Como é a sua relação com seu animalzinho de estimação? Seu amor por ele é incondicional? Ele é seu melhor amigo? A companhia dele é indescritível? Ou você é daqueles que ainda não vive esse relacionamento? Seja qual for a resposta, o fato é que esses bichinhos são como remédio na vida de quem convive com eles.
Os brasileiros sabem disso pois ocupam a terceira posição mundial em relação à população de animais de estimação. São 160 milhões, entre cães, gatos, aves, répteis, peixes e pequenos mamíferos, segundo dados de 2023 da Abinpet e do Instituto Pet Brasil. Eles já fazem parte das nossas famílias.
Acredita-se que essa relação, entre animais e humanos, data de cerca de 12 mil anos atrás, no período Neolítico — quando o homem aprendeu a cultivar a terra e criar animais como reserva alimentar. Eles se tornaram parte integrante da nossa sobrevivência, da nossa história e da nossa própria identidade.
De lá para cá, os animais domesticados, em comparação aos animais selvagens, sofreram inúmeras mudanças no comportamento, na fisiologia e na morfologia. Isso explicaria por que os cães domésticos (Canis lupus familiaris) de hoje são muito diferentes de seu ancestral, o lobo-cinzento (Canis lupus).
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Além de ter influenciado em nossos hábitos e em nossas formas de convivência, essa domesticação teve um imenso impacto em nossa saúde. Conforme um estudo da Edelman Intelligence, em parceria com a HABRI e a Mars Petcare, 80% das pessoas se sentem menos sozinhas na companhia de um pet.
Para além de combater a depressão, solidão e ansiedade, eles podem auxiliar na prevenção contra ataques do coração e outras doenças cardiovasculares.
Estudos, como do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e do Instituto Nacional de Saúde (NIH), nos Estados Unidos, mostram que esses pequenos ajudam a reduzir a pressão sanguínea, o colesterol e o nível de triglicérides.
Quais espécies são domésticas?
Outro fato interessante de se observar é que pessoas acima dos 65 anos tutores de animais de estimação realizam 30% menos visitas ao médico. Um dos principais fatores por trás desses resultados está associado à necessidade humana do toque, e a produção de hormônios como a ocitocina e serotonina, responsáveis pelo humor.
A psicóloga clínica Raísa Duquia, que realizou a pesquisa Convivência com animais de estimação: um estudo fenomenológico como trabalho de conclusão de curso (TCC), afirma que a convivência com os animais ajuda na manutenção das faculdades mentais à medida que envelhecemos.
“O convívio e momentos de troca e interação com um pet pode gerar a liberação de vários hormônios no nosso corpo, como a serotonina (relacionado ao bem-estar), dopamina (ligado ao sistema de recompensa) e a ocitocina (também conhecida como o hormônio do amor, do vínculo)”, explica.
Para ela, essas substâncias estão envolvidas no processo de regulação do estresse e das emoções, contribuindo nos níveis de ansiedade e estresse.
“Não é a interação unicamente que promove isso, mas a qualidade dessa troca, a presença e o autoconhecimento do tutor para reconhecer o que acontece com ele e quais são as próprias necessidades. Somos seres sociais, precisamos de interação para manter estados saudáveis de consciência”, pontua.
A psicologa lembra que se a relação for prejudicial, como humanizar o animal, desenvolver um apego ansioso e utilizar o animal para não interagir com outras pessoas, os efeitos podem ser opostos.
“Atualmente têm se utilizado muito a Terapia Assistida por Animais (TAA) em pessoas com deficiências, como autismo. A companhia deles para tratamentos de fobias, ansiedade e transtornos do humor também é uma aliada, além das pessoas com convulsões severas, onde o animal se apoia ou se segura nela para que não se machuque durante a crise”, revela.
Embora a pesquisa tenha sido desenvolvida há dez anos, segunda ela, ainda reverbera. “Percebi que essa relação tem uma grande importância para os tutores, havendo uma necessidade de mais pesquisas para compreender esse fenômeno”, conclui.
Os benefícios à saúde associados à convivência com animais foram confirmados na vida da psicóloga Mariângela Sampaio, fundadora da clínica Religare, em Fortaleza. O espaço se destaca pela abordagem da inserção de animais durante o tratamento do paciente, seja o dele próprio, como o da mascote da instituição, uma gatinha chamada Marieta.
“Esses pequenos diminuem a sensação de solidão, levando o seu tutor a criar novas relações, melhorando em sua comunicação. Essas pessoas têm mais facilidade de tratar suas doenças e os efeitos negativos da sociedade moderna. É como um sentimento de pertencimento”, afirma Mariângela.
A psicóloga de 57 anos é natural de Teresina, Piauí. Ela explica que a convivência com os animais tem um impacto positivo tanto na saúde física, como mental e emocional, além de fazer com que você se movimente mais. Desde pequena ela teve esse contato, proporcionado na fazenda de seu pai.
Já em Fortaleza, desde 1995, ela seguiu o caminho da psicologia, e em 2019 seu sonho foi realizado: a clínica Religare. “Sempre quis que o nosso diferencial fosse a presença de animais na terapia, que as pessoas pudessem estar com seu pet, pois muitas delas precisam desse suporte emocional”, diz.
Mariângela conta que decidiu adotar um animal para ser a mascote da clínica, a gata Marieta, que se tornou um grande sucesso. Além de trazer alegria para os psicólogos que atuam na clínica, ela conforta o coração de todos que vão ao espaço. Mariângela acredita que muitos pacientes procuram a clínica pelo tipo de abordagem aplicada.
“Sou tutora de animais e trouxe isso para o meu campo de atuação profissional. As pessoas chegam aqui e se sentem acolhidas. Tenho uma paciente que quando chega aqui já pergunta se a Marieta vai fazer parte da sessão. A maioria deles pede por isso, eles sentem mais confiança e bem-estar”, relata.
A especialista ressalta ainda que Marieta tem sua própria individualidade, escolhendo os lugares nos quais quer estar. “Ela vai até a porta da sala que está acontecendo a sessão e bate na porta. O psicólogo escuta o miado e deixa ela participar daquele momento, que ela própria escolheu”, comenta.
Segundo Mariângela, os animais podem ser usados no tratamento de traumas ou estresse pós-traumático, além de serem bons companheiros em hospitais onde pessoas sofrem de doenças crônicas, como câncer, ou onde pessoas idosas vivem e se sentem abandonadas pela família.
“A presença de um animal ajuda a neutralizar o condicionamento do medo causado pelos traumas. Eles aumentam a ocitocina, um neurotransmissor que ajuda a reduzir o cortisol, o hormônio do estresse, fazendo o ser humano ser receptivo ao amor. Ainda ajudam crianças a superar seus pesadelos”, explica.
Quais os benefícios de se ter um pet?
Hoje, a clínica Religare promove um trabalho de conscientização da importância da castração, principalmente de gato e cachorro, porque além de influenciar positivamente na saúde do animal, evitando várias doenças, ajuda a diminuir o número de bichinhos que vivem abandonados nas ruas.
“A conscientização sobre o respeito aos animais deve começar na infância. Uma criança que tem isso aprende desde cedo o sentimento de altruísmo, empatia e responsabilidade. Eles não são brinquedos, eles sentem dor, medo, fome e frio. Precisam de cuidados, são puro amor, a gente é mais feliz com eles”, conclui.
Natural de Crato, interior do Ceará, Eliane Cariri deixou sua cidade natal ainda pequena, com 10 anos. Hoje residente de Caucaia, ela atua como médica veterinária. O motivo por trás da escolha da profissão vem desde a infância.
Eliane, de 48 anos, cresceu com a presença de animais que, ao invés de sair de casas de adoções, eram acolhidos da rua por sua mãe, que tinha o hábito de pegar para alimentar e cuidar das enfermidades. Com isso, muitos acabaram ficando definitivamente em sua casa.
A veterinária é tutora de nove animais, sete gatos e duas cachorrinhas, todos resgatados das ruas e sem raça definida. Ela considera sua relação com cada um única e baseada em afeto, cuidado e companheirismo. Para Eliane, a decisão de ter um animal de estimação é individual.
“As razões podem ser diversas, como a procura de companhia, lealdade, e bem-estar emocional. Eles reduzem o nosso estresse diário, aumentam a autoestima, melhoram nosso humor e podem ser utilizados como terapia assistida, auxiliando no tratamento de diversas condições mentais”, pontua.
Apesar de todos esses benefícios, a especialista alerta que cuidar de um animal exige muita responsabilidade, tempo, dedicação e recursos financeiros. Além do comprometimento, tempo e um bom espaço para acolher eles.
“É importante ter em mente a responsabilidade antes de tomar qualquer decisão, pesquisar sobre as diferentes raças e espécies, conversar com outros tutores e visitar abrigos. Pensem com carinho em adotar ao invés de comprar, há muitos animais esperando um lar”, finaliza.
Essa mensagem foi atravessada e compreendida na vida de Agnes Maria, estudante universitária de 18 anos. Natural de Fortaleza, a jovem e sua família criam seis gatinhos e duas calopsitas, além de já ter participado voluntariamente em uma ONG que ajudava cachorros em situação de rua.
Sabe o mais curioso? Antigamente, Agnes não tinha interesse em criar nenhum animal, mesmo sua família já tendo criando uma cachorrinha, que partiu em 2016 aos 15 anos. Depois desse ocorrido, e pela fata de espaço, Agnes não alimentava esse ideia para o seu futuro.
A história muda em 2019, quando em um determinado dia ela foi surpreendida ao chegar em casa e se depara com um gatinho, miando assustado e com uma úlcera no olho. O bichinho havia sido resgatado pela mãe de Agnes perto da escola em que ela lecionava.
“Infelizmente, a gente não conseguiu salvar o olhinho dele, mas ele ficou saudável. A gente fez a cirurgia de remoção do olho e o castrou. Os planos não eram ficar com ele, mas ele acabou conquistando nossos corações. Batizamos ele de Morgan”, relembra.
Depois de Morgan, foi questão de tempo para os outros começarem a chegar na vida de Agnes. Em uma nova moradia, uma gatinha grávida que foi atropelada, ficando com problemas nos olhos e na mandíbula, apareceu em sua porta. Ela, mais seus dois filhotes, foi acolhida pela jovem e sua família.
Mais tarde, mais uma mãe felina e seu filhote foram abraçados por eles. As duas calopsitas foram as últimas a completarem a família. “Por fora, meu pai cuida de 10 gatos deixados pelo meu tio, que faleceu em 2023. Infelizmente, todos eles estão esperando para serem adotados”, revela.
A estudante recorda que na época da pandemia Morgan, o gato mais velho, foi essencial para manter a alegria na família. “A gente só tinha ele, estávamos abalados naquele período, minha mãe sempre fala que não sabia o que seríamos sem ele. Todos são nosso porto seguro, melhoram a energia da casa” comenta.
Atualmente, Agnes Maria se sente muito feliz com seus pets, e deixa um conselho para as pessoas que, assim como ela no passado, não queiram adotar um animal de estimação.
“Existem vários deles precisando de lar, eles nos ajudam muito, nos tornam mais felizes. Mesmo tendo uma rotina agitada, eu consigo brechas para dar atenção a eles, e isso melhorou muito a minha qualidade de vida”, finaliza.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 200 milhões de animais estão situação de rua no mundo inteiro, sendo 30 milhões só no Brasil. Além da violência que esses pequenos sofrem, eles desenvolvem diversas doenças, que podem afetar a nossa saúde através da proliferação.
Conhecida como zoonoses, essa transmissão só comprova o quanto a nossa saúde e a dos animais estão interligadas. A OMS mostrou que elas são responsáveis por cerca de 2,4 bilhões de casos de doenças e 2,2 milhões de mortes anualmente.
Os dados do documento Prevenir a Próxima Pandemia: Doenças Zoonóticas e Como Quebrar a Cadeia de Transmissão revelam que existem mais de 200 tipos de zoonoses, e que 60% das doenças infecciosas humanas têm sua origem em animais, representando um grande desafio para a saúde pública.
Para o secretário da Proteção Animal da Prefeitura de Fortaleza, Lucas Soares, conhecido como Apollo Vicz, existe um marketing muito bem elaborado na causa animal, que esconde a real situação da proteção deles e os desafios resultantes das falhas na legislação e nas políticas públicas, que não os amparam.
“Hoje, o sistema se preocupa apenas com animais tutorados, enquanto os animais em situação de rua, e aqueles resgatados por ONGs, são totalmente esquecidos. Essa situação revela a falta de compromisso não só com os animais, mas também com a sociedade, pois isso é uma questão de saúde única”, pontua.
Apollo, que aos 13 anos viveu em situação de rua e foi acolhido pela sua mãe adotiva, Rosane Dantas, fundadora do Abrigo São Lázaro, cresceu em convívio com animais resgatados. Essa experiência, e seu amor imensurável pelos bichinhos, foi determinante para uma vida de luta por essa causa.
“Os animais salvam vidas. Eles são seres sencientes, sentem nossa energia e emoções, compreendem nosso estado, e isso gera uma conexão muito forte resultando em cura” reflete. Ele ainda alerta que muito animais resgatados por protetores, que vivem em abrigos, enfrentam uma realidade diferente.
“Muitos são vítimas de maus-tratos e estão traumatizados, muitas vezes, devido ao ambiente hostil da rua. Eles apresentam condições de saúde física e mental degradadas, e o contato direto e diário com eles pode impactar negativamente a saúde psicológica dos protetores. São muitas camadas”, comenta.
O secretário aconselha apoiar abrigos e protetores que dedicam suas vidas a mudar uma realidade que há muito tempo aguarda por reparação histórica. Para ele, é importante denunciar casos de maus tratos aos animais, e isso pode ser feito de forma anônima.
“Pesquise a vida daqueles que levantam a bandeira da proteção animal em épocas de eleição. Busque se informar se aquele candidato tem raízes na proteção e se já prestou serviços relevantes. Seu cuidado na hora de escolher pode impactar diretamente a vida dos animais”, finaliza.
Maus-tratos aos animais são crime e punidos com prisão, conforme a Lei Federal n° 9.605/98, art. 32.
Para realizar a denúncia, é importante reunir o máximo de provas possíveis, registrar o Boletim de Ocorrência (B.O), que pode ser feito online, e formalizar a denúncia na Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA).
Denuncie
Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente: 3101-7596
Polícia Militar: 190
Batalhão de Polícia de Meio Ambiente: (85) 3101-3545, 3101-3577