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Brasil pode chegar a 200 milhões passageiros nos próximos 10 anos
Reportagem Seriada

Brasil pode chegar a 200 milhões passageiros nos próximos 10 anos

| PRESIDENTE DA ABEAR | Entre 2002 e 2016, o número de passageiros triplicou, chegando a 100 milhões anuais, e os preços caíram pela metade. Desde então, mercado vive estagnação, mas Sanovicz diz que há potencial do mercado aéreo brasileiro duplicar de tamanho em uma década caso condições econômicas melhorem
Episódio 38

Brasil pode chegar a 200 milhões passageiros nos próximos 10 anos

| PRESIDENTE DA ABEAR | Entre 2002 e 2016, o número de passageiros triplicou, chegando a 100 milhões anuais, e os preços caíram pela metade. Desde então, mercado vive estagnação, mas Sanovicz diz que há potencial do mercado aéreo brasileiro duplicar de tamanho em uma década caso condições econômicas melhorem
Episódio 38
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Quando o mundo inteiro praticamente parou em março de 2020 por conta dos efeitos da pandemia de Covid-19, um dos símbolos desse processo de paralisia e desaceleração geral foram possíveis de ver em diversos aeroportos ao redor do mundo: a quantidade de aeronaves paradas nos pátios após o cancelamento de voos. No Brasil, no auge da crise, reduzimos a malha aérea doméstica a 7% em relação ao pré-crise. E a 0% a internacional.

Quem acompanhou o desenrolar desta crise no setor aéreo foi o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz. Graduado em História, mas com longeva atuação no setor de eventos e turismo, sendo inclusive presidente da Embratur entre 2003 e 2006, ele analisa esse momento como a maior crise já enfrentada pela aviação mundial.

Entende que as companhias aéreas vão saindo desse momento sem a ajuda financeira solicitada ao Governo Federal, mais “magras” e com algumas “feridas”, mas que buscaram soluções internas para se financiarem enquanto as aeronaves ficaram em terra.

Sobre o peso da inflação na operação, critica os custos extras decorrentes da política de preços da Petrobras, que elevou o querosene de aviação em 50% em 2021, bem acima da média observada nos aumentos do gás de cozinha e da gasolina. Eduardo ainda explica por qual motivo o mercado brasileiro se torna “caro” para atuação de empresas aéreas.

Nesta entrevista exclusiva ao O POVO, o executivo destaca: Brasil tem potencial de dobrar a movimentação de passageiros nos aeroportos, dos atuais 100 milhões obtidos em 2019. Tudo vai depender da retomada do consumo.

“Se tivermos um período de retomada da capacidade de renda das pessoas com um processo de recuperação econômica, nós acreditamos que será possível dobrar o número de passageiros anuais na próxima década”.

 

 

 

 

O POVO - Sua formação profissional foi em História, com mestrado e doutorado em Ciências da Comunicação. Como foi que a aviação e o turismo foi entrando na sua vida?

Eduardo Sanovicz - Após me formar em História, comecei a lecionar, mas desde garoto, no início da faculdade, tinha relações com o setor de eventos. E, na minha juventude, fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, coincide com um movimento muito forte estudantil e de luta pela Democracia. Então, eu me envolvo na organização de congressos e convenções ligadas aos temas que a gente debatia na universidade e gostei muito daquilo.

Mesmo depois de formado, iniciando uma carreira lecionando, continuei vinculado a esse tema e participei da organização de eventos culturais, shows, shows na praia - sou de Santos, no litoral de São Paulo - e daí migrei para essa área de congressos e eventos.

Na sequência fui para o turismo e, em 1993, fui diretor de Turismo da cidade de Santos. Depois desse período, fui morar em Barcelona, passei um período no Barcelona Convention Bureau. Aí volto a São Paulo para dirigir o Convention Bureau de São Paulo - que é uma organização mantida pelo setor de hotelaria, em Fortaleza também há.

Depois disso fui dirigir o Pavilhão de Exposições do Centro de Convenções de São Paulo. Aí chego na Embratur, num momento em que já estava bastante envolvido com o turismo, tendo usado o setor de eventos como porta de entrada. E resolvi fazer mestrado e doutorado nesta área.

Encerro minha participação no setor público na Embratur e volto ao setor privado e lá se vão 15 anos. Nesse período fui convidado para desenhar, montar, fundar e dirigir a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), na qual em fevereiro completará dez anos.

OP - Sua trajetória é longa e acompanha muita evolução nos setores de turismo e eventos, que foram amplamente impactados pela pandemia. Como a aviação passou por esse momento, já que depende muito desses setores?

Eduardo Sanovicz - A cadeia do turismo foi fortemente impactada. Até agora não se recuperou completamente, destaco o setor de eventos, que ainda não voltou em plena capacidade em quase nenhum lugar.

Na aviação, passamos pela maior crise de sua história, desde que o mercado de aviação está como conhecemos, a partir de 1945, quando após a Segunda Guerra Mundial, se criou a Iata (Associação Internacional de Transportes Aéreos) e a Icao (Organização da Aviação Civil Internacional).

 

"Quando vem a segunda onda mergulhamos de novo, depois, com o avanço da campanha de vacinação, começa a regressar. Hoje, estamos com 80% da malha aérea doméstica no ar e aproximadamente 40% da malha internacional."

OP - De forma a dar uma noção de qual era o cenário pré-pandemia do setor de aviação, como estava a demanda, houve crescimento?

Eduardo Sanovicz - Ao fim de 2019, era um momento no qual nós imaginávamos que 2020 seria um ano em que iríamos sair de vez de um período de crise que nos perseguia desde 2016.

Vamos lembrar que o crescimento do País em 2017, 2018 e 2019 foram anos muito duros para nós. Havia expectativa de crescimento mais robusto em 2020. Na aviação, a gente tinha uma expectativa de crescimento de 9% no ano, o que obviamente se frustrou completamente.

OP - Em 2021, neste processo de retomada da economia, a carga inflacionária aumentou muito. E no setor da aviação não foi diferente. Como a elevação de preços do querosene de aviação tem impactado as operações das aéreas?

Eduardo Sanovicz - A mídia e a sociedade, com razão, têm prestado muita atenção ao crescimento do custo da gasolina, do diesel, do gás de cozinha, que são itens de consumo de massa. Só que esses itens dispararam de preço numa média de 38%, já o querosene de aviação, que é o nosso combustível, de janeiro a outubro subiu 50%.

Querosene de aviação no Brasil é pouco mais de 1/3 do custo da passagem aérea, enquanto no resto do mundo fica na média de 22% a 24%. Essa diferença se deve, basicamente, à política de preços da Petrobras, que cobra em dólar produtos que são produzidos em reais.

A Petrobras paga salários, insumos, tudo em reais e cobra em dólares após uma definição política, de cobrar no mercado nacional como se fosse exportar. Isso tem impacto direto nos nossos custos, somado ao fato de que o leasing (aluguel ou financiamento) das aeronaves, que é mais ou menos 18% dos nossos custos, também é dolarizado.

 

 

 

OP - Há o temor de que esse impacto inflacionário, que subiu de patamar e deve ser duradouro, segundo as perspectivas prévias, possa gerar o efeito de vender menos passagens, perder público consumidor na aviação?

Eduardo Sanovicz - Sempre existe um temor neste sentido. Nós sempre ficamos muito aborrecidos quando os custos explodem porque um dos fatores que limita o aumento de preços é a capacidade de consumo das pessoas. No momento em que o País está com uma enorme quantidade de pessoas sem trabalho e com a renda comprometida, é claro que esse é um cenário possível, sim.

Movimentação no Aeroporto Pinto Martins (Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Movimentação no Aeroporto Pinto Martins

 

OP - Os indicadores do mercado do transporte aéreo divulgados pela Anac mostram que o setor segue em um ritmo de recuperação gradual no mercado doméstico em relação ao período pré-pandemia. Como vocês estão avaliando esse ritmo de retomada no Brasil após a segunda onda?

Eduardo Sanovicz - Existe a demanda de passageiros que não estão podendo viajar internacionalmente e estão demandando mais os destinos nacionais. Nós estamos fechando novembro com quase 80% da malha aérea doméstica no ar, número de voos. Mas ainda estamos com cerca de 1/3 da malha aérea internacional.

Porque somado o nível de comprometimento de renda das pessoas, com a disparada do câmbio, acrescidos do fato de que há um conjunto de restrições enormes para a entrada de brasileiros em outros países fazendo com que essa malha internacional retome mais devagar.

 

Ou o consumidor que conhecia os cinco maiores teatros de Nova York, mas nunca tinha ido aos Lençóis Maranhenses ou ao Pantanal. Esse segmento de consumo está viajando pelo Brasil, está gostando e recomendando aos amigos. Então há uma ascensão do mercado doméstico e se a gente considerar que o "boca a boca" ainda é muito importante para consolidar a imagem de um destino, isso tende a se espalhar ainda por algumas temporadas.

OP - Então podemos considerar esse fator como ponto que deve consolidar a retomada do turismo brasileiro no fechamento de 2021? E a perspectiva para 2022?

Eduardo Sanovicz - Eu entendo que o resultado do turismo doméstico deve fechar acima das expectativas por conta da presença desse público, concordo com isso. As previsões para o futuro ainda são um pouco precoces, pois há um conjunto de fatores que está além da nossa governabilidade.

Digo do que se trata: Pouco mais de 80 países ainda tem algum tipo de restrição aos visitantes brasileiros, desde a quarentena até a exigência de vacinação, são vários tipos de restrições. Essa chave não muda ao mesmo tempo no mundo inteiro.

Os países são independentes e autônomos, vão mudar essas orientações quando julgarem adequado de acordo com suas condições internas. França num dia, Inglaterra no outro, México em outro, Austrália no outro e assim sucessivamente. Por isso, é muito difícil prever essa dinâmica nos próximos meses, seria exercício de futurologia. Nós realmente estamos na mão de decisões a serem tomadas por outros países.

Pandemia de Covid-19 gerou paralisação de grande parte da operação da aviação no mundo(Foto: Pittsburgh International Airport)
Foto: Pittsburgh International Airport Pandemia de Covid-19 gerou paralisação de grande parte da operação da aviação no mundo

OP - E o Ceará, como vocês veem o Estado na retomada do turismo e o processo de fortalecimento de seus destinos?

Eduardo Sanovicz - Eu creio que o Ceará se coloca muito bem. Nós temos observado nos anos mais recentes um processo de crescimento de ampliação da malha aérea no Ceará, resultado dos acordos construídos pelo Governo do Estado, pela Secretaria de Turismo, que envolveu todas as companhias aéreas.

Eu me lembro que na última vez que fui ao Ceará foi por conta da chegada do voo da Air France/KLM, que faz a ligação direta Fortaleza-Paris, depois Fortaleza-Amsterdã. Algo inédito, fruto de ações do governo pactuado com a empresa.

Isso mostra a capacidade de competir que o Estado construiu nos últimos anos e isso está bem vivo na memória das pessoas. Soma-se ao fato de vermos em diversos aeroportos do País ações de promoção e marketing do Governo do Ceará que mantêm o destino na memória das pessoas.

Creio que esse processo de retomada vai se dar muito rapidamente. A malha aérea no Ceará tem crescido muito acima da média nacional nesta retomada. 

"E eu sei do peso que o turismo tem na economia cearense, portanto, somando os dados preliminares e os meus sentimentos, indico que o Ceará está numa situação muito vantajosa em comparação aos destinos concorrentes."

OP - Com a inflação em alta e o preço médio das passagens aéreas subindo, os consumidores buscam opções. Nos últimos anos, tivemos a chegada de companhias aéreas de baixo custo, as "low cost". Até que ponto esse tipo de produto pode ganhar adesão dos brasileiros?

Eduardo Sanovicz - A questão não é de um produto como esse ganhar a aceitação dos brasileiros. Mas é de como um produto como esse vai permanecer de pé num mercado com os custos do Brasil. Vou te dar um número: Se uma empresa aérea melhor gerenciar os custos do planeta, uma empresa europeia, se amanhã por um passe de mágica começasse a operar no Brasil, voasse Fortaleza-Brasília, Brasília-Rio, Rio-São Paulo, antes da desvalorização pesada do real, ela custaria 27% mais caro no Brasil do que custa na Europa.

Hoje não temos esse cálculo atualizado por conta de outras agendas mais urgentes, mas a tendência é de que tenha piorado esse índice. Por quê? Porque o Brasil acumula distorções, a precificação do querosene de aviação, o ambiente regulatório e o regime tributário, somados, geram esse número. É por isso que, entre 2002 e 2016, o valor do ticket médio caiu pela metade - saindo de R$ 900 para R$ 400 - ao mesmo tempo em que o número de passageiros triplicou.

Em 2002, voavam no Brasil 30 milhões de passageiros. Já em 2016 eram 104 milhões. Conto a partir de 2002 porque foi o ano de um grande marco para a aviação, pois mudamos do bilhete tarifado para liberdade tarifária, que permitiu que o Brasil ingressasse na era da concorrência na aviação.

No Brasil, no período pré-pandemia, vendíamos 100 milhões de bilhetes. Sendo 11% deste total custando abaixo de R$ 100 e outros 56% custando abaixo de R$ 300. Isso é um dado de 2019.

Significa, portanto, que existe espaço para vender bilhete mais barato e há público consumidor para isso. Mas, uma empresa para viver exclusivamente dos bilhetes "low cost" precisa também ter custos semelhantes aos praticados na Europa, Estados Unidos e em países nos quais opera para que o modelo de negócios fique de pé, fazendo a conta caber dentro do custo.

OP - Essa série de distorções torna o Brasil um mercado muito caro para a atuação das empresas, apesar do grande público consumidor...

Eduardo Sanovicz - Claramente, sim.

OP - Dentro desse contexto, em 2021, o Congresso e o Executivo entraram com mais força na discussão de uma reforma tributária, tivemos também a questão da reforma do Imposto de Renda, mas ainda há várias discussões pendentes como a própria criação do IVA. Como o setor avalia o saldo dessas mudanças legislativas e quais as demandas do setor nesse quesito?

Eduardo Sanovicz - O nosso conceito central do que queremos é que no Brasil as regras dentro da nossa área de atuação sejam as mesmas das praticadas ao redor do mundo. Porque nós competimos globalmente. Quando o consumidor vai procurar um bilhete para um destino, a primeira coisa que ele vai olhar é preço, depois você vê cinco ou seis fatores secundários.

Ora, a companhia que tiver o custo menor, terá o preço menor. Se no Brasil, novamente, os nossos custos tributários, de insumos (caso do combustível e leasing) e regulatórios são mais caros, isso compromete nossa capacidade de competir globalmente. Um avião não sabe que atravessou a fronteira, mas queremos condições de oferecer ao consumidor brasileiro o que nosso concorrente que atua na Europa pode oferecer.

Especificamente sobre os tributos, nós temos no Brasil o ICMS. E o Brasil é o único país do mundo que cobra um tributo regional sobre o querosene de aviação, temos aí uma distorção enorme porque o voo internacional não paga.

Movimentação de embarque no Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza(Foto: Bárbara Moira)
Foto: Bárbara Moira Movimentação de embarque no Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza

E como somos signatários de acordos internacionais, ocorre de aviões de uma mesma companhia nacional, Gol, Latam, Azul, encostam em Guarulhos-SP. Uma das aeronaves vai para Fortaleza e outra para Buenos Aires. Elas são abastecidas pelo mesmo caminhão, mesma pessoa. Mas o que avião com rota nacional paga 13% de ICMS para decolar, enquanto o que vai para Buenos Aires não paga nada.

Assim como o que decola para Miami, Berlim, Catar, porque em nenhum lugar do mundo se cobra imposto semelhante e, como não se cobra para vir até aqui, não se cobra para ir até lá. Por isso, desde 1988, quando colocamos na Constituição a cobrança desse imposto sob essas circunstâncias, dizemos aos brasileiros que eles prefiram viajar para o Exterior porque é mais barato do que conhecer o Nordeste.

Por isso que uma estratégia vitoriosa que os governadores dos estados tomaram foi a de reduzir o ICMS sobre o querosene de aviação em troca de ampliação da malha aérea, como foi feito, corretamente e com muito sucesso, no Ceará. Mas não creio que o debate da reforma tributária deva avançar neste mandato, não consigo ver mais energia no Congresso para isso.

OP - A gente teve nos últimos dois anos um impacto severo na estrutura financeira de muitas aéreas. Como está esse processo de refinanciamento de dívidas e da saúde financeira das empresas? Existe risco de termos quebra de alguma companhia?

Eduardo Sanovicz - As três maiores empresas nacionais não obtiveram qualquer tipo de crédito público ou aparato do estado. Tivemos um apoio bastante importante do Ministério de Infraestrutura, do Turismo, da Anac, no sentido de medidas que facilitaram a travessia da crise, como a remarcação de bilhetes sem custo, estacionar aeronaves no pátio da Aeronáutica, uma série de medidas que foram tomadas por uma série de instrumentos da Secretaria de Aviação Civil.

Mas crédito, que nós pedimos via Ministério da Economia ao BNDES, isso não ocorreu e cada empresa buscou seus próprios caminhos. Uma emitiu debêntures, outra teve aporte de recurso por parte dos acionistas... Mas há um conjunto de contas importantes a serem quitadas nos próximos anos e nós estamos saindo da crise mais magros, com alguns machucados. Mesmo assim creio que vão conseguir atravessar esse momento e conseguir fazer uma retomada importante.

OP - Em que medida a nova variante ômicron impacta esse processo de retomada e como essa demanda pelo passaporte da vacina tem sido analisada pela Abear?

Eduardo Sanovicz - Nós somos 100% favoráveis à vacinação. E eu quero dar dois exemplos: Assim que chegaram as vacinas nós nos colocamos à disposição do governo para transportar gratuitamente as vacinas por via aérea. Então todas as vacinas que chegaram ao Ceará e vacinaram o braço da população, chegaram por avião.

Nós transportamos mais de 250 milhões de vacinas gratuitamente porque entendemos que isso salva vidas e é nossa missão. O segundo fator é que isso ajuda a retomar a vida cotidiana das pessoas. Por isso, todas as empresas aéreas decidiram desligar funcionários que se recusem a ser vacinados, pois entendemos que os não vacinados põem em risco a vida deles, dos colegas e dos passageiros.

 

Nos colocamos a favor do passaporte da vacina desde que se tenha estrutura para fiscalizar e restringir aos voos internacionais. No doméstico não achamos necessário pela ampla vacinação no território nacional, o negacionismo é pequeno. Em todo País há uma massificação na proporção de vacinados. Mas no voo internacional, sim, achamos correto implementar o passaporte da vacina.

OP - Como o setor de aviação vê os desafios dos próximos anos para reverter os efeitos da crise?

Eduardo Sanovicz - Vai depender muito da retomada da capacidade de consumo das pessoas. Segundo, isso está vinculado à capacidade das empresas de retomarem investimentos. Os executivos e funcionários de uma organização só viajam se essa organização tiver negócios em outro lugar, então esse é o ponto.

Do ponto de vista do mercado corporativo (importante cliente do setor de aviação), precisamos que as companhias retomem investimento. Do ponto de vista do mercado de lazer, em que as pessoas viajam pagando a própria conta, nas férias, no feriado, as pessoas precisam ter capacidade de consumo, pagar a passagem, hotel, hospedagem, comida fora, presentes.

Portanto, é decisiva a necessidade de retomar crescimento econômico para retomar a capacidade de viagens. O volume de retomada que estamos vendo agora é muito baseada no segmento lazer, secundariamente pelo segmento corporativo e eu entendo que os 20% que faltam para fechar a conta da recuperação estão ligados à retomada do setor de eventos, destacadamente das grandes feiras, congressos e exposições que acontecem em São Paulo, que são as maiores da América Latina.

OP - Nos últimos anos, o anúncio de parcerias entre empresas aéreas brasileiras com grandes empresas aéreas internacionais se intensificou. Como isso ajuda nosso mercado no quesito qualidade e processos?

Eduardo Sanovicz - Essas parcerias têm dois grandes aspectos, do técnico, de informações, práticas, atendimento ao consumidor e mercado. E ampliação de malha. Então são parcerias que geram um retorno positivo ao consumidor.

É possível comprar uma passagem e partir com um mesmo bilhete daqui até o outro lado do planeta, resolvendo tudo com uma compra só. As empresas também vão aprendendo com essas empresas, capturando cultura gerencial, incorporando tecnologia, gestão e avançando com seu modelo de negócios.

OP - Sobre as inovações e práticas que são adotadas no mercado internacional, como o Brasil se coloca ante as grandes empresas do mercado internacional? Ainda há algum tipo de entrave regulatório que impeça avanço?

Eduardo Sanovicz - Nos aspectos regulatórios, nos últimos cinco anos, avançamos muito. A Anac atualizou algumas regras que vinham desde os anos 1980, 1990, e isso fez com que a gente andasse bastante.

Nós podemos dizer que regras que definiam nossa operação em terra, em voo, nossa relação de consumo, produtos, mercado. Todas vêm sendo atualizadas. Nisso estamos bastante bem. Quanto aos produtos, serviços, inovações e tecnologia, essa é mais legal ainda, pois não devemos nada a ninguém.

Qualquer cliente que voe frequentemente no Brasil, Europa e Estados Unidos verá que as aeronaves do Brasil são mais novas do que a média americana e a média europeia, a tecnologia de serviços de maneira geral é mais avançada.

 

OP - Uma questão importante para a operação é a infraestrutura aeroportuária. Nos últimos anos, tivemos muitas concessões de aeroportos e, agora, em 2021, já conseguimos ver resultados. Como as empresas avaliam esse desenvolvimento e como a aviação nacional avançou nesse quesito?

Eduardo Sanovicz - Completamos neste mês de dezembro uma década do início do programa de concessões. A última rodada importante de concessões deve ocorrer em abril de 2022, que é quando teremos as duas joias da coroa, Santos Dumont-RJ e Congonhas-SP, que são os aeroportos de maior relevância do País no mercado doméstico.

Nós avaliamos como muito positivo o resultado, os aeroportos melhoraram, a infraestrutura melhorou, a atenção ao consumidor aumentou. Você veja o caso do Aeroporto de Fortaleza, o que ele era há cinco anos e no que ele se tornou.

Vemos ainda os casos de Guarulhos, Confins, Salvador, Brasília... Enfim, todos os aeroportos concedidos tiveram expansão relevante. Para as companhias, tivemos um problema que foi o crescimento dos custos dessa operação.

Algumas das nossas tarifas de operação subiram 1.300% depois da concessão, mas isso é uma disputa de mercado, não temos mais a presença de empresa estatal que por diversos fatores acaba tendo a sua capacidade de investimento comprometida.

E isso trouxe para o Brasil uma característica muito especial, de ser o país com o maior número de operadores aeroportuários do planeta. Isso significa que em uma década nós teremos uma cultura de gestão aeroportuária muito interessante e que deve gerar frutos muito positivos.

Lembrando que, entre 2002 e 2016, nós triplicamos o número de passageiros diminuindo pela metade o valor médio do bilhete. Agora, vivemos um período de cinco anos de estagnação.

Se tivermos um período de retomada da capacidade de renda das pessoas com um processo de recuperação econômica, nós acreditamos que será possível dobrar o número de passageiros anuais na próxima década, com consequências positivas na capacidade de oferta dos bilhetes também.

Dependemos fundamentalmente da recuperação da capacidade de consumo das pessoas e de investimento das empresas. Se isso acontecer, o Brasil pode novamente dobrar seu número de passageiros em uma década.

OP - Qual sua perspectiva pessoal sobre o futuro a ser vislumbrado para a aviação brasileira?

Eduardo Sanovicz - Meu sonho é concretizar essa possibilidade que falei, é retirar esse porém. Ver esse número de 100 milhões de passageiros que chegamos em 2019 e chegar em 2030 com 200 milhões, esse é o meu sonho. Ver os brasileiros com a chance de viajar de avião pelo menos uma vez.

 

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