A investigação de um assassinato numa pequena cidade do estado da Pensilvânia impacta a vida da detetive Mare Sheehan e da comunidade do local. É este o ponto de partida de “Mare of Easttown”, nova minissérie da HBO.
Criada, roteirizada e produzida por Brad Ingelsby, a obra tem a premiada atriz Kate Winslet como a protagonista e, em sete episódios, desenvolve a história marcada por tragédias e revelações. A produção estreou no último domingo, 18, e é exibida semanalmente às 23 horas, ficando também disponível na HBO GO. Em entrevista publicada com exclusividade pelo Vida&Arte, o criador e showrunner descreve o processo de criação da série, adianta detalhes e celebra a “sorte” de contar com Kate no protagonismo. Confira!
Qual é a gênese de Mare of Easttown?
Brad Ingelsby - Veio da vontade de escrever sobre o meu local de origem. A cidade da série é uma versão ficcional do lugar onde eu cresci. É uma espécie de colagem de vários pequenos pontos perto da Pensilvânia, mas eu acho que na verdade vem da vontade de escrever sobre a ideia de “casa” e sobre alguns ritmos e rituais dos lugares onde eu cresci. Então obviamente eu quis escrever um personagem como a Mare – uma pessoa que achei que estava realmente interessada em entrar em uma encruzilhada na própria vida. Ela acabou de ter uma crise pessoal, está tentando consertar sua vida, e a isso se somam o mistério e a pressão para resolver o desaparecimento e o assassinato dessas duas garotas… Achei que era um ponto interessante para começar.
A Mare é baseada em alguma pessoa específica?
Brad - Não em uma pessoa específica. Eu cresci cercado de um monte de atletas, então eu conhecia essa coisa de ter vivido um passado de glórias e precisar criar uma segunda vida, de certa forma. Você é aclamado na adolescência e está no centro das atenções. Mas qual será o segundo ato da sua vida? Eu sempre achei isso muito interessante, sobretudo em atletas que cresceram de um modo diferente da maioria das pessoas. Em geral, só vemos isso em homens, então achei que seria uma grande subversão. A expectativa do público é sempre ver o atleta homem, não é? Bem, ok, vamos ver então o que acontece com uma mulher. Depois você acrescenta todas as questões pessoais com as quais ela está lidando, como a perda do filho; a mãe com quem ela não se dá bem e que de repente está dentro da casa dela; o relacionamento com a filha que é sempre difícil, principalmente depois da morte do Kevin.
Então eu senti que estava jogando todas essas questões para ela. Mas a Mare também é forte. Ela é uma mulher obstinada, e tem um conjunto de crenças e valores. Uma das coisas que eu sempre admirei na Mare é uma certa gentileza que ela tem com estranhos e que nem sempre é demonstrada aos seus entes mais próximos. Eu achei que isso era realmente interessante – ela pode ser de fato boa, gentil e ter compaixão por estranhos, mas em casa ela é uma mulher diferente. De vários modos, sua viagem nessa história é o retorno à família. Ela se distanciou de várias formas das pessoas da sua casa. E a viagem é o modo de lentamente ir voltando – de um jeito bem típico da Mare.
Como você descreveria o mundo em que a série é ambientada?
Brad - É engraçado, sabe? Eu cresci em uma comunidade muito legal que fica a mais ou menos meia hora da Filadélfia. Mas no lugar de onde eu venho, os meus pais eram tipicamente da classe trabalhadora. Meu avô teve um bar na cidade, onde se reuniam muitos operários da construção; o pai dele era alcoólico e não estava por perto. Então ele tinha esses valores bem da classe trabalhadora. Era isso que eu queria realmente retratar, não queria ser condescendente de jeito nenhum. Existe um heroísmo em simplesmente se levantar todas as manhãs e ir trabalhar em algo de que você não necessariamente gosta, mas fazer isso por um senso de dever e compromisso com a sua família. Eu de fato admiro isso. Eu queria descrever essas pessoas com uma verdadeira compaixão e queria transmitir esse senso de heroísmo, o heroísmo das pessoas comuns. É engraçado que não vemos isso com muita frequência na tela. O Ken Loach [diretor de cinema britânico] faz isso superbem, mas não é algo que se vê com frequência. Então eu queria pegar essa ideia, criar um conjunto de personagens reais e levar para a tela.
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Como Kate Winslet chegou ao projeto?
Brad - Isso foi totalmente por sorte. Tínhamos dois roteiros prontos e estávamos começando a pensar quem poderia fazer uma Mare incrível. Obviamente pensamos na Kate e enviei os dois primeiros roteiros para o empresário dela. Ela leu quase a noite toda, o que, você sabe, é uma loucura neste setor. Normalmente levam semanas até uma atriz como a Kate olhar o material. Depois conversamos e ela disse algo como: “Genial, estou dentro”. Mal podíamos acreditar, mas acho que ela realmente se apaixonou pela ideia de fazer uma coisa diferente. Eu acho que ela gostou mesmo da oportunidade de interpretar uma detetive em uma cidade pequena. E devo dizer que eu considero que uma das coisas especiais desta série é que assim que você a vê na tela, você acredita plenamente que ela é uma detetive de uma pequena cidade da Pensilvânia. A convicção dela... Assim que você a vê em cena, você compra o personagem, o que é incrível.
Que tom você estava buscando para Mare of Easttown?
Brad - Eu acho que uma coisa que as pessoas realmente vão admirar na série é o senso de humor. Obviamente é uma série séria, de mistério. Você está lidando com o desaparecimento de uma garota e com a morte de outra. Então há questões pesadas, mas a Kate e a Jean Smart [Helen], principalmente, trouxeram essa leveza que ajuda a equilibrar os temas na série. Nunca é pesado demais e sempre há algum riso. A Kate sempre está perguntando “aqui tem uma risada?, aqui tem uma piada?”. Isso acontece porque ela conhece as histórias muito bem e sabe que quando você está lidando com questões pesadas e que precisam de alguma leveza. Nunca tinha trabalhado com ela antes. Ela é muito divertida e muito gentil.
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Como ela foi afetada por interpretar essa personagem durante um período tão longo?
Brad - Em primeiro lugar, você tem razão – foi um longo processo. Imagino que a Kate mergulhou em todas as suas personagens, mas esta foi provavelmente a melhor parte de dois anos para ela. Além disso, acho que algumas das experiências da Mare foram duras de interpretar: o fracasso como mãe, o fracasso como detetive. E quando você começa a juntar tudo isso, isso afeta você.
Mare of Easttown
Quando: todo domingo às 23 horas
Onde: HBO e HBO GO