo da distribuidora Versátil no Brasil; confira disponibilidade em www.versatilhv.com.br
O Evangelho Segundo Jesus Cristo
O livro de José Saramago traz visão humanizada da vida de Jesus e, 30 anos depois do lançamento, segue alvo de reflexões e análises. Confira texto do Mestre em Literatura pela UFC e doutorando na Universidade de Nápoles Matheus Vieira:
O assombro, já dissera Platão, é uma ação filosófica por excelência, pois é a partir dessa sensação que o sujeito assombrado produzirá uma reflexão sobre aquilo que o assombrou. O assombro também é uma reação estética. O crítico estadunidense Harold Bloom entedia que as grandes obras literárias chocam seus leitores, à primeira vista, pela sua singularidade, ou seja, pela sua capacidade de dilapidar nossa percepção pré-concebida da realidade, descortinando-nos um outro lado da realidade. Os textos literários, dessa forma, empurram-nos para além do lugar comum da existência cotidiana e das histórias que se querem transvestidas em mantos de verdades absolutas. A literatura, como certa vez afirmara José Saramago (1922 – 2010), também pode apresentar a sua versão da história, e é isso que faz esse escritor português no livro "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" (1991). Nesse romance marcado pela latente ironia, a jocosa provocação e a iminente polêmica, Saramago revisita figuras bíblicas, como: Maria, José, Deus, Madalena e Jesus, esse último personagem central da narrativa, e que será apresentado em sua face mais humana, aquela que contemplará suas virtudes, mas também os seus vícios. Jesus não escapará, por exemplo, de feéricas paixões por Madalena. Além disso, Jesus, como personagem, é um sujeito fraco, débil, medroso, inseguro. Jesus é humano porque erra, porque é ciente das suas incapacidades e porque sofre por ser um náufrago da existência à deriva em um vale de lágrimas. Jesus é, enfim, vizinho a nós, seus leitores, e não distante enquanto figura mítica. Assim como nós, ele nasceu sujo, solitário e chorando a existência, conforme narrado no romance: “o filho de José e Maria nasceu como todos os filhos dos homens, sujo pelo sangue de sua mãe, viscoso pelas suas mucosidades e sofrendo em silêncio. Chorou porque o fizeram chorar, e chorará por esse mesmo e único motivo”. Esse Jesus não ressuscitará Lázaro, pois “ninguém na vida teve tantos pecados que mereça morrer duas vezes”, encontrará amor carnal e espiritual em Madalena e pedirá desculpas aos soldados romanos pelo teatro da crucificação montado por Deus (“homens, perdoai-lhe, porque ele não sabe o que fez”). Para ler o Evangelho de Saramago é preciso desconsiderar o estado sagrado das Escrituras e lembrar que fatos eternos e verdades absolutas são conceitos infundados; mais que isso, o leitor deve ter em mente que a história, sagrada ou não, é sempre uma iluminação do presente, por isso passível de ser questionada às vezes mediante a paródia de seus alicerces estruturantes, como determinadas figuras sagradas. José Saramago uma vez declarou que a função do escritor é desassossegar o leitor e, platonicamente, assim o faz em o Evangelho Segundo Jesus Cristo.
Matheus Vieira é pesquisador de Literatura
Biografias
Uma busca constante de historiadores e pesquisadores de todo o mundo é por refazer os caminhos de Jesus, procurando provas factuais da passagem do homem pela Terra como documentos, registros e itens. Um dos mais conhecidos autores de obras no tipo no Brasil é o jornalista Rodrigo Alvarez, que assina duas publicações dedicadas ao tema. A primeira lançada foi "Jesus, o homem mais amado da História" e, anos depois, o autor produziu uma continuação do livro, intitulada "Cristo", onde reescreve os acontecimentos que ocorreram após a morte de Jesus. Outra obra que destrincha aspectos não tão abordados da biografia do ícone religioso é "Onde estava Jesus dos 13 aos 30 anos", do cearense Jeovah Mendes, que, como o título sugere, se debruça no pouco conhecido período da juventude de Cristo.
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Outras obras
Onde estava Jesus dos 13 aos 30 anos
O livro do pesquisador cearense Jeovah Mendes pode ser encontrado no Instagram @jeovahmendessoficial
The Way of the Wind
Com previsão de estreia para este ano, novo filme do diretor Terrence Malick reconta episódios da vida de Cristo, que será interpretado pelo ator húngaro Géza Röhrig
A Via Láctea
Comédia dramática de Luis Buñuel, traz representações de eventos bíblicos a partir de uma peregrinação de dois homens em Santiago de Compostela. Disponível no Telecine
Jesus Cristo Superstar
Musical de ópera rock que reconta as últimas semanas de Jesus, foi adaptado para o cinema em 1973. Disponível no iTunes
A Vida de Brian
Do grupo Monty Python, o longa faz uma paródia bíblica ao contar a história de Brian, nascido no mesmo dia de Jesus e que acaba sendo confundido com o verdadeiro Messias. Disponível na Netflix