Com páginas branquinhas ou amareladas pelo tempo, os livros são portais que transportam seus leitores para diversas realidades. Fontes de conhecimento e inspiração, eles vêm em uma variedade de tamanhos e texturas, mas sempre mantendo o poder de imersão em universos de sons, aromas, cores e emoções. O ato de folhear as páginas, porém, tem sido trocado pelas cores vibrantes e luzes estimulantes de tablets e smartphones, especialmente entre as crianças – uma mudança que causa preocupação entre especialistas e pressão sobre mães.
Mesmo sem buscar a tacanha dualidade entre “tradicional x moderno”, “livro x dispositivo eletrônico”, é importante lembrar que os livros são responsáveis por despertar o raciocínio, aumentar a imaginação, melhorar o vocabulário, ampliar o pensamento crítico, além de contribuir com muitos outros benefícios para seus leitores. Diferentes pesquisas científicas no Brasil e no mundo, inclusive, comprovam que o habito de ler faz bem ao cérebro, sendo uma atividade essencial para o desenvolvimento humano.
Por outro lado, a popularização das tecnologias digitais transformou completamente os hábitos de consumo, de estudo e de lazer, atingindo a todos. As crianças, por sua vez, sentiram esse impacto de maneira singular, já que cada vez mais cedo estão sendo colocadas diante de telas. O excesso de exposição a esses aparelhos, ainda mais sem a supervisão de adultos responsáveis, pode ocasionar em diferentes problemas sensoriais e cognitivos nos pequenos. Mas ainda há tempo de remediar essa relação.
A atenção sobre o tempo de exposição às telas ganhou notoriedade nos últimos anos, principalmente no período da pandemia de Covid-19. Com a impossibilidade de acessar locais para além das paredes das próprias casas, as famílias precisaram ficar reclusas em seus lares, restringindo toda e qualquer comunicação com o mundo exterior por meio de ferramentas digitais. Ou seja, a tecnologia emergiu como as tábuas de salvação do tédio e da solidão para muitas das pessoas, fossem elas adultas ou crianças.
Acontece que mesmo antes do período pandêmico já não era incomum ver famílias reunidas em restaurantes, por exemplo, com os adultos conversando e interagindo entre si, enquanto as crianças ficavam agarradas ao ambiente virtual, com suas atenções vidradas nos sons e nas imagens impulsionados por tablets ou smartphones. Apesar disso, a implementação de tecnologias voltadas para o ensino já era vista com bons olhos por escolas e governos com intuito de desenvolver e promover inovação aos alunos.
"Mas o período pandêmico não fez um convite. Ele literalmente levou a educação infantil e de adolescentes ao uso contínuo das telas", afirma a psicóloga infantil Bruna Kesley. Agora com todas as interações escolares partindo da mediação de smartphones e computadores, uma “revolução comportamental” também entrou em curso, de acordo com a especialista.
"Todos tiveram que assimilar e aprender diferente com algumas faltas que o modo presencial exige, como a maior dinâmica, a tomada de decisão e até mesmo as frustrações"
De acordo com a pesquisa “Panorama Mobile Time/Opinion Box: Crianças e smartphones”, o percentual dos pequenos possuindo smartphone próprio chegou a 49% em 2021. Produzido pelas empresas Mobile Time e Opinion Box, o estudo inspirou a reportagem do O POVO+ “Crianças e smartphones, uma relação que deve ser mediada”, publicada em 2023. Na oportunidade, também foi mostrado que o acesso aos aparelhos aumenta conforme a idade. Prova disso é que do público entre 10 e 12 anos, 77% já possuía um smartphone.
Em meio a este cenário, os livros começaram a acumular poeira, ficando esquecidos nas estantes das casas e das livrarias. Em uma relação direta: enquanto estão mais focadas nas tecnologias digitais, as crianças passaram a ter menos acesso aos escritos e desenhados em meios físicos impressos. Essa é uma percepção de muitos dos adultos e que está embasada na pesquisa “Indicadores de desenvolvimento infantil integral nas capitais brasileiras”, realizado pelo Projeto Pipas 2022.
Apoiado e divulgado pelo Ministério da Saúde, o levantamento fez uma coleta de dados de 13.425 crianças de até 5 anos de 13 diferentes capitais brasileiras, incluindo o Distrito Federal. Além de trazer dados sobre desenvolvimento, saúde, alimentação e segurança, o material informa o percentual de crianças que não têm acesso a nenhum livro infantil ou de figuras em seus domicílios.
A média nacional é de 24% de crianças que não possuem livros em casa. Florianópolis é o estado onde os números são mais animadores: 8,8%. Na sequência vem São Paulo (18,4%) e Distrito Federal (22,3%). Na contramão dessas capitais, puxam a média para cima Porto Velho (38,3%), Belém (34,3%), João Pessoa (34%), Aracaju (32,8%) e Fortaleza (31,3%). Nesses locais é como se a cada dez crianças, três ou quatro delas não tivessem nenhum livro infantil para folhear em suas próprias residências.
Por outro lado, os aparelhos eletrônicos têm suprido essa ausência de maneira direta, conforme mostra ainda o Projeto Pipas 2022. Nas mesmas capitais em que os livros estão em falta, os meios digitais aparecem de sobra nas mãos crianças. A frequência de crianças de até cinco anos que assistem programas ou jogam na TV, no smartphone e no tablet por mais de duas horas diárias é 33,2%, nacionalmente.
Florianópolis surge com o menor índice entre as cidades analisadas (22,7%), acompanhada do Distrito Federal (28,6%) e de São Luís (29,7%). Enquanto isso, Rio de Janeiro e Aracaju ultrapassam os 40% de crianças com alto nível de exposição as telas cotidianamente. Em Fortaleza, 31,5% das crianças estão diante das telas por mais de duas horas por dia.
A substituição dos livros por aparelhos eletrônicos tem sido responsável por diversas questões que são motivo de preocupação para pesquisadores e instituições especialistas na saúde e no desenvolvimento das crianças. Tanto aspectos físicos quanto cognitivos são apontados como pontos cruciais prejudicados nos pequenos quando há um uso abusivo de dispositivos digitais.
Dados da pesquisa TIC Kids Online, realizada ainda em 2018 pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), revelam que grande parte das crianças brasileiras já tiveram contato com conteúdos sensíveis na web, como formas de machucar a si mesmo, fontes que informam sobre modos de cometer suicídio e experiências com o uso de drogas. Conteúdos discriminatórios e ofensivos, bem como imagens e vídeos sexuais, também estão entre os produtos que as crianças tiveram acesso em algum instante na web.
Professora de Enfermagem dos programas de graduação e pós-graduação da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fabiane do Amaral Gubert menciona a possibilidade do acesso às telas em demasia impactar diferentes comportamentos na vida das crianças. “O uso excessivo de telas, como smartphones, tablets, computadores e videogames, podem afetar o desenvolvimento cognitivo, socioemocional e até mesmo as habilidades motoras das crianças, especialmente aquelas na primeira infância (até cinco anos)”, afirma.
"O uso excessivo de telas pode prejudicar a atenção, a linguagem e a interação social, e pode causar distúrbios alimentares como a obesidade infantil, influenciando até a qualidade do sono"
Psiquiatra da infância e da adolescência do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM), em Fortaleza, Letícia Coelho Cavalcante explica que diferentes estudos sugerem associações diretas da exposição exacerbada às telas com o surgimento de sintomas relacionados à saúde mental, alterando o humor e prejudicando até mesmo atividades escolares e sociais. “Dentre os principais comprometimentos, observamos irritabilidade, ansiedade, depressão, déficit de atenção e hiperatividade, alterações do sono, mudanças alimentares, dependência digital, uso problemático das mídias interativas, sedentarismo, baixa autoestima, prejuízo escolar e bullying”, destaca.
Em seu manual de orientação chamado “#MenosTelas #MaisSaúde”, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) desaconselha o uso excessivo de aparelhos digitais pelas crianças, sobretudo nos anos iniciais. Segundo a entidade, os estímulos naturais, como as brincadeiras e os cuidados dos pais, não podem ser substituídos por ferramentas virtuais. “O olhar e a presença da família é vital e instintivo como fonte natural dos estímulos e cuidados do apego e que não podem ser substituídos por telas e tecnologias”, aponta.
Justamente por isso, a SBP indica limites de tempo para crianças estarem em contato com esses aparelhos. Por faixa etária, ela faz as seguintes recomendações de uso, sempre com supervisão:
A psicóloga Lisa Tavares observa, por outro lado, que mais do que a quantidade de horas à frente das telas, é necessário ponderar o que está sendo feito no ambiente online. Identificar se o uso está sendo saudável ou não vai além da simples determinação de uma “quantidade ideal” de horas com o celular ou tablet nas mãos, diz.
Segundo ela, é necessário que exista supervisão sobre aquilo que está sendo consumido e, em caso de reconhecimento de prejuízos aos pequenos, o auxílio profissional psicoterápico não deve ser negligenciado.
"Não existe uma técnica geral, mas é preciso identificar quanto tempo esse jovem fica nas telas e o que ele consome e produz nesse período. Depois disso, vamos buscar como lidar com a situação"
De todo modo, a atenção mais direcionada às crianças de até cinco acontece por ser este o período em que são alcançadas conquistas básicas do desenvolvimento neurológico, motor fino e grosso, linguagem e adaptação social, conforme aponta a pesquisadora Jéssica Lima Benevides. Em sua tese de doutorado em Enfermagem pela UFC, sob orientação de Fabiane Gubert, Jéssica escreve:
“As experiências mais precoces da criança são cruciais ao desenvolvimento, por isso a interação com o ambiente é um requisito fundamental, pois as experiências vividas nesse período têm um impacto decisivo na arquitetura cerebral e, por conseguinte, na natureza e extensão das suas capacidades adultas, incluindo o cuidado de si.”
Ainda em seu estudo, a pesquisadora menciona três abordagens parentais para lidar com o uso de dispositivos de mídia por crianças. Segundo ela, essas condutas refletem diferentes estratégias e atitudes dos pais em relação à supervisão e orientação do tempo de tela de seus filhos. São elas:
Na prática, estabelecer limites para as crianças não é uma tarefa simples. A sobrecarga de cuidar dos pequenos, administrar as tarefas domésticas e lidar com as demandas diárias se tornam um verdadeiro desafio, especialmente para as mães. Mesmo aquelas que têm o suporte de uma rede de apoio próxima e reconhecem os potenciais riscos associados às telas, às vezes enxergam os dispositivos digitais como uma pausa rápida e necessária na correria do dia a dia.
“Ao vivenciar a realidade, percebe-se que maternar contemplando todas as recomendações relacionadas à saúde da criança é bem mais complicado do que se imagina quando se está planejando a criação dos filhos antes de tê-los”, relata Jéssica Lima Benevides ao longo de sua tese de doutorado em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
"Ser mãe e pesquisadora é uma tarefa desafiadora, pois em muitos momentos necessitamos acompanhar a evolução da tecnologia para otimizar os trabalhos, além de utilizar como medida de lazer e distração. Assim, nossos filhos participam de todo esse processo, utilizando nossos comportamentos como referência para desenvolver suas habilidades e hábitos"
Psicóloga com pós-graduação em Recursos Humanos pela Fanshawe College (Canadá), Marina Brasil também partilha do sentimento de dificuldade para criar uma espécie de redoma que livre sua filha da exposição às telas. Mãe em tempo integral da pequena Ana Clara, de 8 meses, Marina afirma que até os cinco meses de sua filha “seguia à risca a proibição a qualquer tipo de telas”.
“Mas ela foi crescendo e não aceitando mais tão facilmente ficar no berço ou no tapetinho enquanto a mamãe precisa ir ao banheiro rapidinho ou quando acorda antes da soneca e ainda tenho alguma coisa no fogão. Antes eu a colocava no tapetinho com seus brinquedinhos e livrinhos e ela ficava lá, mas agora ela come (literalmente) os livros, sai engatinhando pela casa toda e tenta subir em qualquer coisa em que consiga se apoiar para ficar de pé”, narra.
“Nessas horas eu me vi ‘pagando pela língua’ e cedendo ao deixá-la entretida cinco minutinhos com o ‘Charlie e a Lola’ enquanto resolvo rapidamente uma urgência”, completa, evidenciando que essa ação é momentânea e que ocorre em momentos específicos do dia. “Pois para mim é um prazer vê-la se desenvolver brincando com seus potes, descolando fita adesiva do chão e fazendo as cadeiras de túneis, e acho que as telas roubam esse momento que passa tão rápido”.
Marina Brasil diz esperar da sociedade um olhar empático e compreensivo sobre as mães que também usam desse suporte passageiro com os filhos. “Muitas mães enfrentam desafios enormes, especialmente aquelas que não têm uma rede de apoio sólida. Para algumas delas, as telas se tornam uma ferramenta essencial para realizar tarefas domésticas ou simplesmente para ter um momento de descanso. Acredito que devemos buscar um equilíbrio, mas sem ignorar as realidades e os desafios enfrentados por cada família”, considera.
Pesquisadora da temática do uso de telas pelo público infantil, a professora da UFC Fabiane do Amaral Gubert declara que “é preciso entender os desafios da parentalidade no mundo moderno”. “Muito mais do que penalizar os pais”, ela diz que é importante compreender que as pessoas estão envoltas em uma dinâmica social cujas demandas exigem soluções da parte dos educadores, profissionais de saúde e da sociedade em geral,
Nos programas de graduação e pós-graduação em Enfermagem da UFC, diferentes estudos estão sendo desenvolvidos em teses, dissertações e monografias buscando compreender os comportamentos e hábitos relacionados ao uso de telas por crianças de até 5 anos e seus cuidadores desde a pandemia de Covid-19.
“Os resultados dos primeiros estudos evidenciaram que a família cearense tem em sua predominância estilos de visualização de telas do tipo restritivo, mas que eventualmente compartilham e discutem os conteúdos dos temas com seus filhos. Esse resultado é animador e reflete o posicionamento das famílias que começam a entender que o uso precoce e demasiado de telas pode ser nocivo, mas que é possível visualizar as telas de forma positiva também”, declara.
Segundo Fabiane é preciso considerar as preocupações com as telas como questão de importância pública. “As influências na saúde física, mental e social das crianças são impactantes e ainda não se sabe exatamente as repercussões a longo prazo. Cabe destacar que o impacto das redes sociais na saúde mental, o vício em jogos eletrônicos e a disseminação de informações falsas são pontos que influenciam negativamente a saúde de crianças e adolescentes. Estas preocupações reais evidenciam que o uso de telas deve ser reconhecido como questão de importância pública”, aponta.
Deste modo, é preciso “compreender este fenômeno de forma aberta e dialógica, buscando o equilíbrio entre os benefícios que a tecnologia pode oferecer e os riscos que ela apresenta.”
O uso das ferramentas digitais não deve regredir entre as crianças, porém especialistas concordam que é crucial orientá-las para desenvolverem habilidades de compreensão e adaptação ao ambiente virtual. Paralelamente, os tradicionais livros mantêm-se como importantes instrumentos de inclusão social, proporcionando compreensão tanto do mundo das palavras quanto do mundo real. A combinação entre tecnologia e estímulo à leitura aparece, portanto, como suporte indispensável nesse contexto.
“Hoje se lê o que realmente interessa: pequenos fragmentos de um texto, algumas manchetes de jornais, receita culinária etc.; é a designada leitura seletiva”, constatam as pesquisadoras Marinéa Figueira Rodrigues e Sheila Alves Diniz Ferreira no artigo “A importância da leitura nas séries iniciais do Ensino Fundamental I”. Segundo elas, então, é preciso uma participação efetiva das escolas para preparar seus alunos, sobretudo nos anos escolares iniciais, para que desenvolvam o “gosto pelo ato de ler”.
“As competências desenvolvidas nesta etapa são importantes para que futuramente o leitor atinja níveis mais profundos num constante processo de
Leia artigo completo: “A importância da leitura nas séries iniciais do Ensino Fundamental I”
De acordo com a professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) Fabiane do Amaral Gubert, é possível utilizar as tecnologias como aliadas da educação e no desenvolvimento infantil de maneira equilibrada. “Na infância, a mídia deve atuar como mediadora de possíveis aprendizagens e não recursos a serem utilizados passivamente. Existem muitos aplicativos educacionais, programas de TV e jogos projetados para promover o aprendizado e o desenvolvimento das crianças”, informa.
Já para a professora de Pedagogia da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Juliana Santana, a tecnologia só vai ser uma “vilã” quando entregue nas mãos de uma criança sem qualquer supervisão de um adulto responsável. “O ambiente digital faz parte da nossa realidade e é importante que as crianças conheçam”, comenta.
Também mestre e doutora em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC), ela pondera a necessidade de não fazer uma relação comum em que coloca o livro e a tecnologia em lugares contraditórios, de oposição, com um negando o outro e como se o livro representasse o tradicional, enquanto que as telas simbolizassem o moderno.
“O livro em papel é um instrumento muito importante para fazer a educação nos dias atuais. No entanto é importante a gente saber também que as tecnologias são uma realidade. Então se desconsideramos completamente a tecnologia dentro da escola vai haver esse rompimento na perspectiva do letramento, que é a leitura e a escrita em acordo com as práticas sociais”, observa Juliana.
Ela considera a existência de um aspecto pedagógico muito importante a ser considerado ao usar as tecnologias no ensino, que é a mediação de um adulto para guiar ao ensino. Segundo Jéssica, ao entregar um livro físico para uma criança, é preciso indicar para ela onde está a capa, contar as histórias a partir das imagens ali gravadas, mostrar as texturas, ensinar a folhear e apresentar todas as características do livro. “Isso faz parte do letramento”.
“Só usar a tecnologia como uma substituição do papel possivelmente não vai trazer ganhos significativos”, menciona, pois no formato digital a criança vai simplesmente se restringir a arrastar os dedos sobre as telas em um consumo passivo daquele conteúdo. “Se não houver uma mediação, independentemente se for no papel ou na tela, essa atividade vai deixar a criança passiva no processo de leitura”, pontua.
Juliana ainda complementa: “Da mesma forma a gente vê no processo de escrita x digitação. Se a gente solicita que a criança só copie no papel do jeito que está no livro, a atividade de copiar por si só não vai proporcionar um desenvolvimento da escrita. A criança vai aprender a replicar, a repetir. Agora se a gente usa o papel ou o teclado para pedir que a criança faça escritas espontâneas, de acordo com o que ela pensa, tanto um quanto o outro vai fazer com que haja reflexão, e essa é a proposta da alfabetização”.
No Ceará, com a proposta de aliar o universo digital ao aprendizado das crianças está o projeto “Luz do Saber”. Com objetivo de colaborar nos processos de oralidade, leitura e escrita, ele faz parte do Programa Cientista Chefe em Educação Básica do Estado, disponibilizando um portal educacional gratuito com atividades online, jogos e aplicações voltadas para o desenvolvimento da escrita.
Conforme divulga a Secretaria da Educação (Seduc), o software auxilia tanto no aprendizado como também pode ser usado entre estudantes com habilidades de leitura e escrita ainda não consolidadas. Justamente por isso, o Luz do Saber será tema de formações realizadas nos 184 municípios cearenses ao longo de 2024, com foco na dinamização para a sala de aula que envolva o desenvolvimento da alfabetização.
“Com isso, compreende-se que o uso da tecnologia relacionada às aprendizagens é mais um elemento que vem contribuir para a garantia das aprendizagens, pensando sempre na equidade de oportunidade, fortalecendo ainda mais as estratégias para a garantia da aprendizagem na idade certa”, comunica a Seduc.
Disponível para o público, o projeto pode ser acessado clicando aqui.
A representatividade pode desempenhar um papel crucial no envolvimento das crianças negras com a leitura. Ao expor essas crianças a personagens, histórias e autores que refletem suas próprias experiências e identidades, a denominada literatura negra pode proporcionar ganhos significativos. Essa abordagem pode aumentar o engajamento e o interesse das crianças em explorar diferentes obras.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é o documento normativo para as redes de ensino e instituições públicas e privadas, destaca a importância do desenvolvimento da autonomia de crianças e adolescentes. Segundo a BNCC, é fundamental oferecer a esses indivíduos condições de acesso a uma variedade de informações que estimulem o pensamento crítico e promovam valores morais e éticos.
Além disso, a BNCC enfatiza a importância da cultura digital, que envolve diferentes linguagens e formas de letramento. A diversidade cultural também é considerada imprescindível, para que “os alunos identifiquem a presença e a sociodiversidade de culturas indígenas, afro-brasileiras, quilombolas, ciganas e dos demais povos e comunidades tradicionais, compreendendo suas características socioculturais e territorialidades”.
“A relevância da história desses grupos humanos reside na possibilidade de os estudantes compreenderem o papel das alteridades presentes na sociedade brasileira, comprometerem-se com elas e, ainda, perceberem que existem outros referenciais de produção, circulação e transmissão de conhecimentos, que podem se entrecruzar com aqueles considerados consagrados nos espaços formais de produção de saber”, diz o documento.
Coordenadora do "Coletivo Mapinduzi", grupo de leitura e estudos de intelectuais negras, Juliana Santana classifica como fundamental que crianças negras tenham contato com obras de autores negros e personagens negros na literatura. Segundo ela, a representatividade, o empoderamento, a desconstrução de estereótipos e a conexão com a cultura e história são fatores fundamentais para o desenvolvimento das crianças.
Também professora adjunta de Pedagogia na Universidade Estadual do Ceará (Uece), ela explica que, ao se verem refletidos nas histórias que leem, as crianças negras podem se identificar com os personagens, o que fortalece sua autoestima e senso de pertencimento. Além do mais, quando o contato com personagens negros em posições de destaque e protagonismo poderia inspirar as crianças a acreditarem em seu potencial e a se sentirem capazes de alcançar seus objetivos.
"A criança consegue ver toda a nossa família nesses livros e isso faz com que ela tenha muito mais interesse nas histórias"
Juliana Santana faz ainda a indicação de seis obras que exploram a literatura negra para o público infantil. De princesas guerreiras à dança como ferramenta de transformação social, os livros abaixo celebram a diversidade, a força feminina e a importância da representatividade. Confira: