O compromisso de fazer as pessoas soltarem longas gargalhadas parece ser característica inata de Whindersson Nunes. Nascido na escondida cidade de Palmeira do Piauí, ganhou o mundo a partir de 2011 com vídeos gravados no próprio quarto, sem camisa e sem estrutura, mas com carisma e inteligência para logo dominar as plataformas digitais. Hoje aos 28 anos, milhões nas redes sociais e na conta bancária, está com seu mais novo especial de comédia solo em destaque na Netflix.
Com números exorbitantes que lhe alçaram ao patamar de uma verdadeira celebridade, Whind tem uma história que envereda por trilhas marcadas pela superação de incontáveis dificuldades, entre as quais a pobreza, a depressão e até mesmo a perda de um filho nascido prematuramente. Com uma legião de apoiadores, porém, diz buscar forças em suas raízes e em sua religiosidade para sempre seguir em frente.
► “Venho de um lugar onde é a fé que move, então me benzo sempre antes do meu corre”, canta ele com o pseudônimo Lil Whind, em Drip da Roça 2.
Apesar de ter nascido em Palmeira, em 5 de janeiro de 1995, o filho de Valdenice Nunes e Hidelbrando Batista cresceu ali pertinho, em Bom Jesus, também no Piauí, ao lado dos irmãos Harisson, Hidelvan e Hagda Karolayne. Uma família que atravessou inúmeros problemas financeiros e que precisou mudar de casa por pelo menos 20 vezes na cidadezinha de pouco mais de 35 mil habitantes.
Mas fora o dinheiro, naquele lar também eram escassos os afetos, que davam lugar aos atritos e às brigas. Whindersson, por outro lado, sempre mantinha a vontade de quebrar o gelo e dizer pelo menos um “eu te amo” aos pais, algo alcançado somente após o sucesso na internet se refletir no bolso da família.
“Começamos a conversar mais, ter mais diálogos. A primeira vez que eu li, nem ouvi isso, foi uma mensagem do meu pai que dizia assim: ‘fica tranquilo, porque o papai te ama’”, resgatou da memória, deixando as lágrimas correrem sobre o rosto em participação no programa Faustão na Band em 2022.
Da esquerda para a direita: Valdenice Nunes, Hidelbrando Batista, Hagda Karolayne, Whindersson, Hidelvan e Harisson.
Se em casa os sentimentos eram contidos, fora dela Whind extravasava, sobretudo na escola. Geralmente em destaque por conta das suas brincadeiras, era conhecido por todo o Colégio Agrícola de Bom Jesus, lugar onde, aos 15 anos, gravou seus primeiros vídeos com ajuda dos colegas.
Com a veia artística já aflorada, foi dentro de uma sala de aula que produziu seu maior sucesso no YouTube até então, a paródia “Alô vó, tô reprovado”, em 2013, que atingiu mais de quatro milhões de visualizações em apenas dez dias.
À época, produzir conteúdo para a internet ainda não era considerado um plano de carreira, mas apenas um “vamos ver no que vai dar”, inclusive para Whind que dividia as responsabilidades do canal com a obrigação de levar dinheiro para casa. Antes da fama, chegou a trabalhar como carregador de caminhão e garçom.
“Eu não sabia que poderia ganhar dinheiro e eu não ganhei um centavo com esse vídeo”, revelou em 2015 ao também humorista Rafinha Bastos.
Nem tudo estava perdido, porém, pois aquela foi a furada de bolha necessária para que mais pessoas descobrissem seus vlogs, gravados no próprio quarto com uma câmera emprestada e tendo uma caixa de sapato como tripé. Suas falas engraçadas, alinhadas aos cortes rápidos da edição e à fé de que aquilo poderia lhe mostrar para o mundo logo o fizeram ter mais público do que Bom Jesus tem de moradores.
Mudou-se então para casa de um amigo em Teresina, para passar três dias. Ficou oito meses por lá, com as dificuldades financeiras ainda como companheiras até enfim alugar um kitnet tão pequeno, mas tão pequeno, que o chamava só de “kit” – como ele mesmo brincava naquele período. Dali em diante, o crescimento que já era constante seguiu aumentando e extrapolou as fronteiras do YouTube, da internet e do Brasil.
Com o foco de se apresentar como alguém que sabe fazer as coisas bem feitas, Whindersson Nunes logo passou a interagir com o público pessoalmente. Mais especificamente através dos palcos de sua grande paixão: o teatro. Amante da atuação, começou a realizar shows de stand-up ainda em 2013, transformando suas vivências do dia a dia em piadas contagiantes. Com diferentes apresentações originais, rodou o Brasil arrastando verdadeiras multidões.
Quando em dezembro de 2018, foi a vez de visitar o Centro de Formação Olímpica do Ceará, em Fortaleza, para gravar seu show intitulado “Adulto”. A apresentação refletiu sobre a vida de recém-casado que tinha com a cantora Luísa Sonza, suas amizades com famosos e muito mais, sendo sua primeira produção exclusiva para a Netflix. Depois dela, tudo estava planejado para em 2020 rodar uma turnê pelos Estados Unidos, porém a pandemia de Covid-19 impediu a realização do projeto.
O retorno aos palcos demoraria, mas em 2022 emplacou mais uma produção exclusiva na Netflix, o show “Whindersson Nunes: É de mim mesmo”, gravado no Teatro Amazonas. Ainda em 2022, Whind escolheu mais uma vez Fortaleza para testar a apresentação “Isso não é um culto”, que teve sua gravação realizada em Porto, Portugal, para ser lançada novamente na plataforma de streaming, com reflexões sobre a atualidade, as redes sociais, além de trazer um espetáculo com um coral de vozes. O stand-up chegou ao top 1 no Brasil três dias depois de lançado.
Em uma cidade interiorana de um estado pobre do Nordeste, Whindersson Nunes teve um despertar para a arte ainda muito cedo, apesar da falta de incentivo e de estrutura. “Eu olhava ao meu redor quando era criança e falava: ‘meu irmão, aqui mesmo não tem nada para mim’. Mas eu via que o computador era o momento, a nova era, que dali um tempo a galera iria estar com a cara enfiada naquele negócio e não iria querer mais sair”, recordou ele ao podcast PodPah, em 2022.
Ainda assim, aquele sonho era algo muito distante para a realidade à sua volta. Seu pai Hidelbrando Batista, por exemplo, que tinha como trabalho a venda de remédios em comunidades rurais mais afastadas, perdeu as contas das vezes que levantou no meio da noite para desligar o computador enquanto Whind editava vídeos. Tudo isso sob o pretexto de que aquele uso estava gastando energia de maneira desnecessária, sem sequer imaginar o futuro brilhante que estava por vir.
Whindersson não desacreditou em momento algum e com o bordão “E aí, galerinha que assiste meu canal, tudo bem com vocês?”, presente no início de todos os seus vídeos, conquistou e fidelizou um gigantesco público ao longo da carreira. Prova disso é que saiu dos 100 mil inscritos em 2013 para alcançar os 44 milhões em 2023, consolidando-se nesses dez anos em um dos maiores youtubers do Brasil.
Para chegar a esses números tão expressivos, não abdicou do trabalho de produzir conteúdo para seu público. Ao todo, são mais de 500 vídeos publicados, lhe rendendo números superiores a quatro bilhões de visualizações.
Com tamanho destaque na plataforma, Whindersson começou a também investir seu talento em outras frentes, como a TV e o cinema. Ele já apresentou premiação e programas de humor na MTV Brasil, bem como estrelou e dublou filmes brasileiros e estrangeiros, como “Internet – O filme”, “Os penetras 2 – Quem dá mais?”, “Os parças”, “Contos do caçador de sombras” e “Detetive Madeinusa”.
Por ora, seu grande projeto em planejamento é algo tipicamente piauiense. Trata-se da produção de um filme a ser lançado gratuitamente no YouTube, narrando a história de quatro pessoas que lutavam para viver da arte no distante ano de 1823, período em que acontecia a
Durante a produção do filme, Whindersson chegou a ganhar um bate papo incrível com o ator e diretor hollywoodiano Keanu Reeves. O astro das franquias “Matrix” e “John Wick”, que esteve de passagem pelo Brasil em outubro de 2022, compartilhou um jantar com Whind, que publicou detalhes do encontro em suas redes sociais.
“Assim como vocês já tiveram shows de graça, estou fazendo um filme também de graça. Encontrar com o Keanu hoje e conversar sobre a inspiração em John Wick foi a confirmação de que estou no caminho certo. Espero que gostem, é mais de mim para vocês. Meu melhor trabalho”, revelou.
Curiosidade: Durante o encontro, com Keanu Reeves, Whindersson compartilhou jantar ainda com os pilotos Rubens Barrichello e Felipe Massa, além de seu amigo Emanuel VS.
Ao longo de sua trajetória, Whindersson Nunes já chamava atenção por suas paródias e imitações de artistas. Sua voz, afinação e interpretação também não ficavam para trás, o que indicava que ingressar no cenário musical seria apenas questão de tempo. Foi então que em 2014 publicou "Tão linda", canção de própria autoria.
Os próximos trabalhos musicais demoraram anos para serem lançados, mas quando chegaram Whind continuou cantando sobre o amor, Deus e seus sentimentos.
Whindersson lançou o gospel “Girassol” junto com Priscilla Alcântara. A letra foi escrita por ele logo após a morte de Gabriel Diniz.
Durante o isolamento social da Covid-19, Whind e Ivete lançaram a música "Coisa linda", gravada com cada um em suas casas.
Para falar da felicidade em entender a amizade com Jesus Cristo, Whind lançou "Paraíso", em parceria com Luan Otten.
Com a chegada da pandemia e a necessidade artística de produzir, Whindersson colocou em prática um projeto que tinha guardado no coração há um tempo. Era o lançamento de seu alter ego Lil Whind. Mas em vez de surfar na onda de ritmos já conhecidos por estas terras, optou por um que ainda engatinhava no Brasil: o trap. O estilo logo caiu nas graças dos brasileiros e hoje domina os topos das plataformas de streaming, sempre contando com nordestinos em destaque.
Incorporado de Lil Whind, o artista passou a realizar apresentações pelo País – inclusive está com show marcado para Fortaleza, em abril de 2023, durante o Plantão Festival. Até o momento, conta com parcerias com nomes como João Gomes, Matheus Fernandes, Hungria, Alok e outros.
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No auge de sua carreira e com trabalhos em diferentes frentes, Whindersson Nunes viajou o globo fazendo apresentações de stand-up. Onde tinha brasileiro ou alguém que falava a língua portuguesa, ele rumava carregando bagagens cheias de piadas, na esperança de espalhar alegria pelas trilhas que percorresse. Foi assim que em 2019 chegou a Moçambique, lugar que mudou de vez sua percepção sobre a vida e o mundo.
Após colher inúmeros sorrisos e converter todo o lucro dos shows em ajuda humanitária para os próprios moçambicanos, Whind retornou ao Brasil e pouco tempo depois revelou estar sofrendo de depressão. Deu uma pausa em tudo: stand-up, vlogs e filmes, para dar início ao seu tratamento.
A pobreza extrema conhecida naquela experiência o levou a fazer questionamentos sobre o seu propósito no mundo. “Ah, o que vou fazer agora? Só ganhar dinheiro, só viver disso? Não encontrei um sentido", contou ele ao Fantástico em julho de 2019, quando começou a retomar a carreira.
Recuperado, Whindersson voltou à sua rotina de produção até a chegada da pandemia de Covid-19, em 2020. Naquele mesmo ano, em abril, seu casamento com Luísa Sonza chegava ao fim de maneira inesperada para os fãs. Novamente ele viveu um momento de turbulência até que em novembro seu coração seria enlaçado pela estudante de engenharia Maria Lina Deggan, com quem anunciou em janeiro seguinte que estava esperando um filho.
A alegria do casal, entretanto, não permaneceu por muito tempo e logo deu lugar à aflição, já que em 29 de maio de 2021 Maria Lina deu à luz prematuramente a João Miguel em uma gestação de apenas 22 semanas. Naquele dia, Whind ainda celebrou aquela chegada em relato emocionante pelo Instagram.
“A primeira vez que encostei nele foi como se eu encostasse em um pedaço de Deus. Há tanto tempo eu não me sentia vivo”, escreveu.
Em apenas 24 horas, no entanto, ele receu a notícia da morte do filho. “Eu pude vê-lo por um dia apenas, mas o amei e amo pela vida inteira”, comentou em seu livro de memórias “Vivendo como um guerreiro”. Também como homenagem ao filho, Whindersson arrancou lágrimas após lançar a música "Quarto 1906" em seu canal no YouTube.
Dividir aquilo que tem e que conquistou nunca foi uma questão desconcertante para Whindersson Nunes. Ao longo de sua carreira, o que não faltaram foram oportunidades para compartilhar a possibilidade de melhoria com aqueles ao seu redor, inclusive fãs. Prova disso é que não faltam depoimentos nas redes sociais de quem conseguiu ser notado e ter seus sonhos bancados pelo piauiense.
Mas além de investir o próprio dinheiro, Whind se notabilizou por usar sua influência para dar luz a diferentes causas sociais, a exemplo do colapso do sistema de saúde de Manaus, durante a pandemia de Covid-19.
Em janeiro de 2021, ele mobilizou outros influenciadores a aderirem uma campanha de doação de cilindros de oxigênio para hospitais da capital amazonense, em meio ao descaso do Governo Federal.
Mais recentemente, em seu aniversário de 28 anos, Whindersson fez um pedido para que as pessoas não lhe dessem presentes naquele dia, mas que abraçassem a ideia de garantir o encanamento de água para a vila de Kazimate, em Moçambique. “Lá as pessoas caminham 15 km para buscar água potável. Que falte de tudo na vida, mas que não falte água. É o que temos de mais abundante no planeta”, defendeu.
Poucas horas depois, mais de R$ 100 mil foram arrecadados, valor suficiente para financiar a empreitada, que foi comemorada pelos moradores locais. Responsável pelo contato que sensibilizou Whind, Mucalaca da Costa compartilhou comemoração pelo andamento do projeto.
Dentre suas várias aleatoriedades, Whindersson estreou no boxe de exibição contra Acelino “Popó” Freitas, em 31 de janeiro de 2022. Apesar de Popó ter amassado o comediante, a luta terminou empatada. O embate arrecadou mais de R$ 25 milhões.
Após a turnê pelo mundo do show “Isso não é um culto”, que foi lançado na Netflix, Whindersson anunciou que iria dar uma pausa na carreira. Ele afirmou que precisava de um tempo para assimilar as consequências que a fama trouxe para sua vida.
Inspirado em Adam Levine, vocalista do Maroon 5, Whind fez uma tatuagem em homenagem ao seu estado natal. Enquanto o americano tem tatuado na barriga “California”, o brasileiro marcou na pele o nome “Piauí”.i
Em 2017, Whindersson adquiriu um jatinho avaliado em quase R$ 2 milhões. A compra gerou muitos comentários nas redes sociais, mas o influenciador alertou que não mantém a aeronave apenas por “status”.
Em entrevista ao podcast “PrimoCast”, Whindersson revelou quanto chega a ganhar em propagandas ao longo do ano. Atendo-se apenas ao Instagram, ele mencionou: “Por ano, uns R$ 20 milhões.”
Não será qualquer marca que aparecerá nas redes sociais de Whindersson. Durante entrevista ao “PrimoCast”, ele revelou já ter recusado uma única publicidade de R$ 10 milhões. Era “coisa de aposta”, justificou.
Para a produção desta reportagem, foram coletados dados sobre a produção musical e audiovisual de Whindersson Nunes, inclusive sob o pseudônimo de Lil Whind. Para isso, foram realizadas consultas aos serviços de API do Spotify e do YouTube. Foram reunidas informações sobre músicas e vídeos mais consumidos pelo público, além de estatísticas específicas de cada plataforma.
Para garantir a transparência e a reprodutibilidade desta e de outras reportagens guiadas por dados, o O POVO+ mantém uma página no Github na qual estão reunidos códigos e bases de dados produzidos para as publicações.
Série vai explorar personagens - famosos e anônimos - para destacar histórias de vida
