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Rio Centro, a mentalidade que não explodiu
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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

Rio Centro, a mentalidade que não explodiu

Quarenta anos depois do desastroso atentado do Rio Centro, a mentalidade autoritária e a cultura golpista daquela permanecem em personagens como Jair Bolsonaro
Tipo Crônica
1804demitri (Foto: 1804demitri)
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"Banquete de signos" troava num show pela volta da democracia ao Brasil. No palco, o sotaque sertão e o corpo semiárido de Elba Ramalho agitavam mais de dez mil espectadores no auditório do Rio Centro, no Rio de Janeiro. Era 30 de abril de 1981, há 40 anos, e a ditadura militar (1964-1985) insistia em tropeçar nas próprias pernas.

Lá fora, por volta das 21h15min, no estacionamento do Centro de Convenções, um capitão e um sargento do Exército estavam atocaiados no interior de um Puma GTE. Os dois agentes se preparavam para executar o mais patético dos atentados terroristas arquitetado pela extrema direita brasileira encarnada no Serviço Nacional de Informação (SNI).

Oficiais, praças e civis, inconformados com a reabertura política e o fim de um dos períodos infelizes da vida no País, se embananavam num plano que acabou sendo uma agulhada nos olhos e no coração do próprio autoritarismo.

Uma das bombas, existente dentro do Puma e que provavelmente mataria milhares de trabalhadores, explodiu antes da hora prevista pelos terroristas.

No carro, o sargento Miguel Pereira Rosário morreu na hora e quase voou com as portas arrancadas do veículo. No banco do motorista, o capitão Wilson Dias Machado saiu cambaleante com as vísceras nas mãos.

Minutos depois, outra bomba explodiria na estação de eletricidade que abastecia o Rio Centro.

O intuito da fracassada operação do SNI seria detonar mais de dois artefatos durante o show e, depois, incriminar a esquerda - colocando na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) a responsabilidade pela carnificina.

 

Em 2014, o comprometido Tribunal Federal Regional da 2ª Região decidiu que o crime estava prescrito. E assim, livrou descaradamente a pele do capitão bomba (Machado), que foi reformado e promovido

 

A mancada do capitão Machado e do sargento Rosário, por ironia do destino, evitou a matança de mais civis e encurralou mais ainda o general presidente João Batista Figueiredo a encerrar o ciclo da ditadura iniciada em março de 1964.

Mesmo assim, o grave atentado encabeçado pela "comunidade de informações" do Exército e puxado por pelo menos um general e conhecimento do general Newton Cruz, não foi suficiente para varrer de vez o regime que torturou, matou e fez desaparecer opositores da esquerda brasileira. Ainda se arrastou até 1985.

O máximo de consequência pela tentativa de homicídio urdida pelo próprio Estado contra seu povo foi a renúncia do general Golbery de Couto e Silva. Era ministro da Casa Civil de Figueiredo e criador do SNI. Ele não teria envolvimento naquele episódio e, envergonhado, pegou o beco.

Depois de trancamentos e reaberturas do processo sobre o caso, em 2014, o comprometido Tribunal Federal Regional da 2ª Região decidiu que o crime estava prescrito. E assim, livrou descaradamente a pele do capitão bomba (Machado), que foi reformado e promovido.

Também saíram impunes o general Newton Cruz e os militares reformados Nilton de Albuquerque Cerqueira, Edson Sá Rocha, Divany Carvalho e o ex-delegado Cláudio Antônio Guerra. Todos denunciados por homicídio tentado, formação de quadrilha, transporte de explosivos, fraude processual e favorecimento pessoal.

 

Bolsonaro era o artefato para explodir o novo Rio Centro, o PT, porém a bomba acabou estourando novamente no colo das Forças Armadas. Eis o banquete de signos...

 

Quarenta anos depois, a exoneração dos três comandantes das Forças Armadas do governo Bolsonaro - Edson Pujol, do Exército, Ilques Barbosa, da Marinha, e Moretti Bermudez, da Aeronáutica - confirma que a cultura dos psicopatas do atentado no Rio Centro é permanência na mentalidade militar (arcaica e frustrada) do tenente Jair Messias aposentado como capitão.

Bolsonaro, absolvido em 1986 pelo corporativismo do Exército que não quis expulsar o oficial subalterno que teria planejado colocar bombas em quartéis, incorpora até hoje a mesma cultura que produziu o atentado do Rio Centro.

Os três comandantes teriam sido exonerados porque se contrapuseram à obsessão do capitão pelo autoritarismo e a mentalidade golpista. Talvez tenha sido isso.

O presidente e os filhos, como reforçou um general, alimentam mentiras construídas nos mesmos moldes de como se deu o antes e o depois da Operação Rio Centro. 

De lá para cá, a formação de oficiais e praças teria mudado e o golpe de 1964 seria visto como uma "infeliz aventura política" que as Forças Armadas jamais poderiam ter se metido como "babá do povo". Pretensão.

É mais ou menos coerente o que o general me disse. A exoneração revelou a nova pisada de bola dos militares que, de sã consciência, embarcaram espontâneos na barafunda de Bolsonaro. O histórico do capitão reformado está nos arquivos do Exército.

E ainda, os generais Vilas Boas e Mourão elegeram o PT como inimigo mortal e saíram arrastando os oficiais superiores (da ativa e da reserva) das três forças para abatê-lo como na época da ameaça comunista nos anos da ditadura.

Bolsonaro era o artefato para explodir o novo Rio Centro, o PT, porém a bomba acabou estourando novamente no colo das Forças Armadas. Eis o banquete de signos...

 

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