No dia 3 de outubro, o artista curitibano Bruno Hrabovsky se apresentou no Theatro José de Alencar, com a turnê “Rock ao Piano - Especial Queen”. Ao Vida&Arte, ele havia declarado que estava “feliz” por sua segunda apresentação em Fortaleza ser no equipamento cultural.
Nas redes sociais, ele reforçou o sentimento de alegria, mas também compartilhou um desapontamento que teve no meio da jornada: não conseguiria utilizar o piano do teatro, um Steinway D, e teria que locar um piano Fritz. “Sem dúvida um grande evento… mas fica minha expectativa para que algum dia o Governo do Ceará consiga recuperar um bem tão valioso”, escreveu na publicação.
Procurado pelo O POVO, Bruno explica que a postagem era uma “cobrança para que o governo se atente a seu patrimônio”. Quando ele fez a solicitação do espaço para a realização do show no TJA, o site do equipamento ainda tinha em seu rider (lista de equipamentos e instruções técnicas para que uma casa receba um espetáculo) um piano, o que motivou a escolha do local.
“Eles me enviaram todos arquivos e, quando fui conferir, estranhei que no rider não constava o piano, então questionei a respeito. Foi então que me esclareceram que o rider que eu tinha visto ano passado estava desatualizado, e que o que me enviaram era o atual, ou seja, já não contavam mais com o piano. Fiquei chateado e preocupado: será que seria possível fazer o concerto?”, conta.
A solução foi a locação do instrumento, gerando um custo extra ao artista, mas ele optou por manter este plano, pois queria continuar com a data escolhida para a performance. “Imagino que o corpo do teatro tenha pouca força de ação, precisa que o Estado aprove o restauro de seu patrimônio”, arremata.
No dia 10 junho, o Sindicato de Músicos do Ceará realizou uma publicação no Instagram com tom de denúncia, divulgando que os dois pianos do TJA estão com necessidade de reparos.
Heriberto Porto, professor do curso de Música da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e membro da diretoria do Sindimuce, conta que houve uma resposta do teatro ao sindicato sobre a situação, informando que os instrumentos não estavam para uso.
“TJA enfrenta desafios que demandam um processo mais amplo e cuidadoso de manutenção, além da necessidade de aquisição de novos equipamentos para modernizar o espaço”, dizia o início da nota de resposta.
O equipamento explicou ao Sindimuce que todos os artistas que faziam solicitação do espaço eram informados sobre o déficit com os pianos. Heriberto aponta que a situação com os instrumentos são antigos e remetem a um tempo antes da pandemia da Covid-19, mas que tiveram a situação agravada nos últimos anos.
Dalwton Moura, músico e produtor cearense, chama a atenção para outros pontos trazidos na resposta do equipamento, como "não haver um prazo para a resolução do problema". Ele também lista: "A não explicação sobre como um dos pianos foi atacado por cupins - uma triste metáfora da politica cultural no Ceará. Um piano caríssimo no mais simbólico equipamento cultural do Estado ser roído por cupins".
Heriberto complementa, criticando a resposta do teatro sobre avisar aos artistas que, para a realização de uma apresentação com o instrumento, é necessário a locação. Segundo ele, “demonstra uma falta de conhecimento da importância de um piano em um teatro como o Theatro José de Alencar”.
“É um teatro que tem a vocação para a música e inúmeros repertórios são prejudicados. Não é qualquer repertório que se coloca um teclado elétrico (por exemplo). A música popular (brasileira) em diversos gêneros precisa do piano para muitos repertórios, não é só a música erudita”, sustenta.
Em respostas enviadas por e-mail, a gestora executiva do Theatro José de Alencar, Natália Escóssia, falou ao Vida&Arte sobre o caso.
Segundo ela, o instrumento está precisando de um reparo desde 2019, mas que declara: “Secretaria da Cultura do Ceará (Secult Ceará), o Instituto Dragão do Mar (IDM) e o Theatro José de Alencar (TJA), junto à Fundação Amigos do Theatro José de Alencar (FATJA), têm articulado formas de obter verba para estas atividades”.
Natália também explica que o piano foi uma doação da década de 1990 para a FATJA e reforça que o teatro, assim como as outras instituições mencionadas anteriormente, estão em diálogo com a Fundação para “assegurar e promover” o cuidado do patrimônio.
Por fim, a gestora do equipamento cultural informa que o artista foi avisado sobre a situação com o piano ao solicitar o uso do espaço — como mencionado anteriormente no início desta matéria.
“Todos os artistas que solicitam o uso do piano são informados, imediatamente, que o mesmo não está em uso. Geralmente, estes proponentes realizam suas atividades adaptando seus espetáculos”, afirma.