“Juazeiro do Norte é Santa”. Quem crê assim é Jorge Francisco Félix, 75, agricultor, vestido numa batina verde semelhante a que usava Padre Cícero Romão Batista. É a memória do “Padim” que o trouxe pela décima vez à cidade “santificada” pelo controverso padre - finado há 85 anos, em 20 de julho de 1934.
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Seu Jorge Félix veio com o amigo, Cícero Rosa Silva, 70, de São Luís do Quitunde, município de Alagoas, para a romaria pela morte do padre “santificado nas ruas” de Juazeiro do Norte e que, ainda hoje, tem sua vida subjudice no Vaticano. Mesmo que a Igreja Católica do Cariri viva das memórias do religioso.
Da ultima ultima quarta-feira, 17, quando começaram as celebrações religiosas pela partida de Padre Cícero, até sábado, 20, pelo menos 4 mil romeiros passarão pela Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, igreja onde está encerrado o corpo do sacerdote cearense.
Até o próximo sábado, explica o padre Paulo César Borges, 48, vigário paroquial da Basílica e da igreja do Socorro, serão dias inteiros de confissões e de missas e oferecidas aos romeiros e pagadores de promessas vindos, principalmente, da região Nordeste.
Ao lado de um pé de jasmim do jardim do cemitério da Capela do Socorro, Jorge Félix conta que, ao final da missa principal em intenção ao padre Cícero, no próximo sábado, às 6 da manhã, deixará a réplica da batina verde. Mandou costurar em Alagoas para andar os quatro dias em Juazeiro do Norte. “É o que trago. Se eu pudesse, vinha viver aqui”, diz o agricultor.
O amigo de seu Jorge Félix, entrosamento feito durante a viagem de lá pra cá, anda descalço desde que chegou a Juazeiro, na última terça-feira, 16. Veio pedir pelos dez filhos e a esposa. “Tudo crente, só eu de católico e devoto do padim”, diz. Também se largou de Alagoas para o Cariri para agradecer ao padre por ter escapado de um câncer na próstata.
Do Rio Grande do Norte, da Lagoa do Mato, chegaram as vizinhas Maria Ferreira, 59, e Adaide Francisca da Silva, 66. As duas, ao se ajoelharem no túmulo de Padre Cícero, no rés do altar da Capela do Socorro, encostaram sacos cheios de vidros na pedra onde a fotografia do sacerdote é lembrança.
Garrafas de óleo de pequi. Dona Maria Ferreira tem fé que, depois dali, o líquido “bento” no tumba do Padre Cícero curará “dores e aperreios”. Já curou, reforça. E vai continuar insistindo com um filho alcoólatra, fazendo-o beber o óleo ou marcar o sinal da cruz na testa do homem feito.
Quando voltarem à Lagoa do Mato, parte do óleo bento irá também pra capela de Santo Expedito que está sendo construída pela comunidade. É lá onde uns 20 casais, “amigados, juntos ou casados apenas no cartório”, irão se casar no católico. “Daí, vou puder me confessar nas romarias de Juazeiro do Norte, como mandou Padre Cícero”, diz Adaide Francisca da Silva, casada apenas no civil.
ROMEIROS QUEREM SER OUVIDOS
O que os romeiros querem durante as idas para celebrar a existência de Juazeiro de Padre Cícero? “Principalmente serem escutados pelos padres e as irmãs”, diz Paulo César Borges, vigário da Basílica de Juazeiro do Norte e da Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
Para o padre Paulo César, os devotos veem, sim, pagar promessas também pelo o que alcançaram. “Mas alem disso, querem encontrar nos padres daqui alguma semelhança do que foi Padre Cícero”, explica.
Semelhança, acrescenta o vigário, na figura de “um psicólogo, de um promotor, de um juiz, de um educador, de aconselhador nos mais diversos assuntos ou problemas que os romeiros trazem para ser mediados pela igreja que ainda tem a forte presença do Padre Cícero”.
Padre Cícero, afirma o vigário que nasceu em Várzea Alegre, no Cariri, foi também “psicólogo, sociólogo, ecologista e orientador das famílias”. Seria por causa dele que, ainda hoje, na Juazeiro antiga, toda casa seja “uma oficina de oração e de trabalho. Na sala, o Coração Sagrado e, no quintal, uma oficina de trabalho”, descreve Paulo César Borges.