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O transporte e a temperatura política
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

O transporte e a temperatura política

Há décadas, a gestão do transporte coletivo é determinante para todos os prefeitos, para o bem ou para o mal
Tipo Opinião
TRANSPORTE coletivo afeta vários aspectos da vida de centenas de milhares de pessoas por dia em Fortaleza (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS TRANSPORTE coletivo afeta vários aspectos da vida de centenas de milhares de pessoas por dia em Fortaleza

Transporte público é um assunto muito sensível e afeta de forma crucial o dia a dia da população. As condições interferem no trabalho, nos estudos e no período de lazer, no quanto de tempo disponível para o sono e para as famílias. Pode influenciar atrasos e causar problemas profissionais. Ainda que por meio de concessionárias privadas, é um dos serviços públicos que afetam a vida de mais pessoas todos os dias. Fortaleza segue o modelo de quase todas as grandes cidades, nas quais as moradias populares foram cada vez para mais longe do centro. Os mais pobres e com menores condições são aqueles que mais precisam se locomover e que mais demoram nos deslocamentos para as atividades diárias. Isso torna a situação do serviço ainda mais delicada. Inclusive politicamente.

A gestão do prefeito Evandro Leitão (PT) demorou cerca de 48 horas para dar solução para a suspensão das linhas. Era necessário haver medidas concretas já na segunda-feira. Até agora, o que se tem é um recuo das empresas em busca de negociação.

Há décadas, a gestão do transporte coletivo é determinante para todos os prefeitos, para o bem ou para o mal. Maria Luiza Fontenele, em 1985, elegeu-se durante uma greve de motoristas de grande repercussão. Um dos trabalhadores chegou a ser morto a tiro durante o movimento. Ao longo da administração, foram vários os confrontos com empresários e greves de trabalhadores. Houve até uma cartilha municipal que foi acusada de estimular a população a incendiar ônibus e rendeu uma brutal polêmica. A administração promoveu ainda a reorganização das paradas do Centro, transferidas da José de Alencar para a Praça da Estação.

Juraci Magalhães estabeleceu um ciclo político na década de 1990 com muitas obras, mas talvez poucas ações com o impacto da criação dos terminais de ônibus. Na primeira administração de Luizianne Lins (PT), houve congelamento dos preços das passagens, algo sem precedentes pelo menos nas décadas recentes. Roberto Cláudio teve entre as principais marcas o Bilhete Único e os corredores de ônibus. José Sarto (PDT), que saiu muito criticado, teve como legado talvez mais positivo, em qualquer área, a gratuidade para estudantes nos ônibus.

Evandro prometeu ampliar a gratuidade estudantil, mas terá de dar também respostas estruturais para a crise de sustentabilidade do modelo que há décadas já não se sustenta apenas com as tarifas e se torna cada vez menos viável sem mais aporte público, sob pena de se tornar pouco vantajoso para os usuários.
O sistema de ônibus enfrenta o desafio de se tornar atraente para os clientes, circunstância típica do capitalismo.

Até onde devem ir os subsídios

O transporte coletivo é subsidiado em todo o mundo e todos os modais. O metrô tem particular dificuldade de se manter pela via das tarifas. Em São Paulo, maior cidade do Brasil, a Prefeitura destina bilhões em subvenções para os ônibus e o Estado, outros tantos bilhões para o metrô. Sem esses aportes, a tarifa seria tão cara que passaria a ser inviável. E é de interesse da cidade o estímulo ao transporte coletivo. A migração em massa para veículos individuais — ainda mais por moto, com os índices de acidentes — não interessa à cidade.

Mas qual o valor justo de ser pago, e por qual nível de qualidade? Numa cidade do tamanho de Fortaleza, pensar em passe livre universal exige uma engenharia financeira hoje fora do horizonte. Talvez, entretanto, fosse o mais adequado para um serviço que, afinal, tem como fonte de custeio cada vez mais relevante os impostos pagos por todos os contribuintes.

Discussão semelhante cabe, no âmbito da aviação, para lugares que reclamam do corte de voos. No Ceará, a realidade é hoje enfrentada pelo Cariri. A rota para Juazeiro do Norte foi interrompida pela Azul. O Governo do Estado negociou com a Latam, que recebe subvenção do erário e, fora da alta estação, mantém voos quatro dias por semana para a Capital. É aquém da necessidade de uma região com tal importância econômica e social.

Porém, o quanto é legítimo que os impostos de toda a população, inclusive a mais pobre, custeiem voos que serão usados por políticos, profissionais liberais, servidores públicos, empresários, mas dificilmente por essa parcela mais necessitada dos cearenses que ajuda a pagar os serviços?

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