Aos 66 anos, o olhar para trás e dizer que "faria tudo de novo" é como Assis Cavalcante enxerga os passos que deu até chegar ao hoje.
Fundador da marca cearense Óticas Visão pode até parecer que foi ontem que ele criou a rede de óticas no Ceará.
Quem dera! Assis era um menino, vindo de um lugarejo pequeno, Serrote do Marinheiro, próximo a Maranguape, e virou cria de Itapebussu.
Essa criança, que ainda existe dentro de si, agora se considera numa das melhores fases da vida: chegou à Presidência da Câmara de Dirigentes Lojistas de Fortaleza (CDL) e é um dos cabeças, por mais de uma década, daquele evento com cores, coral de crianças, e o Papai Noel com chapéu de couro, no miolo do Centro de Fortaleza, o Natal de Luz.
Do passado, conta que é o segundo filho de uma família de cinco irmãos: dois homens, Deuzimar e Francisco de Assis, e três mulheres, Luzimar, Elzimar (in memorian) e Laismar.
Ainda pequeno, viajava na carroceria do tio que fazia frete misto - de pessoas e objetos - rumo a Fortaleza, e sonhava acordado com seus futuros negócios no ramo da criação de animais.
Brincalhão e espirituoso, como diz a família, faz piadas de todas as circunstâncias que presenciou na vida e sobre si.
Quis ser padre, mas o destino o obrigou a um emprego ainda aos 12 anos, já na área que o tornaria um empresário de sucesso. Mas, no começo, quebrava quase tudo que tocava. Mesmo assim, descobriu a vocação de servir ao próximo.
Boa parte dessas histórias vira crônicas e contos na cabeça e passa das mãos de Assis para o papel.
A família conta que ele se autodiagnosticou com Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), o que, possívelmente, justifica o fato de não parar. Ou, como mesmo disse: "Sou afoito".
Já o amor apareceu ainda na adolescência e segue firme há 50 anos. É com a amada Edna que divide todos os momentos bons e dicífeis e até algumas divergências, mas aprendeu e passa para os filhos que os problemas se resolvem durante o dia.
Casou-se aos 19 anos e a esposa aos 17. Descobriram juntos a fórmula própria para se tornarem um só.
Na profissão foi de contínuo a vendedor de óculos e pensou em montar uma empresa de redes. Mas o destino deu uma mãozinha e conseguiu emplacar, em 1974, a primeira loja Óticas Visão no Centro de Fortaleza, outra das suas paixões.
Assis recorda-se que, além da mãe, Dona Miramar, o sogro, Sales Cunha, o ensinou muitas coisas. Como a arte da venda. E ele, por consequência, passou para os filhos - Assis Júnior e Eduardo - que estão nos negócios e para André e Renata, que optaram pela Medicina.
Como os netos ainda são menores, a família ainda não sabe se a terceira geração seguirá na linha comercial dos Cavalcantes. A decisão ficará a cargo dos próprios filhos.
Além de falar sobre família, amor e profissões, o fundador da Óticas Visão discursa sobre a importância do Centro para o comércio do Ceará, o ativismo de classe e o Natal de Luz. Confira a entrevista exclusiva concedida ao O POVO.
O POVO - Por que o senhor não levou adiante a vontade de ser padre?
Assis - Eu tinha que trabalhar e padre não ganhava dinheiro. Se eu fosse para o seminário, quem ia prover a família lá de casa? Mas a religiosidade permanece até hoje.
E depois que eu fiz o encontro de casais com Cristo, eu percebi que para servir não preciso usar batina.
O POVO – Onde foi o primeiro emprego e as outras experiências?
Assis - Comecei a trabalhar na Ótica Rocha como contínuo, depois com seis meses eu saí para a Ótica Brasil e lá foi bom que eu cheguei com 12 anos dizendo que tinha experiência de vendedor (risos). Já comecei contista. (risos)
Fiquei na porta da loja e o seu Brasil, que era meu patrão, me deu uma bandeja de relógios sem pulseira da marca Megalo para eu vender mais barato, mas era uma dificuldade. Passei uma semana na porta da loja e não vendi nenhum.
Ele chegou para mim e disse: 'Para venda você não dá não, mas para contínuo tenho uma vaga'. Respondi que já estou querendo.
O POVO – O salário dava para ajudar nas despesas de casa?
Assis - Naquela época o menor de idade podia trabalhar e ganhava meio salário. Eu me lembro que recebia quatro pagamentos semanais de 50 na moeda de então (Cruzeiro).
Pegava esse dinheiro e ia andando pela rua Liberato Barroso até o Mercantil São José para fazer as compras para levar para casa.
Eu me lembro bem que um dia eu ia com o dinheiro no bolso da calça e, chegando à rua General Sampaio, eu pensei: "Se eu perdesse esse dinheiro, o que é que a gente ia comer lá em casa?".
Aí, de repente, um cara bateu em mim e disse que o dinheiro estava caindo.
O POVO – Voltando a parte profissional, como construiu a carreira após passar de contínuo a vendedor e gerente?
Assis – De contínuo eu fui para o laboratório na Ótica Brasil. Lá era lente de cristal e eu quebrava tudo.
Meu patrão chegou e disse que eu dava prejuízo, que ia voltar a ser contínuo de novo, aceitei, pois não queria perder o emprego. Mas pensei que só tinha dois caminhos para eu crescer, que seria as vendas ou o laboratório.
Fui para as vendas aos 15 anos, mais ou menos. Era legal, ambiente de festa, clientes chegando e fazia amizade muito fácil.
Depois de um ano e meio, eu já com meus 16 anos, assumi a Gerência de uma loja. Me deram confiança, eu ficava com a chave do cofre.
O POVO – O que mais gostava nessa parte de vender?
Assis - O povo, os clientes, as mercadorias para expor, conversar para mostrar e tal. Minha gerente era crente e quando chegavam as freiras e os padres eu atendia e dava desconto demais e ela avisou que ia descontar do meu salário.
Eu gostava desse ambiente de loja, de perceber como era que o outro vendedor estava atendendo para eu fazer igual.
O POVO – Na sequência abriu sua primeira loja, correto?
Assis - Quando eu saí para botar a minha loja, o seu Brasil disse que 'dinheiro não', mas o que eu precisasse de indicação e de mercadoria, poderia contar com ele. Isso me deu uma segurança muito grande, uma força.
Nessa época eu já namorava há mais de um ano com a Edna. À época eu tinha 15 e ela 13, e falei que queria botar um negócio de redes e meu sogro Sales trabalhava com isso.
Em uma conversa, ele sugeriu uma ótica pelo meu conhecimento e disse que seria meu sócio. Era o que queria. Peguei meu dinheiro do FGTS, fui emancipado e me associei a ele. Eu com 17 e ele 55 anos.
Viajamos muito e, depois de alguns meses, ele disse que não aguentava meu ritmo e que sairia da sociedade para cuidar dos negócios dele. A Edna já trabalhava com o pai.
A conversa foi em um sábado. Aproveitei e pedi a mão da Edna em casamento (risos). Ele disse: 'Mas eu já te dei uma loja, te fiz gente, e agora quer carregar minha filha?'. (risos)
E liberou após consultar a esposa e a própria Edna. Como ela era menor de idade, meu pai ficou sendo meu sócio um tempo e depois a Edna entrou na empresa.
O POVO – Como as características maternas e paternas influenciaram na sua vida?
Assis - Minha mãe, Maria Miramar Cavalcante ou simplesmente, Dona Miramar, era mais cautelosa, mais professora e tal. Ela foi professora, mas não ensinava mais e cuidava da casa. Ela queria que a gente estudasse, a preocupação dela era essa. 'Você está em Fortaleza e tem que estudar para ser doutor', ela queria muito.
Em casa, meu avô materno era o grande exemplo e tem um caso que mostra os nossos princípios de forma emblemática. O nome dele era Chiquinho de Souza e ele trabalhava fazendo açudes e, uma vez, chegou em casa e disse para minha avó:
'Minosa, eu vi um cordão de ouro no chão na rua do Ouvidor'. Ela respondeu: 'Você pegou o cordão de ouro?'. E ele disse: 'Não, porque não era meu'. Os princípios de ética e moral eram passados dessa forma de contações.
O POVO – Sua mãe também era bem religiosa?
Assis – Sim. Ela gostava muito que eu lesse a Bíblia para ela, mas eu era astigmata, não sabia e não usava óculos, e eu pulava uma vírgula ela dizia: 'Opa! Tem uma vírgula aí'. Ela pedia para eu ler para saber como estava minha leitura.
O POVO – E as lembranças com seu pai Antônio Costa Cavalcante?
Assis – Ele era conhecido como Antônio Mineiro. Era mecânico de automóveis autodidata, trabalhava um expediente na Secretaria de Educação e no outro ele ficava em casa para fazer serviços de automóveis pela vizinhança.
Àquela época ele consertava as peças e não os carros. Mas a mamãe dizia para ele que ele era doutor em carro. Ele era muito engraçado e essa minha veia eu tenho muito dele.
O POVO – A palavra doutor tem um forte significado em sua família...
Assis – Muito. Mamãe queria que todo mundo fosse doutor lá em casa. Eu me formei em Direito, assim como um outro irmão que é policial federal e uma outra irmã. Já Maninha fez enfermagem e a que mora em Quixadá não se formou, pois se casou logo e começou como comerciante.
Isso ficou marcado, pois quando eu fui fazer uma faculdade, procurei uma para me chamarem de doutor. Depois que eu terminei o curso, botei o anel e decidi que não ia usá-lo e que não queria que me chamassem de doutor, só Assis.
O POVO – O senhor se casou com 19 anos e dona Edna com 17. Como foi esse começo?
Assis – Até você conseguir ser um só é muito difícil. Ela tinha uma criação e eu outra, bem diferente da dela.
Tivemos alguns desentendimentos e até sermos um levou muito tempo. Mas tínhamos um propósito: vamos brigar durante o dia, mas à noite tem que estar tudo resolvido. Temos que dormir bem.
Isso trazemos até hoje. Outra coisa, a palavra separação tiramos do vocabulário, isso não existe. E foi muito bom isso.
Depois vieram os meninos, buscamos que eles estudassem. Primeiro veio o Júnior, depois o Eduardo, o André Luiz e a Renata.
O POVO – E o que ensinaram a eles?
Assis – Sempre os princípios do comércio, como é que faz, como é que vende. Como ganha o respeito do consumidor.
O POVO - Como conciliou os estudos e o trabalho?
Assis - A faculdade foi difícil, pois ao mesmo tempo que cursava, viajava para o Maranhão e Piauí para vender óculos. Mas foi uma fase importante, fiz quando os meninos eram pequenos.
Lembro que ficávamos todos na sala, em uma casa na Vila Betânia (bairro Parangaba), que tinham duas enciclopédias, a Mirador e a Barsa.
Todos estudávamos juntos. À época a Edna fazia Economia Doméstica, depois ela fez Direito. O hábito de estudar e ser doutor permanece até hoje na família.
O POVO – No que o comércio e o Direito se complementam?
Assis – O Direito sempre foi muito bom para mim e ainda hoje é. Do ponto de vista do conhecimento, de conhecer o direito meu e do outro, de ter advogado conhecido. Porque o advogado é uma caixa de ressonância da sociedade.
Tudo que acontece na sociedade o advogado tem legitimidade para ouvir, participar e tal.
A Edna também foi fazer Direito e me ajudou muito. No primeiro momento, eu trabalhei de 1988 até 1996 na área criminal.
Mas trabalhar soltando bandido, essas coisas... Passei oito anos com isso, fazendo júri, ao mesmo tempo com as lojas e elas não cresceram muito nesse período. Em razão disso, pensei: "Rapaz, não vou trabalhar mais com bandido, não."
O POVO - E foi para qual área?
Assis - Fui trabalhar lá na vara de família. Aí foi muito bom, porque eu recebia as pessoas com a Edna e os casais ficavam muito seguros. Eu fazia a petição e a Edna fazia a correção gramatical do conteúdo e eu ia para as audiências.
Ela não gostava de fazer audiência. Com as brigas dos casais, parti para outra área no Direito, de inventário, usucapião e arrolamento.
Quando foi em 2011, que nós botamos a loja 12, aquela bem emblemática da Praça do Ferreira (Centro de Fortaleza), eu chamei meus clientes do Direito e comuniquei que ia me afastar. Foi bom enquanto durou.
Mas fiquei com um relacionamento, com os amigos do Poder Judiciário e até hoje é muito bom.
Meu sogro me ensinou uma coisa que ensino para meus filhos: quem tem porta aberta não briga. No Direito ou no comércio temos que ter um relacionamento muito bom.
Filhos: Assis, Eduardo, André e Edla
Netos: Maria Eduarda, Abner, João Gabriel e Isaac
O POVO - Como foi a entrada dos dois filhos mais velhos nos negócios?
Assis - Eles foram cursar Administração. Aí eu entendi que quem está fazendo quer estar dentro da empresa, para aprender o que é administração, no caso o Júnior e o Eduardo.
Os outros dois são médicos. Mas antes disso, nas férias eles iam trabalhar lá para pegar a mão.
E oficialmente quando passaram no vestibular já entraram nas lojas para trabalhar. O Júnior no começo ia, depois faltava, aí eu rendia ele até um dia que falei para ele buscar outra coisa para fazer e sair da empresa e voltar quando estivesse mais preparado.
Eu o demiti. Ele foi para o Sebrae e depois para um banco. Ele voltou depois de quatro ou cinco anos. Já o Eduardo sempre foi muito ligado na parte comercial e começou como vendedor mesmo das lojas. Eu dava toques e ensinava a vender.
O Júnior era financeiro como a Edna. Em 2004 decidimos dar uma loja para cada um e eles começaram a se desenvolver. Hoje as esposas trabalham com eles. Quem é mais afoito tem mais lojas. Eu sou, mas tenho muitos outros afazeres, como a CDL.
Edna tem um feeling muito bom para compra de mercadorias e aberturas de lojas.
O POVO – Indo para sua área comercial, como analisa o mercado de óticas nos últimos anos?
Assis – O segmento de ótica está passando por grandes transformações, no que diz respeito à tecnologia empregada na fabricação de lentes.
Muitas pessoas não despertaram para isso ainda, a tecnologia que se trabalhava ou alguns ainda trabalham, não traz na lente a qualidade da exatidão do grau, ele é aproximado.
Esse novo tipo que nós já temos vem de um laboratório alemão e tem a grande vantagem que é a exatidão da prescrição do médico.
Isso dá uma qualidade muito grande ao consumidor e vem sendo empregada no mundo todo.
O que se usa ainda no Brasil parte do mundo já não usa mais, está antiquado. O ramo sai de uma maneira bem arcaica para a tecnologia como todo os demais segmentos.
O POVO – A gestão mudou também...
Assis – A gestão hoje tem que estar toda sistematizada e de forma tecnológica. É por exemplo, para você ter a vida do seu consumidor já quando ele entrar na loja.
Você já sabe o que foi que ele fez na última compra e em quantas vezes pagou, qual o cartão dele....
Enfim, isso é muito importante para o consultor/vendedor não perder muito tempo nessa parte da venda que se chama sondagem.
Outro ponto que precisamos é conhecer o poder de compra dele, o relacionamento ainda é o grande diferencial dentro do nosso segmento, que é de venda conduzida.
É o que, como, quanto ele quer comprar. Cada vez mais no mundo inteiro isso é explorado e é bem disseminado dentro do segmento de ótica.
O POVO - Quais os pontos de atenção do setor óptico?
Assis - O que nos preocupa muito é a questão do contrabando, é da regulamentação, porque nós temos um decreto de 1934, do Getúlio Vargas, que regulamenta o segmento de ótica, mas é muito desrespeitado e os órgãos que deveriam fiscalizar não fiscalizam.
Você encontra gente vendendo óculos porta a porta sem ter um laboratório credenciado, sem ter um ótico responsável e sem ter coisa nenhuma.
Isso tem contribuído muito para que as grandes lojas fiquem em dificuldades, porque é uma concorrência desleal. Foge dos padrões técnicos e sem pagar impostos. No mundo todo está acontecendo isso, mas nós temos que tomar uma providência.
O POVO - O mercado está aquecido?
Assis - O segmento cresceu muito porque, hoje, ele disputa com as lentes de contato e disputa também com a cirurgia refrativa. Então os materiais estão sendo explorados e sendo criados, buscando lentes mais leves e mais finas.
E lá na empresa nós mesmo fizemos um sistema chamado Master, em que eu consigo deixar de 20% a 25% mais fino do que eu deixei da última vez, porque todo o consumidor quer ter um óculos fino.
O POVO - E questão da taxação das vendas online como interfere?
Assis - Essa questão da taxação apenas a partir de U$ 50 tem prejudicado o varejo como um todo. O setor de roupas, por exemplo, está com muita dificuldades. Isso resulta em perda do varejo e como consequência o fechamento da indústria brasileira.
A venda no varejo para o Natal, por exemplo, começa a aquecer depois do dia 15 de dezembro, porque se comprar nesses canais você não recebe a tempo das festas. Estamos sentindo muito com a Black Friday e nessas datas.
Porque concorremos com quem não paga imposto. Isso é uma falta de bom senso, porque o governo precisa arrecadar imposto para devolver em saúde e segurança, mas permite que essa situação aconteça que alguém traga de outro país em detrimento do Brasil e sem pagar imposto.
Se nós não pagássemos imposto sobre vendas abaixo de R$ 250 seríamos massacrados. É uma competição injusta e o governo precisa corrigir isso rapidamente.
O POVO - Entraram no setor de franquias. Como estão os negócios da família, atualmente?
Assis - Temos 28 lojas, sendo 26 Óticas Visão e duas Visione, além do laboratório. Em 2005 tivemos uma grande divisão, somos quatro na operação - eu, Edna, Assis Júnior e Eduardo, cada um ficou com uma loja e o laboratório sempre foi meu, ou seja, eu presto serviços para eles.
O Eduardo e a Edna têm 10 lojas cada, o Assis cinco, eu três. As da Edna eu sou sócio dela em três e dos filhos em uma com cada um. Elas são em sistema de franchising (franquias).
Temos no portfólio relógios, lentes e óculos esportivos. Porém o forte mesmo são os óculos de grau com lente, que é nosso carro-chefe e chega a representar entre 70% e 75% do total da empresa.
O POVO - Qual a estrutura do laboratório?
Assis - Em outubro de 2022 compramos o equipamento alemão, chegou em março de 2023 e em maio os alemães vieram instalar e treinar a equipe. Desde junho do ano passado já estamos confeccionando lentes.
Essa nova tecnologia leva em consideração para fazer um óculos como a pessoa anda, de cabeça baixa ou erguida, a idade da pessoa, a ocupação laboral e o grau que o médico passou.
Todas as informações a gente coloca no sistema, que manda para a Alemanha e volta trazendo a topografia da lente para aquela pessoa. Aí trabalhamos na parte interna da lente, ao contrário do que o mercado faz, o que dá uma melhor qualidade visual para o cliente.
Nós damos garantia na adaptação, se o cliente não se adaptar eu devolvo o dinheiro para ele. Até agora não devolvi dinheiro para ninguém (entrevista feita em dezembro de 2023).
O POVO - Como fecharam 2023?
Assis - 2023 foi um ano do talento. Isto é, foi o ano em que o empresário foi mais explorado, foi mais requisitado para demonstrar o seu talento. Seu talento com relação a treinamento da equipe, para negociação com distribuidores e fornecedores.
E entender a jornada do consumidor no que diz respeito a plano de pagamento, produtos novos, com preço mais competitivos.
Mesmo assim, conseguimos fechar com 8% do valor real e isso é acima da média do mercado. O laboratório nos deu um diferencial muito grande.
O POVO - O que pretendem para este ano?
Assis - A grande expectativa para 2024 diz respeito à questão da taxa de juros. Quando as taxas de juros estão altas, a gente pega os projetos de expansão e guarda na gaveta, até novos horizontes.
Mas abertura de lojas é sempre oportunidade. Será o ano da consolidação das franquias.
Algumas lojas Visão serão transformadas em Visione e repassadas para o modelo de franquias. O foco será em Fortaleza. Até temos um projeto para ir para Teresina, mas ele está em stand by.
Em 2024, como a (taxa) Selic vem caindo, a gente tem a expectativa de que esses juros baixem. Os juros baixando, a gente abre mais negócios. Abrindo mais negócios, abre-se postos de vendas. E dá mais emprego.
E esse empregado que eu coloco na minha loja, ele consome mais, eu aumento o poder de consumo dele.
O POVO - Quais outras questões também serão importantes em 2024?
Assis - Outra expectativa é quanto à reforma tributária. Fizeram a reforma, mas deixaram a regulamentação para a lei complementar e ninguém sabe o que é que vem, como serão cobrados, quais são as alíquotas, os impostos e tudo mais.
Então isso é uma grande incógnita para 2024. Outro ponto importante é que é um ano de política. Quer queira, quer não, o mundo passa pela política. E aí essa instabilidade, esse dualismo entre B e C, esse radicalismo atrapalha os negócios.
Para ter ideia, hoje existe um negócio muito esquisito: se o lojista disser que é eleitor ou apoiador do fulano, uma série de consumidores deixa de comprar na loja daquela pessoa. É interessante salientar que nós fazemos parte da sociedade, nós somos sociedade e nós temos também o nosso direito de escolha.
O POVO - Em relação ao Centro, o senhor sempre teve uma participação ativa...
Assis - O Centro de Fortaleza é o maior centro comercial do Ceará e ele passou por grandes transformações. Ele já teve o seu ápice e depois veio o plano, o Plano Real. Antes disso, durante muito tempo nós ganhamos dinheiro não vendendo produto, mas aplicando no overnight.
A inflação era tão alta que você comprava a mercadoria por R$ 100, em três vezes, vendia por R$ 80 e aplicava, dava para pagar aquela mercadoria, a folha de pagamento e o aluguel da loja. Como a chegada do Plano Real, tinha que ganhar dinheiro vendendo produto e muita gente não se adaptou e fechou.
Depois vieram os centros comerciais dos bairros. O Iguatemi, o North Shopping e isso diminuiu um pouco o potencial de venda do Centro.
Contudo, até antes da pandemia nós tínhamos em torno de 350 mil pessoas por dia andando no Centro. Isso caiu substancialmente e hoje é em torno de 190 mil, sendo que 64 mil trabalham e 28 mil moram.
O POVO - Como avalia que é possível uma solução para esse espaço?
Assis - O poder público tem que nos ajudar, ele tem que colaborar. O Centro foi muito esvaziado, tiraram o Fórum, a Câmara Municipal, a Assembleia Legislativa. Tudo isso esvaziou o Centro.
O Roberto Cláudio (PDT) chegou a fazer um bom trabalho quando estava na Prefeitura (ficou dois mandatos, de 2013 a 2020) e diminuiu os moradores da Praça do Ferreira, mas com a pandemia eles voltaram.
E o grande problema da Praça do Ferreira em si é a distribuição de alimentos.
Não é que, em um Estado pobre como o nosso, sejamos contra a doação de alimento. É que um alimento ele deve ser distribuído no local certo, no canto certo. Ali não é local.
São alimentos que ninguém sabe da onde vem e como são manipulados, ninguém sabe de nada.
Aí as pessoas ficam ali. Tem muita droga também. A gente não vê uma solução. Agora o Tasso Jereissati (PSDB) conseguiu uma emenda parlamentar e trouxe uma verba que está na Prefeitura. O prefeito Sarto (PDT) nos chamou e disse que tem o projeto arquitetônico para executar de reforma da praça.
Assim chamamos o arquiteto Fausto Nilo e equipe e o projeto está em finalização e terá uma linda iluminação. Estamos pleiteando a mesma equipe que fez a Beira Mar.
O dinheiro para pagar os arquitetos eu consegui parte com o Governo do Estado e parte com Ivens Dias Branco da Fábrica Fortaleza. A expectativa é que até outubro (de 2024) nós tenhamos uma praça nova.
O POVO - Da onde vem esse amor pelo Centro?
Assis - Comecei a trabalhar no Centro e aí eu me acostumei com ele. Já tive proposta de sair com o laboratório e a holding de lá para Aldeota, temos um terreno lá, mas os meninos são sempre contra, por conta da nossa raiz. Eu também concordo com eles e nós estamos no Centro.
O POVO - Qual a sua motivação para participação de entidades de classes, como a CDL Fortaleza?
Assis - Quando eu me propus a trabalhar, eu busquei sempre bem comum. Quando eu fui ser comerciante eu procurei sempre vender produtos com dignidade, honestidade e buscando fornecer o bem para o meu consumidor.
Depois quando fui ser advogado isso foi muito presente. Porque o advogado é uma caixa dessa nossa sociedade. E quando eu vi que eu já tinha um número de lojas suficientes que dava para eu sobreviver, eu fui convocado para a CDL.
Coincidentemente, neste momento eu percebi que eu poderia contribuir com inteligência e com a minha força para que outras pessoas que saíram de onde eu saí se destacassem dentro do princípio da honestidade e do trabalho digno.
Na CDL é exatamente isso que eu faço. Eu procuro agregar e somar e graças a Deus eu tenho uma facilidade muito grande de me relacionar. É um dom, acredito nisso. Eu consigo trafegar pelos campos políticos. Como um líder classista eu não posso me indispor contra o poder público.
A CDL é uma instituição associativista, ela não recebe dinheiro público, ela vive de vender SPC e da contribuição dos associados e tem todas as matizes políticas. Então na hora que eu me posicionar a favor de um, estarei contra o outro. Por isso tenho cautela.
O POVO - O senhor pensa em cargo político?
Assis - Já fui convidado algumas vezes para a disputa eleitoral, a mais recente foi para deputado estadual, mas quando eu recebi o convite eu fiz um almoço na minha casa e falei com meus filhos.
Eles acharam que não está no tempo. Quem sabe o que é bom para si é você mesmo, eu apenas peguei a opinião deles, fiz uma avaliação e achei que realmente não era o momento pra projeto político.
Ainda quero tempo para usufruir o que conquistei, pois estou com 66 anos e sairei da CDL com 68 anos. Nos planos, uma imobiliária que está iniciando para garantir o futuro.
O POVO - O senhor começou a se despedir do Natal de Luz após mais de 10 anos. O que ele significa?
Assis - O Natal, como eu digo, ele é parte de mim. Quando cheguei à CDL eu sempre via o Pio (Rodrigues - da C. Rolim Engenharia) falando do Natal, Natal... Eu comecei a gostar do Natal. Isso era mais ou menos 2011/2012.
Quando eu coloquei a loja embaixo do hotel onde as crianças se apresentam, o Pio começou a me procurar e querer minhas opiniões.
Ele já estava há 17 anos no projeto, que ele adora e fazia com o Paulo Albuquerque, que era o produtor executivo, equipe muito boa com a Pedrina de Deus.
E me convidou para fazer um ano com eles e depois ele sairia e eu ficaria só com a equipe. Isso era 2012, quando fizemos juntos.
Assumi a partir de 2013, com um ano perdemos o Paulo e assumi o papel dele e dois anos depois a Pedrina também faleceu. Fiquei só, mas sempre gostei muito. É um trabalho que a gente começa no dia 6 de janeiro e termina no dia 6 de janeiro do outro ano.
São mais de 1.100 pessoas da parte técnica e artistas. Fazemos tudo com muito cuidado de segurança para os profissionais e para as crianças. Todos são remunerados.
É um movimento muito grande. Ainda preciso me acostumar com a ideia de passar o bastão. Esse ano ainda participo e 2025 já não estarei mais.
O POVO - Qual o legado que as Óticas Visão traz para a economia cearense?
Assis - Primeiro acredito que seja do ponto de vista de capacitação das pessoas que passaram pela empresa ou que estão na empresa hoje.
Eles são conhecidos no mercado como "filhos de Assis" e conseguem facilmente trabalho em outras óticas quando tem nossa empresa no currículo. Eles têm aula de português, porque ajuda na argumentação e a conhecer os produtos.
Muitos que passaram já estão com suas lojas, outros trabalham em laboratórios e alguns até no Japão. São meninos que eu trouxe do interior, de Pacoti, onde tenho um sítio.
E para os meus filhos deixo um legado de respeito ao consumidor e a obrigação de serem honestos e trabalhadores.
Por terem recebido estudo, serem também patrocinadores de emprego e renda. E na sociedade deixo a segurança de que vão receber o que compraram e de um produto de tecnologia.
As gravações desse episódio foram realizadas em dezembro de 2023, período que o comércio de Fortaleza recebe muitos consumidores. O trajeto foi entre a casa do senhor Assis e a loja no Centro.Vendo um bloqueio na rua, Assis para o responsável pela Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC) que prontamente atendeu. "Graças a Deus tenho contato livre com a AMC, o governador e o prefeito. Se eles não me atendem na hora, retornam minha ligação", comemorou.
Parte da gravação foi na residência do senhor Assis. Após tudo pronto, o empresário, a esposa Edna, os filhos mais velhos Assis Júnior e Eduardo, e suas respectivas esposas, Rechelia e Elayne, dão as mãos e iniciam uma oração antes do café da manhã. O ritual faz parte do dia a dia da família.
Ao longo do dia e das gravações, contei com o apoio da jornalista Eugênia Medeiros, que assessora a parte de comunicação do senhor Assis Cavalcante na Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Fortaleza.
Esta entrevista exclusiva com o fundador das Óticas Visão, Assis Cavalcante, para O POVO inicia a terceira temporada do projeto Legados: A tradição familiar como pilar dos negócios.
Serão seis entrevistas com grandes empresários para contar a base que sustenta seus princípios, valores e tradições familiares que estão sendo passados para as novas gerações. E, ainda, o legado empresarial para o Ceará.
No próximo episódio, conheça a história da Lanlink pelo olhar de um dos fundadores, Charles Boris, e da família Boris.
Uma série de entrevistas especiais com grandes empresários que deixam legados para a sociedade e a economia do Ceará