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Da Escola do Pirambu, Garcia se inspira no imaginário ancestral para produzir arte
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Da Escola do Pirambu, Garcia se inspira no imaginário ancestral para produzir arte

José Garcia dos Santos Gomes, mais conhecido apenas como Garcia, segue um padrão de arte naif e divulga suas obras no perfil do Instagram @garciaartenaif
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Garcia busca honrar a memória do mentor Chico da Silva (Foto: Arquivo pessoal)
Foto: Arquivo pessoal Garcia busca honrar a memória do mentor Chico da Silva

Em meio a tantas situações trágicas da vida real, a mente dorme e acorda assombrada. Entre informações constantes da televisão, do celular e de outras tecnologias, o mundo racional - por vezes - parece desesperançoso. Mas José Garcia dos Santos Gomes encontra um universo mais bonito quando está pintando. Na realidade que desenha com as próprias mãos, descobre a cor, os animais, a natureza e, principalmente, a fantasia. "Para mim, é bom demais sair daqui e ir para outro local", comenta.

Quem se depara com suas obras nas redes sociais, por meio do Instagram @garciaartenaif, nota semelhanças a um famoso artista do Ceará, Chico da Silva (1910 - 1985). Os dragões, os pássaros, os peixes e os tons vibrantes revelam que os dois compartilham do mesmo "microcosmo" artístico.

Entretanto, as telas não são iguais. "Eu trabalho com várias temáticas. Posso até repetir a briga de galo, mas classificar o trabalho de dentro é difícil. Vou criando e começo a trazer para tela o que estou vivenciando no momento", explica.

A inspiração no artista naif é proposital: "Enquanto eu puder continuar trazendo o conhecimento sobre a arte do Chico da Silva, vou lembrá-lo. Vou continuar sempre lembrando dele através da arte". Essa relação, que atravessa décadas, começou quando Garcia ainda era criança. Ao chegar da escola, observava o artista, que era seu vizinho, pintar. Era jovem, mas acompanhava o processo de produção de perto.

"Na época, o Claudionor já estava presente. Depois veio o Babá, a Francisca e o Ivan", recorda. Esse grupo de crianças e adolescentes que moravam no Pirambu e gostavam de acompanhar aquele trabalho artístico viria a formar a "Escola do Pirambu".

Durante os dias, cada um desenvolvia as próprias técnicas. "Ao longo dos anos, tivemos a oportunidade de aprender com ele. Fomos nos desenvolvendo aos poucos. Dentro do modelo que nos ensinava, aprendíamos a pintar", comenta.

As obras que eram feitas dentro daquele espaço eram vendidas com assinatura de Chico da Silva - porque era ele o "mestre". Após um período, todos os artistas que integravam a escola seguiram seus próprios modelos de criação. "Cada um teve sua liberdade de criar. O meu estilo de pintura está dentro da mesma modalidade do Chico", comenta.

Quando estava próximo de se aposentar, Garcia retomou a produção de quadros
Foto: Arquivo pessoal
Quando estava próximo de se aposentar, Garcia retomou a produção de quadros

Entretanto, sua relação com a produção de obras parou por alguns anos. "Passei mais de uma década sem pintar. Fui trabalhar com outras coisas", explica. Ele retornava para o meio artístico esporadicamente para fazer algumas homenagens ao seu mentor, mas, na vida cotidiana, tinha outra carreira com o objetivo de sustentar a família. Próximo de se aposentar, já nos anos 2000, retornou a produção.

"Às vezes, a gente precisa de motivação para trabalhar. Eu trabalhei em duas profissões porque sou pai, tinha que sustentar minha família. Nunca tive o desejo de abandonar, tanto que agora que me aposentei, peguei meu dinheiro e comecei a comprar material", afirma.

Desde que voltou a atuar no meio das artes, segue em frente por causa das oportunidades que surgem. Entre algumas propostas e encomendas, vende seus quadros. A maioria do que tem agora foi feito há alguns anos. "Fui vendendo aos poucos e estou motivado de novo. Vou devagarzinho, fazendo na medida do possível. Agora eu fico ainda mais motivado a trabalhar, porque tem alguém que está me procurando e está interessado."

Acerca da movimentação para o retorno ou compra do painel "Homens Trabalhando" pela Universidade Federal do Ceará (UFC), ele acredita que haverá uma reação positiva. "O quadro é da Escola do Chico da Silva. A universidade não tem nenhum documento afirmando que comprou. Eu já disse para várias pessoas que, se eles querem ficar com a obra, precisam pagar. Eu agradeço muito a esse movimento que está acontecendo agora."

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A escola de Chico

Aqueles que passavam pela Praia Formosa, no Pirambu, durante a década de 1940, encontravam um cenário diferente do restante da cidade: nos muros das casas dos pescadores, havia pinturas de vários animais típicos da memória ancestral do Brasil.

Era um homem considerado "esquisito" que pintava aquilo, um indígena que veio do Acre e fincou suas raízes em Fortaleza. Chico da Silva (1910 - 1985) tinha uma fama de "louco" pelos moradores. Afinal, o que ele fazia não podia ser "arte", já que não era de procedência europeia.

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"O Brasil sofreu um processo de colonização, em que se colocou na nossa cabeça, ideologicamente, que a cultura verdadeira era a cultura europeia. Esse processo sombreou nossas manifestações culturais", pontua Roberto Galvão, artista plástico e autor do livro "Chico da Silva e a Escola do Pirambu" (1985). Essa percepção do acreano somente mudou quando o pintor suíço Jean-Pierre Chabloz (1910 - 1984) passou a incentivar o potencial artístico do autor das obras.

 
 
 
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Aquele homem da Suíça acreditava que as pinturas de Chico da Silva eram revolucionárias, algo que nunca tinha visto antes. "Por isso, começou a divulgar e comprar as coisas dele", afirma Roberto. Assim o acreano ganhou relevância local, nacional e internacional.

"Ele chegou a ter uma produção tão grande que as mercearias do Pirambu vendiam papéis para desenho, guaches para pintura e telas. Acho que, hoje em dia, se você for em outros bairros fora da Aldeota, é difícil encontrar esses materiais. Era uma movimentação de capital significativa, principalmente, para um bairro pobre", indica.

Com o aumento da demanda, decidiu criar a "Escola do Pirambu". Neste local, crianças e adolescentes com talento para as artes trabalhavam e aprendiam ao seu lado. O espaço - fenômeno corriqueiro no universo artístico - se tornou motivo de questionamentos. As mídias e os compradores de obras consideravam que aquilo era "falsificação".

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"Muitos artistas têm auxiliares. O artista está se tornando, ou sempre foi, um maestro. É ele quem rege a produção. Em princípio, isso era o que o Chico fazia", explica Roberto Galvão.

Ao longo do tempo, os jovens da escola ficaram à margem do circuito das artes da Capital. Eram considerados por muitos como "falsificadores". Entretanto, eles desenvolveram características próprias na produção. O autor comenta: "Se você tiver o olho treinado para a escola, mesmo assinado por Chico, você identifica se é Garcia, Babá, Ivan, Chica ou Claudionor."

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