Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
A crônica é uma narrativa, quase sempre, na encruzilhada do desequilíbrio e a dúvida sobre o que escrever. Às vezes, a gente quer contar uma história e outra se intromete
Vem aí, daqui a pouco, a história em documentário de um homem que se acompanhou da morte até se encontrar com ela da mesma maneira que fez com os outros. Uma narrativa jornalística transformada em cinema.
De repórter, acabei também virando diretor de algumas narrativas audiovisuais. Ou fui emprestado para arriscar-me nessa escrita noviça para mim. São os novos e ligeiros tempos de uma Redação de jornal ou de uma empresa de Comunicação. Eu e o sensível Arthur Gadelha assinamos a direção.
Mainha, para cutucar as memórias ou revelá-las para quem nunca ouviu falar da criatura, foi Idelfonso Maia Cunha. Um ser vivo, nascido no Vale do Jaguaribe, que não conseguiu fugir da escrita do homem macho e machista que resolvia na bala questões várias.
Para alguns, Mainha foi um sobrenatural dos sertões do Nordeste e do Norte, universo cunhado por estereótipos
Talvez a narrativa que apresentaremos, em uma série de quatro episódios no O POVO Mais, conte sobre a coragem de ser imperfeito de cada um. Não só do matador de aluguel Mainha, mas também do espectador. Daí, a opção pela palavra "talvez" e a graça de não termos domínio na recepção.
Para alguns, Mainha foi um sobrenatural dos sertões do Nordeste e do Norte, universo cunhado por estereótipos.
Outros o tinham na conta do respeito mais pelo medo de não virar santinho de 7º Dia. Pra família e amantes, lógico, será sempre o pai doce e o homem sedutor - faces possíveis.
O "rato branco", um dos apelido dele, é um caso estranho. Mesmo morto desde 2011, ainda mete medo em pessoas nas cidades do Vale do Jaguaribe
O Mainha, ele se olhava no espelho como um justiceiro. Não lhe doía nenhuma execução sumária feita na tocaia ou no repente da valentia besta dos culhões do antropocentrismo.
Mainha foi um pistoleiro que, no efeito ruim para o roubo da vida dos outros e tormento para as famílias do morto, não difere de um político insistente em bestialidades, por exemplo.
O "rato branco", um dos apelido dele, é um caso estranho. Mesmo morto desde 2011, ainda mete medo em pessoas nas cidades do Vale do Jaguaribe. Muitos silêncios sobre o que já passou ou ainda permanece.
Ninguém quis falar nem sobre o dia do enterro de Expedito Leite, que está logo depois da entrada do cemitério
Em Iracema, onde está enterrado o prefeito Expedito Leite, tocaiado e morto por Mainha em 1977, recebemos mais de uma dezena de "nãos". É também da narrativa.
Ninguém quis falar nem sobre o dia do enterro de Expedito Leite, que está logo depois da entrada do cemitério. Minto, apenas uma senhora contou algumas lembranças para Luana Sampaio - a roteirista.
O cemitério de lá, com o tiziu cantando e pulando insistentemente na cruz de uma tumba rodeada de bamburral cheiroso, tem uma paz que contrasta com o túmulo do prefeito Expedito assassinado covardemente por Mainha.
Mainha - com a morte nos olhos é um documento feito de rastros sobre a manifestação da imperfeição humana e o horror do machismo num sertão violento
Andamos em muitos cemitérios para encontrar os mortos pela pistolagem e o que ainda é atravessado. Inclusive onde Mainha, hoje, é somente um epitáfio com dizeres de lembranças e saudades da família.
"Mainha - com a morte nos olhos" é um documento feito de rastros sobre a manifestação da imperfeição humana e o horror do machismo num sertão violento. A outra face do Semiárido que me devoto desde menino...
Tenho apetite pelo desequilíbrio da narrativa, ando sempre querendo escrever na encruzilhada das histórias. Não estava nas minhas intenções falar, agora, sobre a série do Mainha.
Recordei de beijos definitivos, de inesperados à beira dos marasmos, de juras nunca eternas, de flertes aceleradores de corações no concreto
Iria fabular sobre "paixão, tesão e amor". Foi pedido de uma amiga e leitora - a Angelique Abreu. Comecei a costurar retalhos de relacionamentos meus e dos outros, a desenhar cenas, a catar palavras, lembrei de rupturas, de transas indizíveis, mas resolvi marinar a narrativa.
Recordei de beijos definitivos, de viagens surpreendentes, de inesperados à beira dos marasmos, de juras nunca eternas, de flertes aceleradores de corações no concreto, de presentes atenciosos, de calcinhas puídas, de bilhetinhos e a pasta posta, gentilmente, na escova de dente...
A gente está precisando reencontrar a paixão dentro do amor "maduro" (não gosto dessa "maturidade") ou se reapaixonar e botar as bandas para voar
"Amigo, escreve algo sobre amor, paixão, tesão... Sei que é difícil, mas tuas palavras batem forte na gente, e pra onde me viro é só morte e tristezas", escreveu-me a moça.
Verdade, Angelique, a gente está precisando reencontrar a paixão dentro do amor "maduro" (não gosto dessa "maturidade") ou se reapaixonar e botar as bandas para voar. Eros se coçando. Vou escrever outra crônica. Promessa.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.