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Custódio Almeida: os planos do novo reitor da UFC
Reportagem Seriada

Custódio Almeida: os planos do novo reitor da UFC

O professor planeja a criação de um distrito de saúde no Porangabussu, Casa de Cultura Indígena e corredor cultural até a Estação das Artes

Custódio Almeida: os planos do novo reitor da UFC

O professor planeja a criação de um distrito de saúde no Porangabussu, Casa de Cultura Indígena e corredor cultural até a Estação das Artes
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Professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Custódio Almeida assume o mandato de reitor da instituição com uma agenda de projetos que vão da cultura à saúde, duas das áreas nas quais deve começar a atuar mais fortemente a partir de agora.

Entre as novidades, por exemplo, o novo reitor afirma que pretende criar um distrito de saúde no bairro Porangabussu, onde se localizam equipamentos importantes da UFC.

De acordo com ele, já existem conversas em andamento com o governador Elmano de Freitas (PT) em relação ao assunto.

Noutra frente, Custódio também anuncia a retomada do projeto do corredor cultural do Benfica, mas agora com uma diferença: o percurso seguiria até a Estação das Artes, no Centro.

Também nessa seara, o professor fala sobre a criação da Casa de Cultura Indígena e da Casa de Cultura Africana, que funcionariam no espaço da Casa de José de Alencar, no sítio Alagadiço Novo.

Já nomeado pelo presidente Lula (PT) no início de agosto e com posse marcada para o próximo dia 25, em cerimônia na concha acústica com presença prevista do ministro Camilo Santana (Educação), o reitor não descarta revisar atos da gestão anterior, comandada por Cândido Albuquerque entre 2019 e 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

Você também pode assistir à entrevista do reitor Custódio Almeida

 

O POVO – Em 2019 o senhor já havia sido o mais votado para reitor da comunidade acadêmica da UFC, mas noutro contexto político. O presidente era Jair Bolsonaro. Como avalia os últimos quatro anos na universidade desde aquele episódio?

Custódio Almeida – O contexto é o contexto de uma universidade madura, acostumada a escolher seus dirigentes ao longo de décadas. Num determinado momento, aquele que é escolhido pela comunidade não é nomeado pelo presidente da República. É com certeza um golpe. Um golpe contra a universidade, um golpe contra a autonomia da universidade, é ser tratado como se não fosse capaz de escolher bem quem dirige. A minha avaliação política do que aconteceu é que foi um golpe contra a comunidade e que desacredita as pessoas do seu protagonismo e capacidade de atuação e decisão. Isso foi o pior que aconteceu. Tomando essa situação como base, tudo o mais que decorre daí, obras que sejam feitas, toda a atuação de serviços, fica sombreada, fica comprometida.

A minha avaliação política do que aconteceu é que foi um golpe contra a comunidade e que desacredita as pessoas do seu protagonismo e capacidade de atuação e decisão. Isso foi o pior que aconteceu. Tomando essa situação como base, tudo o mais que decorre daí, obras que sejam feitas, toda a atuação de serviços, fica sombreada, fica comprometida.

A universidade foi desrespeitada na sua condição fundamental. Afinal, entendemos a universidade como uma instituição que trabalha para a autonomia das pessoas, dos estudantes, o foco da UFC é a conquista da autonomia. Esse é o princípio da universidade, que é um princípio de liberdade institucional fundamental. A liberdade da universidade se constitui como sua autonomia. Essa avaliação precede qualquer avaliação de feitos operacionais, de trabalho, de construção, de compras de equipamentos. Qualquer coisa que possa ter sido feita nesse período, e muitas coisas foram feitas, ficam minorizadas pelo ato originário, que é o ato de negação daquela condição fundamental de uma instituição universitária.

OP – Do ponto de vista institucional, houve episódios tensos. Professores da Faculdade de Direito, por exemplo, foram alvos de processos. Acha que, a partir de agora, há possibilidade de pacificar essas relações na universidade?

Custódio – Tenho certeza disso. Tenho certeza disso a partir da votação. Diferentemente do clima brasileiro em que a eleição demonstrou uma divisão quantitativa clara, na UFC não houve essa divisão. Isso é bom. Quando olho os números absolutos, eu tive quase 90% dos votos. Isso significa estatisticamente que não há divisão que traga qualquer tipo de preocupação. O que há de fato é um grupo ainda de pessoas que atuou e votou na outra candidatura, mas absolutamente natural. A UFC já está pacificada, a nomeação do dirigente eleito já pacificou a universidade.

O que a universidade precisava para ser pacificada era exatamente resgatar essa sua condição de autonomia na escolha de quem a comunidade universitária quer que a dirija. Isso foi feito. Agora vamos trabalhar nesse clima, para consolidar essa pacificação, para que as pessoas assumam seu protagonismo. Na universidade todo mundo precisa ser protagonista, ela é uma instituição onde a hierarquia não existe para anular ninguém, mas porque há uma divisão de tarefas e de trabalho. Mas se cada pessoa não assumir o seu lugar de protagonista, a universidade não está cumprindo o seu papel. Uma das minhas atribuições como reitor é lembrar as pessoas de que elas estão na universidade, que ela é uma casa de educação.

A universidade é uma instituição colegiada, então qualquer ato que passe pelo conselho em princípio é um ato que deve ser respeitado e mantido. Aquilo que vai ser avaliado é o que deveria ter passado pelo conselho e não passou.

OP – O senhor está passando pela transição, assumindo dia 20 e a cerimônia de posse é dia 25 deste mês. Nesse processo, já identificou com sua equipe ações da gestão anterior que devem passar por alguma revisão, sejam programas ou iniciativas que o senhor tenha repesando e que queira já de imediato modificar?

Custódio – Quando a gente fala de atos da gestão anterior, a gente tem que analisar se esses atos passaram pelo crivo do Conselho Universitário. A universidade é uma instituição colegiada, então qualquer ato que passe pelo conselho em princípio é um ato que deve ser respeitado e mantido. Aquilo que vai ser avaliado é o que deveria ter passado pelo conselho e não passou.

OP – Por exemplo.

Custódio – Por exemplo, e não vou nem entrar no mérito da questão, tem uma portaria que obriga os estudantes de graduação que façam um mínimo de carga horária semestral. Esse ato tem que ser revisto por quê? Porque carga horária de qualquer curso faz parte do projeto pedagógico de qualquer curso, que é aprovado pelos conselhos superiores, pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e pelo Conselho Universitário. Chegou ao meu conhecimento que isso foi um ato que entrou em validade por portaria. Então ele fere um princípio básico da organização regimental da universidade.

A UFC não é uma instituição que se deixa manipular com facilidade. Não são atos monocráticos que fazem a universidade funcionar, são atos coletivos. Isso dá uma tranquilidade muito grande. A revisão fundamental é a revisão coletiva.

OP – Esse deve ser revisto?

CustódioDeve ser revisto. Você me pergunta: é contra? Não se trata disso. Trata-se do fato de que é um ato que deveria ter iniciado e ter sido validado a partir de um conselho superior e não foi. São coisas desse tipo. Mas não estamos entrando na reitoria com espírito revisionista, a pergunta é boa para isso. Isso está no nosso radar? No nosso radar está revisar o que precisa ser revisado não necessariamente porque veio da gestão anterior. Eu identifico esse exemplo não porque a gente esteja chegando com espírito revisionista, não é essa a situação. Estamos chegando com espírito pacificador, propositivo, a gente tem muita clareza de que a universidade só funciona com a atuação do seu corpo técnico e científico, docente, que o protagonismo dos estudantes é fundamental para a qualidade.

A UFC não é uma instituição que se deixa manipular com facilidade. Não são atos monocráticos que fazem a universidade funcionar, são atos coletivos. Isso dá uma tranquilidade muito grande. A revisão fundamental é a revisão coletiva. A gente vai fazer um trabalho grande de revisão inteira de todo o estatuto da UFC e de todo o regimento. Isso pode levar à conservação de vários pontos e de disrupção de muitos outros. Mas isso é um ato coletivo aprovado pelo conselho, envolvendo todo mundo, para que no final das contas todos se vejam no resultado.

 

A gente precisa superar atos autoritários. Todos os atos autoritários. O reitor da universidade, quero dizer isso muitas vezes, tem que ser exemplo de funcionário público. Ele é servidor público. Eu vou ser reitor da UFC, sou um servidor da UFC.

OP – Ano passado o reitor da UFC estava presente durante uma visita do então ministro Milton Ribeiro (Educação), que o parabenizou por eliminar os chamados “banheiros ideológicos”, numa referência aos banheiros sem gênero, que já foram implantados na Universidade Federal do Cariri (UFCA). Como acha que essa discussão deve ser conduzida na universidade? E que pontos especificamente precisam ser superados da gestão dos últimos quatro anos?

Custódio – A gente precisa superar um monte de coisa. Primeiro, a universidade de fato precisa brigar para ser includente. Precisa brigar dentro e fora. Há resistências à inclusão dentro da universidade, sim. Por exemplo, na época da lei de cotas, a gente teve muitas críticas na adesão, queriam que a gente protelasse o máximo possível. Tem resistências, o que é natural. Isso a gente precisa superar. A universidade tem que ser defensora da liberdade em todos os níveis. Fazer banheiro sem gênero é dar lição de vida e de respeito às pessoas.

Eu não estou tirando o direito de ninguém de usar o banheiro masculino ou feminino. Eu estou dando mais um direito para a pessoa que quiser e se sentir à vontade fazer uso de outro tipo de banheiro. São questões pelas quais a gente precisa brigar, e a gente brigará se for necessário, para superar. A gente precisa superar atos autoritários. Todos os atos autoritários. O reitor da universidade, quero dizer isso muitas vezes, tem que ser exemplo de funcionário público. Ele é servidor público. Eu vou ser reitor da UFC, sou um servidor da UFC. O que se espera de mim é que eu seja capaz de deixar aflorar os diferentes potenciais que as pessoas têm. Diálogo, e quando falo disso estou falando de escuta, não para só convalidar atos. Fazer o diálogo ser diálogo. Não ter medo de conflito. Democracia é lugar de conflito e de disputa, mas conflito e disputa não significam violência ou desrespeito. A universidade tem que fazer sendo educadora.

Custódio Almeida, reitor eleito da Universidade Federal do Ceará
Custódio Almeida, reitor eleito da Universidade Federal do Ceará Crédito: FCO FONTENELE

OP – Que UFC o senhor projeta ao final do seu mandato de reitor?

Custódio – É interessante que a comunidade universitária disse assim na campanha: professor, tudo que a gente quer é condições para trabalhar. A gente não precisa de nada mais do que isso. Se a universidade deixar a gente fazer o que a gente é capaz de fazer, a gente vai fazer muito. Isso está ressoando. O que eu quero incialmente é que as condições de trabalho em todos os níveis da universidade sejam as melhores condições possíveis. O estudante precisa chegar na universidade e ter condições de permanecer. Se é pobre e não tem condições de pagar sua comida, a universidade tem que prover isso com restaurante.

A universidade tem que prover condições de moradia ou bolsas para estudante que não mora na cidade. Ou seja, o estudante que chega e quer estudar tem que ter as condições para estudar. Tem que ter a biblioteca, o laboratório, estágio na hora certa, tem que acreditar que o curso que está fazendo vai levá-lo para um lugar melhor. Isso vale para o docente. Ele quer uma sala de aula onde o ar-condicionado funcione, que tenha projetor, ou seja, onde ele não se esforce para outra coisa que não o esforço intelectual de ser professor. Se ele é um pesquisador, precisa de laboratório de pesquisa, precisa de biblioteca ou plataformas. Se a gente garante isso, a gente está proporcionando a possibilidade de saltos de ensino e pesquisa.

OP – O senhor está falando de uma base material mínima que seria o prioritário.

Custódio – Uma base material mínima. E por que estamos falando de uma base material mínima? Porque agora é que estamos completando dez anos da lei de cotas. A universidade dos últimos dez anos não é a mesma universidade dos 60 anos anteriores, uma universidade que era muito mais elitista. Hoje, não. A gente tem um mínimo de 50% dos estudantes de todos os cursos que vieram das escolas públicas, fragilizados economicamente. Então isso é base. Obviamente, para além do básico, a gente tem o trabalho de criar possibilidades de articulações e relações interinstitucionais nacionais e internacionais o máximo possível. A UFC precisa entender o que é ser uma instituição plural. Enquanto instituição plural, ela deve ser capaz de se articular, dialogar e formar parcerias com todos os setores da sociedade. É uma instituição de natureza interssetorial. Tem que se relacionar com territórios rurais e urbanos que hoje são invisibilizados pela pobreza e pela exclusão. Tem que se relacionar com empresários dos setores de ponta que trabalham com energia limpa, hidrogênio verde, com pesquisas de IA. Eu preciso de memória. Estou querendo muito que a universidade saiba quem ela é de outra forma. Quem são as pessoas que se formaram na UFC e onde estão? Quero formar um grande portfólio de pessoas que passaram pela UFC e hoje ocupam as mais diferentes funções na sociedade.

OP – Isso é um projeto?

Custódio – É um projeto, sim. Quero identificar essas pessoas e trazê-las para perto da universidade. Que oportunidades elas veem de relação com a UFC? A gente precisa fazer isso. Nos 70 anos, por exemplo, tenho muita vontade de mostrar para as pessoas que o movimento estudantil é uma escola. Estou sugerindo um seminário em que a gente possa reunir diferentes gerações que passaram pelo movimento estudantil e mostrarmos onde essas pessoas estão. A pessoa que foi presidente do centro acadêmico de Agronomia hoje é ministro da Educação. A pessoa que foi diretor de finanças do CA Clóvis Beviláqua é hoje desembargador. O professor que foi presidente do CA de Engenharia Civil é o maior especialista de águas. Professora tal é deputada federal e ex-prefeita de Fortaleza. Fazer um elenco do lugar dessas pessoas que foram líderes no movimento estudantil para mostrar que a universidade é escola em tudo que a gente faz. Eu quero que a gente consiga superar tudo aquilo que nos puxa para baixo. Quero que o curso de nota 3 passe a ser nota 4, que o de nota 4 passe a ser 5, que o curso de nota 3 ou 4 na pós-graduação vire 5, 6 e 7, que é a nota máxima (conceitos da Capes). Não se trata de uma questão de competição, mas de dizer assim: nós podemos, sim, ser internacionais, podemos ter as melhores notas nacionais. Na cultura vamos fazer disrupções grandes.

OP – Começando por onde?

Custódio – Começando pela criação da Pró-Reitoria de Cultura, que vai ser uma das primeiras pautas do conselho universitário. Juntar nesta Pró-Reitoria de Cultura todos os equipamentos culturais da UFC, desde a Casa José de Alencar, a Seara da Ciência, Casa Amarela, museus, teatro, concha acústica, memorial, rádio. Ou seja, fazer articulações e fazer intervenções. Vamos retomar uma ideia, que nasceu lá atrás, de criar o corredor cultural do Benfica, só que agora pensado da Reitoria até a Estação das Artes. E fazer esse percurso ser um equipamento cultural a céu aberto. Aí vamos pensando coisas, desde tirar todo o asfalto e colocar piso intertravado para diferenciar mesmo, tirar faixa de automóvel e colocar como faixa de pedestre, tirar fiação aérea, colocar bancos, atrair restaurantes e bares esse percurso até a Estação das Artes.

OP – O senhor já conversou com o governador Elmano sobre isso?

Custódio – Já, sim. Já conversei com o governador, já conversei com ministro, já conversei com senadora, com Prefeitura. Temos um grupo trabalhando para esse projeto ser apresentado o mais rápido possível. Se a gente puder no ano de 2024 já ter uma parte desse percurso pronta para os 70 anos da UFC...

OP – Mais alguma novidade?

Custódio – A Reitoria da UFC deve se tornar um equipamento cultural. Isso é um projeto urgente, tirar a administração, que pode ser tirada de todo o térreo, e aquilo ser transformado em memorial, em salas de concerto. A concha acústica vai voltar a ser um lugar constante de manifestações culturais. Enfim, a cultura vai ser um atravessamento, vai atravessar a universidade toda. Temos projeto para criar um sistema de mestres e doutores da cultura popular. Identificar quem são os mestres no nosso estado, que nem são letrados, mas são grandes mestres e a universidade reconhece o seu trabalho. Eles podem chegar na universidade com a autoridade que a lei confere e dar aula em qualquer nível, da graduação à pós-graduação. Um mestre da cultura Espedito Seleiro, por exemplo, reconhecido pela universidade, pode, na área dele, atuar. Vou revelar uma coisa que não disse ainda para ninguém. É um projeto que só vai vingar se ele coletivamente florescer. Inicialmente vou levar isso para o Departamento de História para discutir junto com os professores a possibilidade de a gente criar a Casa de Cultura Indígena e a Casa de Cultura Africana. A minha ideia é situá-las no sítio Alagadiço Novo. Com todas as características dessas culturas e onde a gente possa de fato guardar a memória, fazer movimentos, discussões, palestras, aproximar os povos indígenas e os povos afro-brasileiros cada vez mais da universidade.

OP – Seria à semelhança das Casas de Cultura de língua estrangeira, com ensino e aprendizado de línguas?

Custódio – Essa possibilidade existe. Estou chamando de casas de cultura porque as casas de cultura da UFC nasceram como intercâmbios culturais e ficaram muito marcadas como casas de línguas também. Obviamente não se descarta o estudo de línguas, mais no nível de pesquisa de idiomas de indígenas no Ceará, por exemplo. Esse desenho do potencial de uma casa dessas não sei até onde vai, mas a ideia é que a gente instale e mostre que a UFC reconhece e quer ter junto dela todas essas manifestações. Quero que seja uma construção coletiva. Quero discutir com a História e com quem trabalha com a cultura indígena na universidade. Mas a gente precisa de apoio. O primeiro órgão a ser buscado é o Iphan, porque tem uma área do sítio que é tombada, as ruínas do engenho. Apesar de o sítio ser grande, não vamos fazer nada sem parcerias.

OP – Nas áreas de tecnologia e saúde, há algum projeto para destacar?

CustódioEm termos de urbanização, talvez um dos maiores desafios da gestão que quero assumir é retomar a ideia de tornar o Porangabussu um distrito de inovação em saúde. O Porangabussu é um bairro onde temos um campus universitário misturado com o próprio bairro. A gente pode tornar esse bairro um bairro de saúde reconhecidamente, por conta dos equipamentos que já estão lá. O que já está instalado é muita coisa: o complexo hospitalar, Hospital Universitário Walter Cantídio, Maternidade Escola Assis Chateaubriand, Hospital São José, Hemoce, hospital do câncer. Já tem muita coisa e podemos atrair mais. Se for um distrito de saúde, pode atrair mais empresas para a área e ter uma requalificação urbana para aquele espaço. É um projeto sobre o qual eu também já comecei a conversar com o governador. É um projeto que depende da Prefeitura, do Governo do Estado e do Governo Federal, então precisa que a universidade seja articuladora para isso acontecer. Qualifica o bairro, melhora a oferta de serviços, atende a população da melhor forma possível, ajuda a universidade a ser mais universidade naquela área.

Eu, por exemplo, só sou reitor porque me candidatei à Reitoria e só me candidatei porque o presidente Lula ganhou a eleição. Se ele não tivesse ganho a eleição, eu não seria nem candidato.

OP – Como a universidade pode se beneficiar, política e financeiramente, de um alinhamento que há hoje entre Governo do Estado e Governo Federal e com um ministro da Educação que é ex-governador do Estado? Nesse cenário, a UFC pode crescer mais, pode chegar mais recurso?

Custódio – Hoje estava admirado ao saber que a notícia da nomeação do reitor da UFC foi a mais lida no jornal O POVO na quinta, dia 3/8. Fiquei me perguntando por quê. Acho que tem uma expectativa muito alta. Essa expectativa não é só porque estamos voltando a uma normalidade de que o escolhido pela comunidade é de fato aquele que é nomeado, mas porque temos esse cenário que você falou. Ou seja, o fato de o ministro da Educação ser o ex-governador do Ceará e um ex-aluno da UFC também aumenta muito a expectativa sobre o lugar que a universidade vai ocupar nesse período. E acho que é isso mesmo: é um momento que é favorável não por uma questão corporativa, é porque o Brasil está num momento favorável. Eu, por exemplo, só sou reitor porque me candidatei à Reitoria e só me candidatei porque o presidente Lula ganhou a eleição. Se ele não tivesse ganho a eleição, eu não seria nem candidato.

OP – Não teria saído candidato?

Custódio – Não teria. Isso é uma condição. Para mim, o favorável é o cenário nacional de um presidente da República que está chegando para resgatar, realinhar, reconstruir, refazer caminhos, pra dar esperança de novo, inclusive muito fortemente para as universidades e para a educação. Estamos nesse contexto. Além disso, temos um ministro da Educação que é muito próximo, o que dá uma certa liberdade para a gente dizer o que precisa. A expectativa é de que a gente tenha mais recursos, mas mais recurso não significa “plus”. Mais recurso significa recursos suficientes para que a gente execute aquilo que é necessário executar. Que a gente pague sem problema a energia, telefone, todos os contratos de segurança, de limpeza, que a gente compre os livros que os estudantes precisam ter, que os equipamentos dos laboratórios sejam aqueles que a universidade merece ter. Isso é o que a gente quer. Obviamente que vou atrás de caminhos e de recursos para além desses recursos que são os recursos que o Congresso aprova todo ano para as instituições e o governo federal manda. Acho que a gente tem quer ter também, para além das emendas de bancada e individuais. Acho que temos espaço. Temos projetos, nossos pesquisadores têm projetos temos condições de financiar esses projetos por várias vias. Quando penso assim, estou pensando em órgãos do governo, em bancos sociais como BNB, em fundos nacionais e internacionais, públicos ou não públicos, que possam financiar projetos da universidade. Claro, tudo com extrema segurança jurídica, só podemos fazer aquilo que é legalmente permitido. O que não está previsto a gente não pode fazer, mas acho que a gente pode fazer muito do que já está previsto e a gente não faz. Por exemplo, a gente tem dificuldade de receber qualquer tipo de presente ou doação de ex-aluno da UFC, como doar uma biblioteca. Isso não é simples, passa por processos legais e por controles. A gente vai seguir para tornar a universidade a melhor instituição possível que o Ceará pode ter.

OP – Recentemente o governo anunciou um contingenciamento de recursos. O ministro Camilo falou que isso não afetaria ações já previstas. Uma das áreas que estariam no centro do contingenciamento seria a de concessão de bolsas. Isso de alguma pode afetar a universidade?

Custódio – Contingenciamento afeta a universidade porque estamos em tempo de falta de recursos. Se a gente ainda não tem recursos suficientes pra dar conta, e o que está vindo ainda está sendo contingenciado, vai fazer falta. Por exemplo, se a gente não tiver recurso suplementar, a gente não fecha o ano de 2023. A gente não tem dinheiro em caixa para terminar o ano em relação a custeio, que é pagamento de contratos e tudo mais. A gente não tem dinheiro suficiente para pagar todas as bolsas até o final do ano. Estou tranquilo porque imagino que essa é uma situação geral das universidades e que o Ministério da Educação vai resolver. O contingenciamento está condicionado à aprovação da nova regra de gastos. Dependendo do que for aprovado, todo esse contingenciamento cai até o final do ano. Foi dito que foi um ato preventivo, pra não liberar ainda, esperando essa aprovação. Minha expectativa é que não tenha, mesmo porque vamos precisar de mais.

OP – Tem alguma estimativa de quanto seria o valor suplementar necessário?

Custódio – Pelo menos R$ 30 milhões pra fechar o ano.

OP – O senhor é graduado em Filosofia e Computação, com mestrado em Sociologia e doutorado em Filosofia. Uma trajetória que contempla muitas áreas. Como essa formação vai ajudar agora no exercício da função de reitor?

Custódio – Sempre me dei conta de que fui muito ajudado nessa formação para transitar bem na universidade. Eu transito bem em ciências porque fui aluno de Ciências da Computação e no centro de humanidades porque sou da Filosofia e da Sociologia. As pessoas me reconhecem como capaz de transitar nesses ambientes. Esse é o primeiro ganho. O segundo é ter uma clareza da importância de todas essas áreas para a universidade. Há quem defenda que a universidade deva ser uma instituição só tecnológica. Há quem defenda que as humanidades são a base. Eu defendo que a universidade seja tudo isso junto.

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