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Os estímulos proporcionados por brincadeiras e, mais especificamente, jogos de mesa contribuem com a formação humana de maneiras imperceptíveis à primeira vista, mas com benefícios reais e necessários. Isso vale desde a primeiríssima infância, no período dos primeiros dois anos, até as fases finais do desenvolvimento infantil, além de promover a saúde e o bem-estar cognitivo e emocional nas demais fases da vida.
Em reportagem premiada publicada pelo O POVO em 2019, a repórter Ana Rute Ramires mostrou as várias áreas da saúde afetadas pelo uso de telas por crianças de até 2 anos. No material, ela explica como a exposição de bebês às telas pode causar atrasos na sociabilização e prejudica o desenvolvimento da criança.
Diante da exposição precoce às tecnologias presentes na rotina moderna, o brincar analógico é uma forma de mitigar as ameaças
No último episódio da série de reportagens sobre jogos de mesa, O POVO+ traz a perspectiva de como os brinquedos e jogos analógicos se apresentam cada vez mais como ferramentas imprescindíveis para o bom desenvolvimento infantil.
Em tal contexto, especialistas da área da saúde, como neurologistas, psicólogos e fonoaudiólogos contam ao O POVO+ como eles adotaram jogos analógicos como uma ferramenta do cuidar e como forma de acessar com mais facilidade o universo da criança.
A irmã Conceição, freira presidente do Lar Amigos de Jesus, casa de acolhimento para crianças em tratamento médico mencionado no primeiro episódio desta série de reportagens, está sempre buscando formas para afastar as crianças sob sua tutela das telas. Responsável por dezenas de crianças e suas famílias, a religiosa está a frente do abrigo desde 1987.
Ainda que haja presença constante de voluntários realizando ações com as crianças, a ociosidade é um grande problema enfrentado durante a permanência dos pequenos em tratamento. O mais comum, segundo a freira, é que as crianças passem a maior parte do dia restritas aos leitos e usem o celular como entretenimento.
"A maior vantagem de tudo isso é tirar o celular, que é muito importante para coisas determinadas, mas pra essas crianças não"
Ela explica que atualmente o lar tem parcerias com 15 projetos sociais, que realizam diferentes atividades com as crianças e suas famílias. Um deles é o projeto Brinquedo Terapêutico, da Universidade Federal do Ceará, que promove regularmente sessões de brinquedoterapia com os pequenos internados.
"A maior vantagem de tudo isso é tirar o celular, que é muito importante para coisas determinadas, mas pra essas crianças não. Porque eles estão em tratamento, ele [o celular] prende muito, ele não socializa. Uma das vantagens do Brinquedo Terapêutico é a socialização. Você vê que eles estão todos um conversando com o outro, vendo o que que pode fazer", comenta a religiosa.
ASSISTA NO YOUTUBE | Irmã Conceição já foi entrevistada na 20ª edição do projeto Grandes Nomes, do jornal O POVO e rádio O POVO CBN
Cláudia Jardim,
Ela explica que, se o brincar é uma forma de se comunicar, é necessário usá-lo para permitir que essas crianças se expressem. Diz, ainda, que quem conduz as sessões de brincadeiras deve estar atento as possibilidades dentro da realidade daquelas crianças, mas que seus limites não devem ser subestimados.
"Tem que ter essa riqueza de poder criar e propor, para ver até onde essas crianças podem aquilo que muitas vezes a gente pode estar pensando que é impossível. Porque o brincar tem essa capacidade, de trazer o possível no que parecia ser impossível".
A especialista é autora do livro "Brincar: Um campo de subjetivação na infância" e se dedica a estudar a importância dessas interações. Em sua pesquisa, não faz uma distinção entre brincadeiras físicas, como pega-pega pular corda e jogos analógicos, já que eles seriam complementares.
"O objetivo do estudo foi escutar as crianças e brincar com as crianças para vê-las produzindo o que aparecia desse mal-estar da vida deles naquele momento"
A professora comenta que o brincar físico, especialmente na primeira e segunda infâncias, é basilar: "Dentro do campo da infância a gente vai priorizar o brincar com o corpo, com o movimento, com ação. Assim você se joga na cena e se apropria, incorpora, aquilo que você tá experimentando tem um outro sabor, né? Eu diria até que é um certo alicerce para os outros 'brincar'. Porque se a gente partir do princípio que o corpo é o primeiro alfabeto, a criança deveria aprender a lê-lo experimentando".
Contudo, ela continua a explicar que os jogos são igualmente importantes por trabalhar o aspecto cognitivo da criança.
"O jogo de tabuleiro tem seu valor, mas que não diminua o tempo desse outro brincar, porque senão vai tudo para o racional e a gente vai viver aquilo do século XVII, a dicotomia (entre) mente e corpo", conclui a psicomotricista. Ela frisa a importância de uma abordagem multidisciplinar e dinâmica do brincar com crianças como forma de auxiliar o desenvolvimento e assegurar o bem-estar físico e mental, seja dentro de um contexto de internamento ou não.
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Scrabble (mais conhecido no Brasil com o nome de Palavras cruzadas) é um jogo de tabuleiro em que dois a quatro jogadores procuram marcar pontos formando palavras interligadas, usando pedras com letras num quadro dividido em 225 casas
Os jogadores competem em duas equipes, cada uma tentando interpretar corretamente as mensagens codificadas que lhes são apresentadas por seus companheiros enquanto gravam os códigos que interceptam a equipe adversária
Jogo de cartas rápido de palavras com quatro letras. Corra contra os adversários para trocar a palavra formada e livre-se de suas cartas! A palavra"JOGO" pode virar "LOGO"e "LOGO" pode virar "LODO" — nunca se sabe o que vai acontecer
Um estudo de 2020 publicado na Revista de Pediatria da Associação Americana de Medicina (Jama Pediatrics) analisou o comportamento de 2.152 crianças desde o nascimento até os 2 anos de idade. O acompanhamento durou de 1º outubro de 2010 à 31 de outubro de 2012.
O objetivo da pesquisa foi analisar os impactos da exposição às telas na primeiríssima infância e se os estímulos com brincadeiras e leituras dos pais para os filhos teria algum impacto sobre esses efeitos, ou seja, se seriam uma medida protetiva aos danos.
O resultado, publicado quase 8 anos depois do fim do experimento diante do volume de dados coletados, surpreende: os bebês expostos a telas e com pouco tempo de brincadeiras mostraram mais sintomas associados a neurodivergência do que os bebês que foram estimulados por jogos, brincadeiras analógicas e leitura.
Para chegar a esse resultado, os pesquisadores utilizaram a Lista de Verificação Modificada para Autismo em Crianças (
É essencial frisar que o uso de telas não resultou em diagnósticos de autismo, já que o fator genético é determinante para a neurodivergência. O que as crianças demonstraram foi um número maior de pontos marcados na escala de 23 itens do M-CHAT, ou seja, de características e comportamentos identificados em crianças neurotípicas. Contudo, a escala, sozinha, é usada apenas como um parâmetro e não assegura um diagnóstico positivo, sendo necessária a consulta com um especialista.
O estudo notou ainda que, entre crianças expostas às telas, mas que tinham uma frequência de leituras e brincadeiras por parte dos pais, foram identificados menos traços característicos do autismo. O grupo a apresentar menos características, contudo, foi o de crianças que cujos pais brincavam e liam para elas regularmente e que não foram expostas com frequência a telas até pelo menos os 18 meses de idade.
Para comentar sobre a relação entre brincadeiras analógicas e exposição a telas, O POVO+ conversou com o médico André Pessoa, professor da Universidade Federal do Ceará, chefe do departamento de neurologia pediátrica do Hospital Infantil Albert Sabin e um dos orientadores do projeto Brinquedo Terapêutico.
"O brincar é uma atividade cognitiva. Trabalha a imaginação, a consciência corporal, a linguagem, a fala, a socialização e, por outro lado, diminui o tempo do uso de tela"
Ele explica que existe um problema grave em relação à disparidade social quando falamos de uso de telas: “Quem tem uma melhor condição sociocultural já tem mais esse cuidado, enquanto pessoas em situação mais vulnerável normalmente não tem. O que a gente tem visto é que famílias mais carentes têm um uso mais indiscriminado de telas por parte dos filhos, o que é um problema de saúde pública. O uso indiscriminado de telas no Brasil é hoje um problema de saúde pública”.
O médico relembra ainda de outros estudos na mesma linha daquele publicado pela Jama Pediatrics: “Mais recentemente, houve um estudo de 9 anos na Coreia que, realmente, acompanhou crianças por tempo de tela e as analisou aos nove anos de idade. E aos nove anos de idade, as crianças com mais tempo de tela também tinham mais TDAH, Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade, que é outro transtorno do neurodesenvolvimento”.
Ele enfatiza, contudo, que mesmo sendo um fator de risco, as telas não são a causa da neurodivergência. Embora a exposição possa resultar em problemas de socialização e fala, como os estudos apontam, uma das causas centrais consensual entre especialistas é a predisposição genética.
“Tem um conceito de neurociência chamado de neuroassinatura, que é como se fosse uma impressão digital que é forjada [...] e a criança que tem um um acesso a tela muito precoce, uma das hipóteses é que aquele cérebro se especializa em recursos audiovisuais, e essa especialização precoce em recursos audiovisuais estaria relacionado a um menor estímulo das áreas sociais e de linguagem”, explica o professor.
LEIA REPORTAGEM DO OP+| Infância e tecnologia
O médico reforça que a abordagem lúdica permitida por meio dos jogos analógicos e do brincar longe das telas é uma das formas de proteger e promover o desenvolvimento cognitivo saudável das crianças.
Jogadores têm duas opções: jogar uma de suas fichas sobre a carta disponível na mesa, ou pegar a carta disponível (com as fichas que já foram jogadas sobre ela) e abrir a próxima carta. No entanto, as escolhas não são tão fáceis, pois os jogadores competem pela menor pontuação ao final do jogo
Pitágoras e Arquimedes são dois jogos da mesma editora envolvendo operações matemáticas! Eles trazem uma jogabilidade diferente entre si, mas os dois tem propósitos de exercitar a mente e a capacidade de fazer contas rápidas e de cabeça
Em Red7 você será desafiado a ganhar dos outros jogadores em todos os seus turnos. Cada uma das 7 cores representa uma forma diferente de ganhar. Um jogo rápido e estratégico, para todos os perfis e um modo avançado para jogadores experientes. Uma rodada de Red7 dura apenas alguns minutos
A psicóloga infantil Adrielle Lima é uma das que acredita na capacidade de crianças se desenvolverem por meio de jogos. Formada em Psicologia pelo Centro Universitário Estácio, ela atende crianças em São Gonçalo do Amarante, sua cidade natal.
Ela atende crianças e adolescentes de diferentes faixas etárias, mas com todos aplica o método lúdico. A maioria de seus pacientes tem entre 1 ano e meio e 12 anos de idade. Para a profissional, os jogos são um processo para criar um vínculo com as crianças e assim impulsionar qualquer tipo de cuidado infantil.
Essa abordagem dentro da psicologia é chamada de terapia comportamental infantil (TCI).
"Quando as crianças chegam na sessão elas são muito diferentes dos adultos, elas não falam sobre as suas angústias e os problemas. Através dos jogos nós conseguimos identificar as questões que precisam ser trabalhadas e intervir de maneira eficaz"
Ela explica que o método utilizado rende vários benefícios para as crianças, como auto regulação emocional, raciocínio lógico, resolução de problemas e pensamento crítico. A parte mais expressiva de seus pacientes são crianças com atrasos no desenvolvimento.
Os jogos utilizados variam. Para pacientes mais novos, a psicóloga dá o exemplo de
Já com adolescentes, ela cita Dixit e Hora do Rush como exemplos de jogos usados para se conectar os pacientes e trabalhar seu desenvolvimento. Adrielle explica que avalia, com cada paciente, os melhores jogos para desenvolver diferentes habilidades cognitivas.
A especialista alerta, contudo, que não aconselha a pais que tentem usar os mesmos jogos com o objetivo de tratar das questões dos filhos. Orienta, ao invés, que a família crie uma rotina de atividades com brincadeiras e jogos para ter momentos de qualidade juntos e longe de interferências externas, especialmente das promovidas por telas e eletrônicos.
Ao promover momentos de interação com base nos jogos, os responsáveis "estão fortalecendo o vínculo familiar e ainda proporcionando um ambiente acolhedor para aquela criança dentro de casa. Não que o ambiente de casa não seja acolhedor, mas daria momento de qualidade, sabe? Da família com aquela criança", diz a profissional ao frisar os benefícios do brincar para saúde mental e emocional dos pequenos.
Cada jogador pode controlar qualquer herói para fazer com que ele execute uma ação muito específica, à qual os outros jogadores não têm acesso: mover para o norte, explorar uma nova área, andar de escada rolante... Tudo isso requer um alto nível de cooperação entre os jogadores para mover os heróis da maneira mais prudente possível. No entanto, só é permitido comunicação entre os jogadores por curtos períodos durante o jogo; o restante do tempo, vocês devem jogar sem dar qualquer pista com sons ou visual uns aos outros
Hanabi – palavra japonesa para “fogos de artifício” - é um jogo no qual jogadores tentam apresentar o espetáculo perfeito de fogos, colocando as cartas na mesa na ordem correta. Neste jogo você segura suas cartas de forma que elas fiquem visíveis apenas aos outros jogadores. Isso mesmo, você não pode ver suas próprias cartas! Vocês devem trabalhar em time, dando dicas uns aos outros a respeito dos valores ou das cores das cartas de cada um para criar um deslumbrante espetáculo de fogos antes que acabem suas cartas
Um jogo de aventura ambientado na idade da pedra, no qual os jogadores tentam manter vivos os seres humanos sob seus cuidados enquanto completam as missões. Às vezes você precisa de uma pele, às vezes de uma tenda, mas todas essas são missões menores em comparação com seu objetivo de longo prazo: pintar um mamute peludo na parede para que os humanos, milhares de anos depois, saibam que você existiu. (Ok, você apenas acha que a pintura de mamute parece legal. Preservar um registro de sua existência passada é um molho)
A praticidade de uma partida rápida e temática diversa dos jogos também permitiu que outra especialidade clínica encontre aplicações para eles: os fonoaudiólogos. É normal que seja feito o uso de vários tipos de brincadeiras e jogos educativos nos atendimentos, mas Carolina Chollet é uma das que adota jogos de mesa em suas sessões.
"Percebi que o tempo curto de jogo, a necessidade de pensamento estratégico e tomada de decisão favoreciam a autoavaliação, flexibilidade de pensamento e mudança de estratégia por parte das crianças. Competências que precisam estar presentes na terapia de fala e linguagem infantojuvenil", explica sobre o porque passou a adotar jogos como Dobble e
"A criança, ao jogar, aprende a aceitar regras, pois o desafio está em
saber respeitá-las, saber esperar sua vez"
Fonoaudióloga clínica há mais de duas décadas, ela conta que a paixão por jogos vem desde a infância, quando jogava Banco Imobiliário com os irmãos e primos. Mãe de dois filhos, Carolina explica que jogos também foram uma forma de fortalecer os vínculos.
"A maternidade me fez ver a real importância do brincar no desenvolvimento dos meus filhos. Os jogos modernos contêm normas e regras. Todos que participam têm as mesmas oportunidades. A criança, ao jogar, aprende a aceitar regras, pois o desafio está em saber respeitá-las. Saber esperar sua vez, resultados dos dados ou de outro fator de sorte, são ótimos exercícios para lidar com frustrações", explica.
Contudo, ela alerta para que tanto no ambiente clínico quanto no familiar é necessário não obrigar a participar daquela atividade. A terapeuta da fala comenta que, normalmente, seus clientes um pouco mais velhos costumam rejeitar os jogos em favor de outros exercícios, como livros ou outros estímulos.
"É muito importante que os pais respeitem as crianças e não insistam na brincadeira caso elas demonstrem desinteresse ou cansaço, para não ocorrer saturação", alerta.
A profissional que destaca o brincar com jogos de mesa como um estímulo facilitador para o processo de evolução do tratamento fonoaudiólogo, além de reduzir o estresse e a ansiedade naturalmente gerados pela necessidade de atendimento clínico.
Uma das razões que fazem os jogos modernos serem abraçados como ferramentas de ensino é sua pluralidade de mecanismos e dinâmicas. Jogos que envolvem habilidades de línguas, comunicação, cálculo e raciocínio, como alguns dos indicados nesta série de reportagens, são reconhecidos por seu valor pedagógico e recomendados por pedagogos em fóruns como os do site Ludopedia e Boardgame Geek ou mesmo em consultorias.
Mas enquanto professores são constantemente motivados a buscar por novas abordagens lúdicas, há uma dificuldade real de adotar métodos como pedagogia lúdica.
"Na graduação nós estudamos bastante sobre os benefícios que os jogos trazem para o aprendizado das crianças"
A psicopedagoga Edilaine Magno, professora da rede municipal de ensino de Fortaleza, relata que ela e seus colegas são constantemente incentivados a buscar formas de adotar a ludicidade e diferentes dinâmicas em suas aulas. A especialista, entretanto, relata que a falta de verbas destinadas especificamente para esse investimento impede que mais professores usem essas ferramentas.
Ela afirma que entende os jogos modernos com dinâmicas mais estruturadas como muito benéficos, mas os preços impedem seu uso. Por isso, a professora cria e adapta os próprios jogos e dinâmicas, a depender do assunto que vai ser trabalho na aula.
"O jogo ele é um objeto caro. E nós não temos acesso, a escola não recebe recurso para isso diretamente, nós não temos. Então eu trabalho com jogos que eu mesma fabrico de acordo a minha necessidade, de acordo com a minha intenção e do contexto que eu estou ministrando", explica a psicopedagoga.
Ela relata que, em sua experiência pessoal, o uso de jogos torna a turma eufórica e engajada na atividade. A maior dificuldade sentida pela educadora é acalmar os alunos do frenesi inicial da dinâmica e que, passado isso, seus alunos recebem muito bem a iniciativa, o torna o aprendizado mais leve e facilita o acompanhamento pedagógico, em especial diante de exercícios que promovem o letramento inicial para as crianças.
"Quando você tá iniciando um trabalho com os jogos lúdicos em sala de aula as crianças ficam eufóricas. E você tem uma turma de 27, 25 alunos todos em cima de você ao mesmo tempo. Então assim, o trabalho que se dá é de você conseguir organizar a sala, conseguir fazer com que eles entendam a dinâmica [...] mas esse trabalho é muito inicial, a medida que as crianças vão se acostumando com essa prática fica bem mais fácil", conclui a psicopedagoga.
>> Opinião <<
Por Sara Oliveira*
Nunca fui muito de jogos, nem virtuais e nem de tabuleiro. Fui das bonecas, do brincar de casinha, de carimba… confesso que alguns jogos de raciocínio nunca me instigaram. Gostava de viver o lúdico de outro jeito. Mas aí corta pra eu com 41 anos, dois filhos, Léo, 8, e Cadu, 5, sozinha em uma casa, em um tempo que um dos maiores desafios é manter as crianças o mínimo possível presas às telas, seus tantos fascínios, facilidades e perigos. O resultado: uma mesa de 1m² ocupada por dias pelo banco imobiliário, muitas risadas e diferentes aprendizados.
Descobri como é bom raciocinar junto, conhecendo a si e aos seus. Léo é extremamente habilidoso, desde o primeiro jogo sério que jogamos: o UNO. No jogo de estratégias de guerra, meu Deus, eu perdia muito feio. Por muito até me perguntava se era pouca atenção que eu oferecia (sim, talvez, também) mas mesmo assim eu perdia de lavada muitas vezes. Segui, formei dupla com o Cadu e, entre cartas ao contrário e segredos entregues, fui conquistando meu espaço.
Ainda não jogamos de igual para igual, mas eu descobri naquele momento um dos mais importantes. Voltei a aprender como criança, com a minha criança. Para fazer ele ter mais vida de criança. Com isso, ganhei não só nos inúmeros momentos que temos de gargalhadas, conhecimento e educação, mas também em tentar me concentrar mais. Foco nas estratégias, no que é preciso para chegar onde quero. Me ajuda na desatenção constante e na ansiedade. Isso tudo ao lado de quem eu mais amo nesse mundo.
E se essa descoberta é enorme para mim, imagina para eles, crianças que vivem a explosão do virtual, têm sede dela, querem, mas são protegidos por inúmeras dúvidas e certezas sobre os efeitos desse novo universo. Quando estamos ali, jogando, compartilhamos mais as emoções do medo, da dúvida, da perda, da vitória… sim, já me “troquei com a criança” quando venci pela primeira vez rsrs. E o Cadu defendeu o Léo nessa hora. Foi daqueles momentos que ver indivíduos crescerem assusta de tão importante que é.
Dominó, paciência, sanduíche maluco, dama, baralho, WAR… no banco imobiliário, já aprendi que investir nas propriedades certas, na hora certa e com cuidado, lhe dá mais chances de chegar aos resultados esperados. Sob o risco de tudo mudar de uma hora para outra. E que você poderá recomeçar quantas vezes for necessário.
* Sara Oliveira é repórter especial de Cidades do O POVO há 10 anos, com mais de 15 anos de experiência na editoria de Cotidiano/Cidades nos cargos de repórter e editora. Uma mulher de 41 anos, mãe do Léo (8) e do Cadu (5), segue apaixonada por praia e pelas descobertas da vida materna e feminina
"Oi, aqui é Guilherme Siqueira, repórter do O POVO e autor desta série sobre jogos analógicos. Te convido a conferir também os outros dois episódios e deixar um comentário. Abraços!"
Reportagem especial mostra como os Jogos de tabuleiro estão em alta e desperta interesse de jogadores, educadores, pesquisadores e empreendedores. Longe das telas, jogos de mesa divertes e ajudam no tratamento de crianças