Além das mudanças estruturais e conceituais, a grande reforma vivenciada pelo Theatro José de Alencar (TJA) em 1990 também presenteou o equipamento, restrito ao Foyer e Salão Principal, com mais 2.600 m² ocupados pelo Centro de Artes Cênicas do Ceará (Cena).
No complexo, que antes abrigava as antigas instalações da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), além de salas de aula, surgiram espaços cênicos suplementares, como o Teatro Morro do Ouro e a Sala de Teatro Nadir Pápi Saboya.
No ano seguinte, junto da inauguração, tem início o Curso de Princípios Básicos de Teatro (CPBT) do TJA, fundado pelos atores e educadores Joca Andrade e Paulo Ess. Na época, o objetivo era suprir a carência de cursos de iniciação às artes cênicas em Fortaleza.
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Hoje, o CPBT é visto como o mais importante curso de iniciação teatral do Estado, tendo recebido mais de 9 mil alunos, que resultaram em cerca de 65 espetáculos de conclusão, com mais de 1.200 estudantes formados.
Para a professora Neidinha Castelo Branco, o êxito do TJA no âmbito formativo está, sobretudo, na capacidade de acolher uma grande diversidade de formações e capacidades cognitivas.
"É gratificante para nós, professores, saber que o CPBT é procurado por pessoas dos mais diversos estratos sociais e culturais. Trabalhar com essa diversidade é fundamental para a formação do ator e do cidadão, porque reforça a ideia de que precisamos uns dos outros não somente na coletividade óbvia que a montagem de um espetáculo precisa para acontecer. O mais importante é que essa formação tenha impacto fora do ambiente artístico para ganhar corpo nas relações sociais", destaca.
Para celebrar conquistas como essas, o Theatro José de Alencar promove uma programação especial gratuita nesta terça-feira, 17.
Sob o mote "TJA 115 anos: O passado ecoa. O agora cria", o equipamento realiza uma edição especial do "Theatro de Portas Abertas" e ocupa diferentes espaços do equipamento com atrações teatrais, performances, música e atividades que celebram a cultura popular.
Às 18 horas, a turma do CPBT noturno de 2024 apresenta o espetáculo "Ecos", sob a direção de Neidinha Castelo Branco. Conversando com a história que se celebra na data, a peça reúne três narrativas distintas para abordar a memória e o tempo.
Investigando a memória enquanto comunidade, enquanto grupo e enquanto fator individual, a narrativa busca refletir sobre os impactos das lembranças na construção do tempo e a importância desses registros para a sociedade e o indivíduo.
Para o ator Emerson Manuel, além da honra em apresentar o espetáculo escolhido na noite celebrativa, a convergência do tema com o momento vivenciado pelo equipamento não parece ser mera coincidência.
"Trazer uma história sobre memória justamente no dia em que se celebra a memória do próprio Theatro, que tantas vezes foi renegado pelas políticas públicas, deixado de lado, não colocado como prioridade, é uma forma de lembrar as pessoas da importância desse lugar para a nossa Cidade", defende o também jornalista.
Ponto de Vista: Um marco político
O TJA é um marco político. Embora não seja o nosso equipamento público de cultura mais antigo em atividade, ele possui uma centralidade nesse campo. Pela história do TJA, podemos ver diferentes abordagens e investimentos de políticas públicas para a cultura no nosso Estado.
Nesse sentido, ele é um balizador da urgência e da importância de uma atenção continuada e regular por parte dos agentes públicos para o setor cultural, um sinalizador poderoso de que a cultura é um direito.
Ainda, pensando no horizonte da linguagem teatral, é louvável que o TJA tenha, ao longo de sua vida, aprendido a falar com um lastro diverso de realizadores e públicos. Embora ainda hoje sirva às elites econômicas e políticas, visto que as solenidades ficam bonitas naquele cenário, não está amarrado a um entendimento de teatro que conforte esse público específico. No palco do TJA, cabem todos os teatros e cabe tudo de teatro. O TJA funciona para óperas, abarca experimentações do teatro moderno ao contemporâneo e tem também um carinho especial pelas manifestações ligadas às tradições populares.
O que talvez seja ainda mais importante é que o TJA se consolidou como um espaço que promove encontros de artistas veteranos e iniciantes, bem como de audiências letradas e especializadas com projetos de formação de plateia. O TJA é de todos.
Uma possibilidade que considero estratégica para o futuro é algo que já está, na verdade, no passado do equipamento. Hoje, temos na cidade inúmeros espaços de formação de atores e encenadores. Há, porém, uma lacuna pesada na formação de profissionais de áreas como cenografia, iluminação e indumentária.
Além disso, já que estamos em pleno aniversário de 115 anos, por que não sonhar com uma biblioteca ampliada para o TJA, funcionando naquele prédio vizinho, abandonado pelo IPHAN?
Evidentemente, qualquer incorporação de novo projeto ao TJA só faz sentido se o equipamento estiver funcionando de modo pleno e seguro no que diz respeito à sua estrutura física e com recursos suficientes para dar conta daquilo que é de mais ordinário: ser palco e plateia para quem vive Fortaleza e o Ceará.
Programação de 115 anos do Theatro José Alencar