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Racismo no século XXI
Reportagem Seriada

Racismo no século XXI

Falar sobre racismo é olhar para a formação da nossa sociedade. Pensá-lo no século XXI implica em compreender que as estruturas se mantém e se renovam, bem como as possibilidades de ação antirracista
Episódio 3

Racismo no século XXI

Falar sobre racismo é olhar para a formação da nossa sociedade. Pensá-lo no século XXI implica em compreender que as estruturas se mantém e se renovam, bem como as possibilidades de ação antirracista
Episódio 3
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Entre 2018 e 2021, os casos de racismo no Brasil quadruplicaram: de 1.429 para 6.003. No mesmo período, as denúncias no Ceará também se tornaram quatro vezes maiores, indo de 25 para 111. “Através da mídia, das redes sociais, a gente percebe experiências racistas mais presentes e constantes. É preciso fazer uma análise da conjuntura”, afirma Martír Silva, coordenadora especial de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial.

Mulher grita slogans durante uma manifestação contra o racismo no Dia da Consciência Negra no Rio de Janeiro(Foto: CARL DE SOUZA / AFP)
Foto: CARL DE SOUZA / AFP Mulher grita slogans durante uma manifestação contra o racismo no Dia da Consciência Negra no Rio de Janeiro

Ao mesmo tempo que mais pessoas entendem a lei e compreendem ser vítimas do crime, há um aumento dos discursos de ódio em meio ao que Martír aponta ser “uma conjuntura negacionista”. Ela enfatiza a importância do olhar histórico: o escravismo como estratégia de exploração econômica e a abolição como forma de exclusão social formaram as raízes do racismo brasileiro.

Segundo Izabel Accioly, antropóloga e ativista antirracista, o racismo é um ponto central para decifrar e analisar a sociedade. “Não se trata de algo que acontece pontualmente, mas de um processo histórico, social e político amplo”, afirma. “Apesar de o tempo histórico ter se transformado, quando a gente olha para os indicadores sociais são sempre as pessoas negras que estão embaixo.”

Para ela, a superação do racismo precisa partir de dois caminhos concomitantes: um que vai do individual para o social e outro que vai do social para o individual. “A gente precisa conscientizar as pessoas e também adotar medidas estruturais de compensação e de justiça racial, como a política de cotas”, defende.

 

 

Um problema de brancos e negros

“Não temos um problema negro no Brasil, temos um problema nas relações entre negros e brancos. É a supremacia branca incrustada na branquitude, uma relação de dominação de um grupo sobre outro, como tantas que observamos cotidianamente ao nosso redor, na política, na cultura, na economia e que assegura privilégios para um dos grupos e relega péssimas condições de trabalho, de vida, ou até a morte, para o outro.”

Cida Bento, no livro O pacto da branquitude

 

 

Racismo e injúria racial

 

O crime de racismo, previsto na Lei nº 7.716/1989, implica em conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade. A lei enquadra uma série de situações, como recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negar a matrícula em instituições de ensino e impedir a ascensão funcional do empregado.

De acordo com o Código Penal, injúria racial é a ofensa à dignidade ou ao decoro em que se utiliza palavra depreciativa referente a raça e cor com a intenção de ofender a honra da vítima.

 

 

Indígenas

O número de casos de violência contra indígenas, em 2021, foi o maior dos últimos nove anos. Foram registrados 355 casos no último ano. Destes, 21 foram por racismo e discriminação étnico cultural.

Fonte: Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

 

 

 

Indicadores da desigualdade racial no Brasil

 

 

Racismo estrutural

MP denuncia gerente da Caixa por racismo contra cliente em agência(Foto: Reprodução)
Foto: Reprodução MP denuncia gerente da Caixa por racismo contra cliente em agência

“O racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo ‘normal’ com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O racismo é estrutural”, aponta o professor e advogado Silvio Almeida.

Ele enfatiza que essa compreensão não retira a responsabilidade individual e não é um álibi para racistas. “Por mais que calar-se diante do racismo não faça do indivíduo moral e/ou juridicamente culpado ou responsável, certamente o silêncio o torna ética e politicamente responsável pela manutenção do racismo”, defende. “A mudança da sociedade não se faz apenas com denúncias ou com o repúdio moral do racismo: depende, antes de tudo, da tomada de posturas e da adoção de práticas antirracistas.”

Fonte: livro Racismo estrutural, de Silvio Almeida. Editora Pólen, 2019

 

 

Ações afirmativas

A adoção de cotas raciais por universidades brasileiras é exemplo de ação afirmativa implantada no Brasil. Adotada há uma década, a Lei de Cotas (Lei 12.711/12) se mostra como um dos principais avanços contra o racismo: permitiu que o número de estudantes vindos de escolas públicas aumentasse 47% nas universidades federais. O número de estudantes negros de escolas públicas aumentou 73%.

Fonte: Estudo “Affirmative Action in Centralized College Admission Systems: Evidence from Brazil”, da Universidade de Stanford

 

 

Racismo algorítmico

 

O século XXI é marcado pela presença da internet e das redes sociais no cotidiano. Se novas formas de sociabilidade e conexão surgiram, também são originadas novas maneiras de expressão do racismo. Entre elas, o chamado racismo algorítmico.

O filme de Lizzie Borden aposta na ficção científica para tratar de temas como feminismo e racismo(Foto: divulgação)
Foto: divulgação O filme de Lizzie Borden aposta na ficção científica para tratar de temas como feminismo e racismo

Tarcízio Silva, pesquisador em comunicação, mantém a Linha do Tempo do Racismo Algorítmico – uma compilação de casos no Brasil e no mundo de formas de opressão racial no contexto digital. Os exemplos vão desde uma câmera fotográfica que em 2010 não reconhecia rostos asiáticos até plataformas excluindo estudantes negros e latinos de boas escolas em Nova Yorke ou ocultando vagas de emprego para candidatos negros. Outros casos, mostram sites que classificaram automaticamente fotos de pessoas negras como sendo de primatas ou estando associadas à criminalidade.

Especialistas argumentam que tecnologias discriminatórias geralmente não são feitas de forma consciente. A falta de diversidade e o enviesamento de quem faz as tecnologias estão entre os motivos. “Quando algoritmos recebem o poder de decidir — a partir dos critérios de seus criadores — o que é risco, o que é belo, o que é tóxico ou o que é mérito, os potenciais discriminatórios se multiplicam”, argumenta Silva.

 

 

Livros, filmes e podcasts sobre racismo

 


 

 

Que tal fazer um quiz

Agora que chegamos até aqui, que tal testar seus conhecimentos sobre o Holocausto e os temas discutidos nesta inforreportagem?


 

Aposta do Enem

O tema desta inforreportagem foi escolhido por professores que compõem a banca do concurso "Redação Enem: Chego Junto, Chego a 1.000", uma realização da Fundação Demócrito Rocha (FDR). A partir deste tema, estudantes da 3ª série do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da rede de escolas públicas do estado do Ceará são convidados a escrever uma redação nos moldes do exame. Este é o terceiro de cinco temas; os próximos são:

- A guerra na Ucrânia e a necessidade de se estabelecer a paz mundial.
- O humor no Brasil e a questão dos limites.

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