A história de um ritmo musical muito se confundiu com a trajetória de José Alexandre da Silva Filho nas últimas décadas. Regionais e presentes no Interior, ambos ganharam espaço com seu jeito próprio de se mostrar para o mundo. Acompanhando a revolução digital, superaram preconceitos para se tornarem figurinhas carimbadas nas listas dos principais sucessos da música atual. Xand Avião e o forró caminham de mãos dadas, pelo Brasil e por diferentes países, há 20 anos em uma parceria que se apresenta para lá de acertada.
Nascido em Itaú, no Rio Grande do Norte, mudou-se para Fortaleza em 2002 com intuito único de lutar pelo sustento da família por meio do seu ofício. Chegou ao Ceará com a promessa de fazer acontecer o Aviões do Forró, banda que sequer existia ainda, mas que logo extrapolou as barreiras do Nordeste, se tornando a maior de forró do Brasil, com músicas emplacadas em novelas e com turnês realizadas nos Estados Unidos e na Europa.
"Eu nunca imaginava chegar nem a 5 anos de carreira"
Hoje chamado no meio musical e pelos milhares de fãs de “comandante”, sendo responsável por lotar festas em todos os estados brasileiros, Xand escolheu pela música como projeto de vida ainda na década de 1980, aos 6 anos de idade.
Na época, sua família morava em Exu, Pernambuco, a mesma cidade de nada mais nada menos do que Luiz Gonzaga. Já aposentado dos shows e parcialmente cego, aquele que carrega o posto de “rei do Baião” continuava sendo acompanhado por diversos admiradores, como o ‘Seu’ José Alexandre, pai de Xand.
“Meu pai é e sempre foi fã, alucinado por Luiz Gonzaga. Todo domingo era sagrado, todo mundo de Exu ia para casa dele (Luiz Gonzaga) e ficava na calçada para ouvir ele tocar sanfona e cantar. Esse era o programa do meu pai. Dava 9 horas, pegava na minha mão e me levava. Quando eu vi Luiz Gonzaga tocar e cantar, fiquei maravilhado e pensei: quero trabalhar com música”, contou o comandante ao podcast Podpah, em janeiro de 2020.
O sonho de criança se realizou anos depois com maestria. A percepção de que havia “estourado” veio logo nos primeiros meses de Aviões do Forró. Em um show realizado em Fortaleza, numa sexta-feira no finalzinho de 2002, algo inédito aconteceu quando o solo da sanfona começou a entoar a música "Coração", de Dorgival Dantas, cantada por Xand.
“Eu senti um negócio diferente que eu nunca tinha sentido. Quando comecei a cantar, não ouvi a minha voz, pensei que o som tinha parado. Eu procurava a minha voz e não achava. Cantava mais alto e não achava, só ouvia a voz do povo. Na segunda música cantaram ainda mais alto e invadiram o palco. Aí eu falei: ‘agora eu acho que estourou'. Foi aí que viramos artistas, foi quando virou a chave”, sinaliza, sempre pontuando a parceria com Solange Almeida: “Ela faz parte desse sucesso”.
A dupla Xand e Sol rodou o mundo com uma pegada única de um forró mais atualizado, que agora exigia maior e melhor estrutura de banda e de apresentação. Contando com nova musicalidade, ousando uma mistura de diferentes ritmos, eles foram além do instrumentos tradicionais para colher frutos como contratos, premiações e músicas em novelas.
A parceria com Sol durou até o final de 2016 e a banda encerrou suas atividades em 2018. Nesse meio tempo, Solange chegou a entrar com um processo contra o grupo detentor do Aviões do Forró, a A3 Entretenimento, cobrando uma dívida de R$ 5 milhões. Simultaneamente, outra polêmica envolvendo a A3 ganhou destaque: uma dívida de R$ 292 milhões em impostos e outros encargos sonegados à União.
Xand seguiu produzindo suas músicas, carregando inevitavelmente o sobrenome “Avião”. Nesse instante subindo aos palcos sozinho, também se viu em um cenário diferente em que seria necessário lidar com as plataformas digitais para não virar um cantor “das antigas”.
“Mudou muito”, diz ele sobre o modo de produzir. “Até o jeito de ouvir música mudou. O pessoal quer que seja música com pouca letra e com o refrão cantado", assinala. Sua ideia não é “cair totalmente” no modo de produção exigido pelas plataformas, com músicas com dancinhas. “Mas tem que ter um pé lá”.
E esse “pé” tem rendido números extraordinários atualmente. São mais de 2 bilhões de visualizações no YouTube e 6 milhões de ouvintes mensais no Spotify. Ambicioso, Xand diz querer sempre estar mais: “Pelo menos com uma música no top 50 do Brasil.”
Atualmente dividindo as funções de empresário com os shows, Xand Avião compartilha da sua experiência com jovens artistas que estão começando. Nattan, João Gomes, Vitor Fernandes, Tarcísio do Acordeon e Zé Vaqueiro são alguns dos nomes de sua maior proximidade e com quem divide palco no Viiixe, festival de forró e piseiro, realizado a partir deste ano em diferentes capitais brasileiras.
O que chama a atenção de quem acompanha o cenário forrozeiro de maneira mais próxima é que esses artistas compartilham entre si, além de ritmos e características próprias em cima do palco, uma aparente união mostrada nas redes sociais, o que acaba impulsionando uns aos outros. O que era “comum” antigamente era uma tendência justamente oposta, a de quase rivalidade entre os principais forrozeiros do cenário.
“Era meio que um folclore”, ameniza Xand sobre supostas brigas entre ele e outros cantores como Wesley Safadão, então da banda Garota Safada, e Raí, da banda Saia Rodada. “A gente perdeu muito tempo nessa briga imaginária", diz, evidenciando que o sucesso que o forró obtém hoje em dia, sempre figurando com músicas em destaque nacionalmente, vem da união dos artistas.
Se o forró conquistou status de relevância no cenário atual, muito se deve também à superação de muitos obstáculos no passado, quando o ritmo ainda estava distante do imaginário e da realidade dos brasileiros. “Sempre que chegava em um canto o pessoal falava ‘ah, é forró…’ e ficava meio que com um pouco de preconceito”, relembra Xand Avião no começo da carreira.
“Na cabeça de algumas pessoas, o forró era só o triângulo, a zabumba e a sanfona. Mas o forró mudou muito e hoje tem estruturas como qualquer música no mundo”, pontua, mencionando também que as parcerias com cantores de outros ritmos ajudaram a espalhar a musicalidade forrozeira mundo afora.
"Eu sou cantor de forró, compositor criado no meio do forró, sou forrozeiro. Mas eu sou um cantor, e não posso dizer que sou só de forró. Quando você se define você se limita."
O POVO - Qual o sentimento de estar realizando um marco como esses 20 anos de carreira?
Xand Avião - Eu estava até esses dias, sozinho, pensando sobre isso. Quando eu vim para o Aviões do Forró, em 2002, eu nunca imaginaria chegar a 20 anos de carreira. É um marco muito grande, é um número a ser comemorado, a ser respeitado. Eu nunca imaginava chegar nem a 5 anos de carreira. Eu vim para poder trabalhar e sustentar a minha família.
Eu fico olhando tudo que a gente construiu de 2002 pra cá – não só eu, como a Solange também, ela faz parte desse sucesso. Quando se fala em Xand Avião, se fala da atualidade. Estou muito feliz com meus 20 anos (de carreira), mas isso não quer dizer que eu quero parar.
O POVO - Sua carreira dá a sensação de que está sempre em ascensão. Como você faz isso?
Xand Avião - A sensação de que está em crescimento é o fato que a gente mais se preocupa. É nunca achar que a gente chegou lá. Eu ando com cantores por aí, eu não vou falar nomes, que já acham que chegaram no sucesso, no pico, no topo. Eu acho que não, acho que o meu sucesso vai ser sempre o próximo. Eu procuro isso todos os dias.
O POVO - O Viiixe é uma mistura de diferentes artistas do mesmo segmento, mas que têm suas particularidades. Quais as pretensões para o evento nos próximos anos?
Xand Avião - O Viiixe foi um sucesso total. O último será em Belém do Pará, em outubro. Foi um evento idealizado por mim, por Carlos Aristides e pelo pessoal da Top Eventos, que é quem cuida da carreira do João Gomes, Vitor Fernandes e Tarcísio do Acordeon. Eu já fiz todos os festivais que você imaginar: Villa Mix, Festeja… sempre participando de festivais de sertanejo. Mas eu nunca tinha visto um festival de forró e eu sentia falta disso.
Nos próximos anos eu já quero fazer um navio do Viiixe, já temos turnê marcada para fora do País. Então o Viiixe vai continuar sim. A gente vai acrescentar alguns artistas que estão em ascensão.
O POVO - Dá para misturar forró com todos os ritmos mesmo?
Xand Avião - Quando eu comecei a gravar com outros estilos, os meus próprios fãs começaram a me recriminar nas redes sociais, dizendo que não cantava mais forró. Eu sou cantor de forró, compositor criado no meio, sou forrozeiro. Mas eu sou um cantor e não posso dizer que sou só de forró. Quando você se define você se limita. A primeira música que eu gravei e o pessoal começou a falar foi “Casal raíz”, que virou um hit nacional. Depois veio a música com a MC Dani, estourou também.
Agora vem “Bololo” que é uma música com MC Pedrinho, que está estouradaço com a música “Dançarina” com Pedro Sampaio, que virou global, com Anitta e Nicky Jam. Acho que isso é para mostrar que o forró combina com tudo, que dá para levar para o sertanejo, funk, pagode.
Série vai explorar personagens - famosos e anônimos - para destacar histórias de vida