Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
Foto: Samuel Setubal
Manifestação contra PEC da Blindagem, com cartazes e bandeiras na Praia de Iracema
As manifestações de domingo pelo País foram provavelmente as maiores e mais descentralizadas promovidas pelo campo de esquerda em muito tempo. Ao longo da última década, a capacidade de mobilização demonstrada pela direita — em particular o bolsonarismo — era francamente a mais expressiva. A contribuição da Câmara dos Deputados para levar os progressistas às ruas foi inestimável. Não bastava uma pauta, diria assim, reimosa. Ou tóxica, como definiu o próprio Hugo Motta (Republicanos-PB), o presidente da Casa que aprovou as medidas. Os deputados aprovaram logo duas: a PEC da Blindagem e a urgência para a tramitação da anistia. Foi demais.
Os congressistas protestam contra o que consideram avanço do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as prerrogativas deles. Porém, o que se tem visto é um Poder Legislativo no qual há uma maioria bem consolidada, formada pela aliança entre o bolsonarismo e o centrão. Eles não dependem mais de cargos em governos, pois, com as emendas impositivas, possuem uma fatia de orçamento próprio para atenderem às bases eleitorais. Eles acham que tudo podem e não devem mais satisfação a ninguém. O governo não atendeu? Votam pauta-bomba. O STF decidiu de forma incômoda? Vão lá e mudam a Constituição. Assim se formou o cenário para a votação de dois absurdos.
Maquiavel recomendava fazer o mal de uma vez e o bem aos poucos, mas exageraram na overdose de propostas negativas. Nem a direita nem a esquerda esperavam que os protestos tivessem a dimensão alcançada.
Há um contexto que levou a isso. A blindagem é uma despudorada forma de autoproteção para os piores parlamentares. A anistia é um favorecimento ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), amplamente rejeitado, ainda que com um número de seguidores fanáticos também muito significativo. Junta-se a isso o acúmulo que vem desde as sanções dos Estados Unidos ao Brasil, o que complicou a imagem do conservadorismo “patriota” e deu uma bandeira e um discurso a um governo que estava sem rumo.
Adesão
Colegas que estavam na cobertura dos atos de domingo relataram a impressão de que não estavam presentes apenas simpatizantes tradicionais da esquerda. É provável, dado o público consideravelmente maior que outros atos recentes desse campo político. Reflexo aparente da PEC da Blindagem, sobre a qual ninguém conseguiu articular um discurso minimamente convincente nem para os seguidores mais dispostos a aderir a quaisquer argumentos.
Relação complicada
Ao ser votada quase como um encadeamento da PEC da Blindagem, a urgência ao projeto de lei da anistia acabou bastante contaminada pela impopularidade do primeiro projeto. Na esquerda, a ideia de livrar Jair Bolsonaro (PL) é ainda mais mal recebida, mas a PEC da Blindagem tem apelo mais amplo. É uma afronta mais clara. Nem a alegação de perseguição política e a confrontação estabelecida com a anistia passa perto de convencer.
Personagens
A Blindagem parece caminhar para ser sepultada no Senado. Já sobre a anistia, a proposta que parece mais promissora para avançar é reduzir as penas sem anular as condenações. Não agrada nem os bolsonaristas nem os governistas, mas seria o que o centrão está disposto a encampar.
O engraçado foi ver, na articulação da proposta, juntarem-se Michel Temer (MDB), Aécio Neves (PSDB) e Paulinho da Força (Solidariedade). Ficou um jeito de anos 1990. Lembrou aquelas séries ou filmes da Marvel que, quando estão mal de público, trazem personagens de temporadas anteriores. A conferir se alavancarão a audiência.
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