Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.
Se na China uma realidade virtal apresenta o jornal da televisão estatual e na Venezuela, tempos atrás, colocou-se em rede um falso jornalista — tão bem feito que parecia real —, agora temos um avatar digital porta-voz na Ucrânia: Victoria Shi, a mais perfeita das falsidades artificiais
Victoria Shi é impressionante. Na sua roupa negra, a moça é a nova porta-voz ucraniana para assuntos diplomáticos. Único problema: é uma ilusão perfeita, produzida por uma inteligência artificial.
Por causa disso, Victoria lê suas notícias consulares, mas não pode interagir com ninguém. Salvo jornalistas, a quem responde com textos já prontos.
Esta “persona” digital foi batizada por Victoria por motivos óbvios — a guerra da Ucrânia, em defesa de seu território, com a Rússia. Já o sobrenome Shi significa “inteligência artificial”, em ucraniano. A cantora Rosalie Nombre, ex-concorrente do reality show, na versão ucraniana, de The Bachelor, emprestou seu rosto à Victoria.
Nascida em Donetsk, cidade hoje ocupada pela Rússia, a cantora cedeu sua imagem gratuitamente para ser fotografada e modalizada e diz que fez isso pelo seu país. O que a ajudou também a bombar, na sua atividade de influenciadora.
Se, nas redes sociais as coisas vão bem para Rosalie, para Victoria há alguma resistência: inúmeros comentários racistas, pela sua aparência mestiça.
Mas, por que não uma mulher, de carne e osso? O ministério dos negócios estrangeiros da Ucrânia explica que, em tempos de guerra, o uso da inteligência artificial economiza tempo e dinheiro.
Em 2022, a Ucrânia já tinha lançado para o mundo uma ideia pioneira, em questão de tecnologia. Uma experiência multissensorial do conflito.
Com óculos especiais, através do Living the War, qualquer um pode sentir o que sente um ucraniano, em meio aos bombardeamentos e à destruição das cidades. Agora, com Victoria Shi, a Ucrânia foi mais longe, na sua comunicação com o mundo. No campo político, esta figura modalizada nos habitua, pouco a pouco, a termos conversas com máquinas.
Inteligências artificiais tão bem produzidas que borram a fronteira do humano e do não-humano. Victoria é elegante, classuda, bonita, fluente em línguas, tão perfeita que parece real — e nos engana, e nos encanta. A única falha, dizem, mas eu não notei, é o movimento repetitivo das mãos.
Apaixonados por ela, fazemos sobre o virtual a mesma pergunta que se faz sobre o amor: até onde a ilusão pode ir? Sobre os dois assuntos, ficamos sem resposta.
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