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Matuê e o reecontro com Fortaleza após uma volta ao mundo
Reportagem Seriada

Matuê e o reecontro com Fortaleza após uma volta ao mundo

Matheus Brasileiro Aguiar inventa e reinventa a cena do rap/trap no Brasil. Com mais de 10 milhões de seguidores só no Instagram, Matuê consegue lançar cantores e quebrar recordes, sem esquecer que é cearense
Episódio 28

Matuê e o reecontro com Fortaleza após uma volta ao mundo

Matheus Brasileiro Aguiar inventa e reinventa a cena do rap/trap no Brasil. Com mais de 10 milhões de seguidores só no Instagram, Matuê consegue lançar cantores e quebrar recordes, sem esquecer que é cearense
Episódio 28
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Matheus Brasileiro Aguiar, Matuê ou só Tuê é o nome do trapper mais ouvido do Brasil. Na infância, Tuê era um menino “rueiro”. Descia a calçada de skate, ouvia um som ‘daora’ e ficava ali - prensado nessa brisa. Mas acontece que ele não era “rueiro” em qualquer avenida, mas nas ruas de Fortaleza, capital do Ceará.

O artista e diretor criativo da 30PRAUM se reinventa e inventa a cena trap no Brasil. Nesse cenário, a pesquisadora de Rap, Nerie Bento, comenta que Matuê é um artista de projeção. Ele consegue popularizar o gênero musical rap/trap, mas não foca na cultura hip hop - que é preta e periférica.

Pelas ruas da capital, imagine uma batida densa, coloque por cima letras hedonistas sobre o que vê. Foi assim que Matheus conquistou o seu título. Apesar de ter 10 milhões de seguidores no Instagram, a cena ainda é undergrond Cultura que foge dos padrões comerciais, que está fora da mídia .

O rap/trap não pode se dissociar da cultura hip hop, que não é das massas.

Matuê é um rapper, cantor, compositor e guitarrista brasileiro(Foto: Divulgação / Capa do Ep Vampiro)
Foto: Divulgação / Capa do Ep Vampiro Matuê é um rapper, cantor, compositor e guitarrista brasileiro

O cantor se destacou nacionalmente em 2016, com a faixa “RBN”. No mesmo ano, o trapper e a empresária Clara Mendes criaram a produtora 30PRAUM, a fim de administrar a carreira do artista e abrir espaço para o trap em solo cearense.

O seu primeiro álbum, "Máquina do Tempo" (2020), quebrou o recorde semanal de execução no Spotify, o que lhe rendeu uma placa de ouro pelos mais de 20 milhões de streams em 1 mês.

Ouça aqui o álbum Máquina do Tempo (2020)

Em 2023, Matuê foi indicado ao MTV EMA na categoria “Melhor Artista Brasileiro”. O artista foi o único rapper brasileiro nas indicações.

Hoje, Matuê reinventa a cena musical, mescla ritmos como reggae e trap e consegue, ainda, lançar outros sucessos como WIU e Teto. A empresa do trapper, 30PRAUM, também é responsável por criar o “Plantão Festival”, primeiro festival de rap realizado no Ceará.

Mas tudo isso demorou algumas viagens para fora — onde recebeu o apelido Matuê — e uns ‘trampo’. Ou seja, para entender, você precisa dechavar Desfazer ou triturar algum tipo de fumo que esteja prensado essa história.

 

 

Núbia Brasileiro, a avó, e o primeiro violão

A primeira referência de Matuê é Núbia Brasileiro, a avó e matriarca da família, a qual lhe presenteou com seu primeiro violão. “Minha mãe era muito nova e minha avó me criou”, afirmou o cantor ao programa Entrevista com Bial. Matheus nasceu em 1993, sua mãe tinha pouco mais de 20 anos.

Núbia era professora de arte, poeta, escritora e ensinou as ‘paradas’ para Matheus. Em apresentação no The Town "Festival de música idealizado pelo mesmo criador do Rock in Rio, Roberto Medina. O evento acontece em São Paulo
"
, Matuê — com uso de IA — trouxe imagem e voz de sua mentora ao Autódromo de Interlagos.

A arte de Matuê foi acendida por sua avó, que mais do que ensinar música, ensinou como o garoto do 085 deveria ter orgulho de ser quem é — Fortalezense.

Leia alguns poemas da avó de Matuê


Matuê nasceu em Fortaleza e com 8 anos foi para San Leandro alguns minutos de Oakland na Califórnia, Estados Unidos. “Quando aprendi ‘fuck you”, era ‘fuck you" para todo mundo”, afirmou o trapper para o podcast Podpah. Quando começou a ‘majar’ da língua, ele ‘desenrolava’ o resto, relata. Na adolescência, Matheus começou a se interessar pelo mundo do rap.

Nessa época surgiu o trap nos Estados Unidos, em Atlanta, estado da Geórgia. Trap — que significa armadilha em inglês — é fruto de uma cena violenta, de quando o tráfico explodia pela região.

A principal característica sonora é a atmosfera densa do beat eletrônico, a bateria 808, as linhas melódicas psicodélicas possíveis com o autotune "Criador de áudio que usa uma matriz sonora para corrigir os desempenhos no vocal e instrumental" . O que antes funcionava como aperfeiçoamento de um vocal, se tornou elemento estético de sonoridade.


Escute essa batida, se pá tu até rima:

Em entrevista no Conversa com Bial, da TV Globo, o traper afirma que “com o autotune conseguimos desenhar algumas melodias, que dão a sensação de elevação”.

Antes de começar a produzir, Matheus viu a oportunidade de investir na carreira com o dinheiro que ganhava como professor de inglês, “me abriu muitas portas e me possibilitou a dar iniciativa na minha caminhada musical”, contou ele ao jornal Correio Braziliense.

Apesar de ter conhecido o trap na América do Norte, ele afirma que o ritmo que faz é abrasileirado. “Fortal City é uma mistura; Da Oeste pra Zona Sul; É o terror do Pirambu”, letra de "É sal", faixa 6 do álbum "Máquina do Tempo" (2020). Essa é uma das músicas que o artista cita a cidade natal. 

Você percebeu que ele ainda não é Matuê, mas Matheus? Pois é, esse nome surgiu na França.

Com 21 anos, Mateus vendeu o próprio carro e comprou passagens para França, sem dinheiro, mas - ainda assim - na França.

Em uma garagem, dormindo em um sofá, ele viu a oportunidade de criar. Não tinha dinheiro, nem as possibilidades apareciam. Ou seja, para se manter, ele precisou recorrer aos amigos que havia feito.

Acontece que “os moleques faziam o corre Vender ou comprar drogas da ganja”, como ele revelou ao Podpah, e ele “virou correria (entregador) dos cara também”. Matuê vendia maconha só para universitários, “só para fazer ponta”. E eles coroaram o Matheus de Matuê.

Esses novos amigos descobriram que Matuê tocava, deram-lhe um violão e o incentivaram a tocar novamente. De maneira caseira, com um microfone qualquer e o violão, fez um som que chamou de ‘Tropical Island Honey’:

Confira a música  

Produzir música não dava dinheiro e os bicos com a correria foram minguando. Sem ter o que fazer na França, decidiu ir a Berlim, onde sua namorada Clara (futura mãe do seu filho) morava.

A viagem entre Paris e Berlim durou 24 horas. Nesse dia que viveu confinado em um ônibus, decidiu que se dedicaria à arte e queria fazer arte no Brasil.

Em Berlim uma parte da história se repete quanto à grana e aos subempregos. Sem dinheiro para voltar, foi encerar chão, montar móvel, até que conseguiu um emprego como professor de inglês, que lhe permitiu, entre aula e outra, conseguir dinheiro para voltar ao Brasil.

 

 

Todos por uma, uma onda boa

Quando estava na França, ele recebeu o nome de Matuê e outro nome surgiu lá — 30PRAUM.

Em Conversa com Bial, Matuê falou sobre “chegar em um baseado que desse para os 30 uma onda boa”. A empresa 30PRAUM surge a partir do envolvimento amoroso entre Clara Mendes e Matuê, que se tornaram sócios.

Matuê e Clara nos bastidores do Festival Plantão. Eles são pais do pequeno Ali. Ambos escolheram não mostrar o rosto da criança.(Foto: Divulgação/Gabriel Brasil)
Foto: Divulgação/Gabriel Brasil Matuê e Clara nos bastidores do Festival Plantão. Eles são pais do pequeno Ali. Ambos escolheram não mostrar o rosto da criança.

Ele e Clara se conheceram na Universidade de Fortaleza - Unifor. Clara é filha de portuguesa com alemão, conheceu o trapper durante intercâmbio no Brasil. Na época, Matuê fazia comércio internacional, mas nunca chegou a concluir o curso. Para a revista Marie Clare, Clara fala que viu, ainda naquela época, muito talento em Matuê.

A marca surgiu em 2016 para dar apoio a carreira do trapper. A CEO Clara Mendes ficou responsável por assessorar Matuê. “Na história do hip hop, as mulheres estão sempre no backstage”, diz a pesquisadora de Rap, Nerie Bento.

Matuê, como diretor criativo, englobou os cantores WIU e Teto — referência no estilo musical, porém, em seu histórico, ainda não dividiu palco e gravações com uma mulher trapper. “Nunca é de igual para igual, de Mc para Mc, sempre tem a diferença”, explica a estudiosa Bento.

Para Clara Mendes, por trás do 30PRAUM, o objetivo é mesclar a cultura nordestina e o hip hop. Em entrevista ao Meio&Mensagem, o trapper afirma que “O festival ( Plantão Festival "Primeiro festival de trap/rap realizado em Fortaleza(CE). O evento auxilia no movimento cultural cearense e mobiliza fãs de todo o Brasil" ) é uma das estratégias da 30PRAUM para mostrar que temos força na região nordeste”, explica.

Em sua primeira edição, o Plantão Festival reuniu 60 mil pessoas em Fortaleza.

Plantão Festival 2024 terá shows de Matuê, Djonga, Cone Crew e outros artistas do rap e trap nacional(Foto: Plantão Festival/Divulgação)
Foto: Plantão Festival/Divulgação Plantão Festival 2024 terá shows de Matuê, Djonga, Cone Crew e outros artistas do rap e trap nacional

Matuê ainda mora em Fortaleza, na Beira-mar. Com 30 anos, o trapper vive sua paternidade e algumas adversidades, como a doença de Still em adultos "É uma doença rara, consiste em um raro distúrbio inflamatório sistêmico, um tipo de artrite inflamatória, que se caracteriza por febre alta, erupções cutâneas e dores articulares, que, em longo prazo, pode resultar em artrite crônica" .

Mas nada disso interfere em sua potência de criar. Ele agora anda por outras ruas, mas continua ‘rueiro’. Continua misturando ritmos musicais e criando algo novo. O "pivete" do 085 trouxe algo para sua terra.

Matuê fala da realidade dele e do lugar de onde ele realmente fala - Fortaleza. As culturas que ele se insere, como quaisquer outras, são cíclicas. A periferia é um universo, como comenta a estudiosa Nerie Bento, ou seja, o espaço de onde se vem, a raça que se é só invocam uma pergunta.

O que Matuê devolve para a cultura?

Na infância, sua avó segurava o acordeon, ele ficava no teclado, eles iam tocando e cantando. Com o primeiro violão, as cordas que sua avó o ensinou a tocar reverberam para além do gênero musical, seja forró, rap, trap, reggae - é sobre arte.

 

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