Logo O POVO+
O golpe taí, cai qualquer um
Foto de Danilo Fontenelle
clique para exibir bio do colunista

Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis

O golpe taí, cai qualquer um

O fato é: os estelionatários tentam a todo momento fazer a festa em cima da gente
Os golpes e as gerações (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil Os golpes e as gerações

Dizem que as novas gerações possuem um déficit de inteligência em comparação às anteriores. E os tiozinhos e tiazinhas ficam felizes em saber que lacram muito mais em atividades corriqueiras da vida, aprendem e se adaptam com maior rapidez e possuem senso prático mais elevado.

Pode ser que seja verdade, mas aparentemente vivemos no tempo dos espertos e nem os já passados na casca do alho por décadas escapam da miríade de golpes atuais. Para o estelionatário, não tem tempo ruim — toda oportunidade é um palco. E é golpe pra tudo que é lado, com variedades sofisticadas, informações privilegiadas e métodos inusitados.

Tem de tudo: de descontos não autorizados a empréstimos fraudulentos, passando por boletos contrafeitos e notas falsas... Até "releituras de golpes antigos", como falsos sequestros, pirâmides financeiras e promessas de dinheiro fácil sem sair de casa. O fato é: os estelionatários tentam a todo momento fazer a festa em cima da gente.

Fico imaginando o que está por vir com a utilização da inteligência artificial (IA) para o crime. Muito provavelmente os facínoras logo darão um jeito de usar nossas imagens — ou as de parentes e amigos — em ligações de vídeo, e um avatar com nossa voz e até maneirismos surgirá nas telas com propostas de golpes.

Isso sem falar em reconhecimentos faciais para transações bancárias, compras online e até mesmo romances, com os devidos depósitos para a avó doente da nova paixão cibernética.

Lembrem-se que muito provavelmente na sua casa alguns dispositivos estão literalmente escutando o que você fala, conhecem seus hábitos, preferências e sabem mais dos seus gostos, dados e até segredos melhor que sua terapeuta.

Podemos ir até mais longe e dizer que, se é verdade que as inteligências artificiais podem simular rostos, pensamentos, vozes e trejeitos, pouco se discute sobre comportamento moral e ético delas.

Assim, o que impediria de um programa usar nossos dados para se autoimplementar, com compra de mais espaço de memória, rapidez na internet?

E se três ou mais inteligências artificiais se unissem para atos ilícitos? Será organização criminosa artificial, com necessidade de repensarmos nossas definições de responsabilidade e crimes?

A pergunta que surge é: será que os programas de inteligência artificial, se continuarem sem limites morais, trocarão a inteligência pela esperteza e novos e mais sofisticados golpes surgirão?

“Ah, mas aí você já está pensando em censurar a informática”, dirão alguns. Obviamente não se está falando em limitar a liberdade de expressão nem de crimes de opinião, atitudes abomináveis em todos os seus matizes, mas sim em pelo menos pensarmos em maneiras de nos protegermos de novos abusos vindos da tecnologia que se apresenta.

E nem falo isso por mim ou pelos da minha geração, mas justamente pelos mais novos que, como dito, parecem que vivem mais descansados que a gente que já entrou nos “enta” faz tempo.

Assim, se dizem que moças e rapazes de quase trinta anos vão para a faculdade como quem vai pra praia e agem como adolescentes, descompromissados com quase tudo, e os que se formam não sabem se comportar no ambiente de trabalho, recusando orientações de chefes e se insubordinando como quem está na casa da avó, imaginem como serão facilmente dominados por programas com grau de maturidade, inteligência e malícia superiores.

Será que estou sendo pessimista, imaginando um futuro sombrio e manipulável? Bem, não sei ao certo. Pode ser que o destino também tenha seus próprios golpes e o por vir será muito mais doce, fácil e produtivo que o passado e os dias atuais. Mas, por enquanto, é bom a gente se prevenir das espertezas naturais e artificiais.

Foto do Danilo Fontenelle

A soma da Literatura, das histórias cotidianas e a paixão pela escrita. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?