Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
Dizem que "Elena" é reluzente, aquela que um dia terá o sol feito um "atá-irû" e choverá um mangue nascente de bichos desencantados, desacelerados e descontaminados do senso comum. Tal qual os personagens de "Imago" - o livro nunca escrito das coisas sem categorizações.
Quando o mundo nem tinha nome ainda das "coisas", das intenções, dos sopapos pelo poder - qualquer que fosse - Elena foi parida. Era o comecinho de algo que não se chamava dia nem de manhã.
Não havia relógio e o tempo não acelerava o juízo dos automóveis possuídos por desmatamentos, guerras, cercas e cidades fedidas feito Fortaleza. E, também, Gaza, essa orgia do fetiche israelense por corpos podres.
Ela mesma, Elena, seria desacompanhada de "amigos de guerra"
Elena, descreve o livro não concebido de Imago - onde não existem personagens típicos, apenas os atípicos em suas realidades desconcertantes -, era desprovida de "marans-irûs". Não vou traduzir do tupi. E em vez de um circunflexo é um til, foi limitação da máquina que me tem atualmente.
Ela mesma, Elena, seria desacompanhada de "amigos de guerra", de invasores e de cupinchas empreendedores. Espécie de gente que se vale do surrupio dos corpos dos outros, até deixá-los em ruínas humanas e dá-lhes a categoria de "aposentados" e inúteis. Mesmo que tenham sido bichos de carroças a vida quase toda.
Elena ainda não é personagem do livro "Imago" - a narrativa de nenhuma editora, mas aparenta estar a se esculpir numa existência na semelhança, por exemplo, das obras de @katerina.kamprani - uma atípica de construções incomodantes. Sem utilidades? Ótimo se fossem, mas infelizmente são no mínimo "obras de arte". Portanto capitais e negociáveis...
Remédios é quase desprovida, 98%, de categorizações do ovo à crisálida
Há um trecho na releitura de "Cem anos de solidão" - um livro para os não-tolos do encantamento perene - que uma leitora me fez desenxergar uma carrada de sensos comuns. Adorei e tive inveja de não o ter concebido. Porque Elena seria uma espécie de Remédios - a Bela.
Uma atípica de propósito de Gabriel, parida no miolo das 446 páginas. Somente quem teve a sensibilidade foi essa moça leitora que me abriu os olfatos. Remédios é quase desprovida, 98%, de categorizações do ovo à crisálida. É, talvez, Elena ainda se nascendo, mas sem a adulteração dos homens e mulheres "bem-sucedidos" na vida.
É escrita do Gabriel. Remédios, a Bela, foi a única de Macondo que permaneceu imune à peste da banana. Empacou numa adolescência magnífica, cada vez mais impermeável aos formalismos, mais indiferente à malícia e à suspicácia, feliz num mundo próprio de realidades singelas.
Para que laços em sapatos? Não se poderia descomplicadamente meter-se nos pisantes?
Ainda escrita dele. Remédios, a Bela, não entendia por que as mulheres complicavam a vida com espartilhos e anáguas de balão e, então costurou para si mesma uma batina de estopa que simplesmente metia pela cabeça e resolvia, sem mais delongas, o problema de se vestir, sem abandonar a impressão de que estava nua. Única forma decente de ficar em casa. Um formalismo do existir.
Para que laços em sapatos? Não se poderia descomplicadamente meter-se nos pisantes? Por que tantas amarras na jornada? É o senso comum da duração humana e que os atípicos desenxergam.
Por não caber por aqui, nem em Macondo, Remédios, a Bela (em seu existir incompreendido e "boba" de nascença), não morreu e tomou outra forma na natureza do incomum.
E o que demonstrava isso, a cada página, era a assombrosa despretensão da moça em importar o que tinha sido "valorado"
Remédios, a Bela, como bem sentiu o coronel Aureliano Buendía, era o ser mais lúcido que havia conhecido. E o que demonstrava isso, a cada página, era a assombrosa despretensão da moça em importar o que tinha sido "valorado" na travessia do subsistir.
"Imago", o livro, tem a ver com borboletas, com os ciclos da lagarta, mas não tenho pretensões nem a ilusão de ficar indo e voltando nisso que se cunhou por mundo.
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