Em 17 de novembro de 2022, a então governadora do Ceará Izolda Cela sancionou no calendário oficial de eventos e datas comemorativas do Estado o Dia da Música Cearense. A data da lei nº 333/2022, de autoria do deputado estadual Queiroz Filho (PDT), passou a ser celebrada anualmente em 26 de outubro, em referência ao dia de nascimento do cantor e compositor cearense Belchior.
Em 2023, portanto, é celebrado pela primeira vez o Dia da Música Cearense, criado para homenagear nomes da música do Estado como Belchior e outros, inclusive que “já partiram e que pelo seu trabalho de alguma forma deixaram marcas", como Tarcísio Sardinha e Izaíra Silvino.
Qual, então, a importância desta data? "Manifestar o desejo de verdadeiramente valorizar o músico cearense, seja por meio das pessoas ou dos poderes públicos em suas ações políticas", destaca Wilker Silva, idealizador do projeto.
Uma das categorias que se encaixam nesse reconhecimento é a de compositores. Por diversas vezes, eles também administram o lado intérprete, cantando não apenas as próprias composições, mas as de outros artistas como forma de seguirem as carreiras. Assim, o Vida&Arte busca propor a reflexão sobre os desafios de se viver da música autoral no Ceará.
Da MPB ao forró, as composições de artistas locais seguem pulsando, mas autores encontram empecilhos na projeção dos trabalhos. A cantora e produtora cultural Gabriela Mendes relata que o lado como compositora anda junto com o de intérprete, mas o que mais a incomoda é conciliar “a intérprete com a compositora”.
“Nós, enquanto intérpretes, principalmente quando trabalhamos na noite, não sentimos uma abertura para receber a nossa produção musical. Quando estamos cantando na noite, as pessoas estão ali para ouvir um repertório que conhecem e gostam de escutar”, analisa. Ela complementa: “Ainda sentimos um pouco de dificuldade para inserir a nossa produção dentro do repertório que é executado”.
Com influências variadas em sua trajetória e carreira “fincada” dentro da música regional, Gabriela tem repertório que passeia pelo forró e cujas composições têm como “cores”, por exemplo, o baião e o xote. Há, porém, outros estilos, como bossas e boleros. Ela relata que, na maior parte das canções, as letras são de outras pessoas.
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Para ela, os principais desafios quanto à carreira autoral se relacionam com a formação de público. A artista relata dificuldades de conseguir shows em estabelecimentos comerciais nos quais consegue colocar suas músicas devido à preferência da plateia por apresentações que tenham canções mais conhecidas.
Apesar das adversidades, Gabriela pontua que “sempre gosta de pensar que o cenário está propício” para os artistas locais - e reflete sobre a importância de apoio público. “Alcançar essa projeção depende de vários fatores e principalmente das políticas públicas que incentivem esse tipo de produção. Há o Festival da Música de Fortaleza, que incentiva, mas sentimos falta de uma cota de 50% a 70% para as músicas selecionadas serem cearenses”, enfatiza.
A musicista, cantora e compositora Rebeca Câmara indica que um desafio constante na carreira autoral é “criar uma base de público que conheça o seu trabalho, te escute, te acompanhe e goste do que você faz”. Ela concorda que o cenário da cena autoral cearense é “muito rico”, mas relata ser difícil “alcançar algo além daqui” em termos de projeção.
Com experiência em cantar músicas de outros artistas e também as próprias composições, Rebeca vê os lados de compositora e intérprete como complementares. As referências na composição acolhem de Tom Jobim a Ivete Sangalo, passeando por bossa nova, xote, pop, MPB - "um pouco de tudo". "Eu gosto de compor sobre amor, sobre meus anseios, sobre temas leves, com uma visão mais positiva das coisas. Às vezes, eu só deixo fluir", compartilha.
Quem traz visão semelhante ao compor é Edinho Vilas Boas. Com mais de 25 anos de carreira, o intérprete “gosta muito de falar sobre a vida e o amor” em seus trabalhos. As inspirações passam por nomes fortes da MPB, como Caetano Veloso e Chico Buarque, e também por referências do Estado, como Ednardo e Belchior, mas há espaço também para artistas como Chico César e Paulinho Moska.
Atualmente, sua carreira engloba shows em eventos sociais, corporativos e autorais. “O lado intérprete me dá sustentação e deixa eu sobreviver de música, faz as coisas andarem mais rápido. O lado compositor vai crescendo aos poucos, tendo suas vitórias aos poucos”, revela. “Estou sempre buscando vender meu show autoral”, reforça.
Essa mistura é uma oportunidade para mostrar seu trabalho em um meio recheado de “desafios para sobreviver”. “A carreira de composição é tão desafiadora que você tem que dividir. Isso torna o cenário um pouco mais complicado. Nós tentamos abraçar as duas coisas (canções de outros artistas e autorais), dar uma misturada, para tentar conscientizar as pessoas e trazê-las para a nossa música”, detalha.
Esse é um dos pontos primordiais: o conhecimento da “pluralidade da música brasileira" atualmente. "Um dos maiores desafios hoje é fazer o público entender que precisamos fortalecer essa cultura, que as pessoas consigam apreciar os novos artistas", avalia.
Ele analisa que o cenário da música autoral no Ceará tem melhorado bastante, com novos artistas surgindo. Edinho defende a “união de forças” para que a cena se consolide ainda mais: “Não podemos nos isolar, temos que conhecer os trabalhos dos outros, tocar músicas dos outros”.
Os artistas
O podcast Vida&Arte é destinado a falar sobre temas de cultura. O conteúdo está disponível nas plataformas Spotify, Deezer, iTunes, Google Podcasts e Spreaker. Confira o podcast clicando aqui
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