
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Gostaria de mudar de assunto como tema principal da coluna, mas, infelizmente, considero-me impedido de fazê-lo após uma análise reflexiva sobre o que vivenciamos ao longo da semana como desdobramento, e repercussão, da investigação sobre o quase golpe que o Brasil experimentou entre os anos de 2022 e 2023. É assustador que se mantenha vivo e forte no debate um esforço de naturalizar tudo, desconsiderando os elementos muito graves representados pelo que está naquele relatório de 884 páginas produzido pela Polícia Federal.
Um ex-presidente da República que tinha papel central em tudo de criminoso que se falava, pensava e planejava, segue a dar declarações públicas que são aceitas sem o peso crítico que exigiam, apresentando apelos patéticos por uma pacificação pela qual nunca trabalhou de verdade, e, no frigir dos ovos, temos uma sociedade no geral que ainda não conseguiu absorver a gravidade real do que aconteceu naquele período e que pedia um tom de indignação política coletiva que até hoje não veio. Para além das ideologias que envolvem o debate.
Tinha-se ideia de que coisas erradas e fora do aceitável aconteciam por trás do que revelavam os gestos públicos, atitudes e palavras dos governantes de então, mas ninguém, fora daquele círculo no qual a coisa acontecia de verdade, seria capaz de imaginar a dimensão que o cuidadoso trabalhoso policial tem sido capaz de revelar. É surreal que a palavra anistia siga circulando com desenvoltura, indiferente ao perigo real que nos cercou pela ação de uma gente que, diante do que foi descoberto e exposto, não demonstrava qualquer compromisso com a democracia. Por que a nossa resposta, agora, deveria ser o esquecimento?
Por enquanto, a estratégia de enfrentamento dos acusados que têm mostrado disposição de falar, sendo o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro o mais notório deles, apresenta problemas evidentes. A intenção inicial de sugerir ser tudo uma ficção da PF perde terreno diante do volume absurdo de provas que os próprios envolvidos deixaram pelo caminho. Chega a ser assustador que, conforme as carreiras deles indicam em suas trajetórias como militares, estejamos diante do que se define como parte da "elite" das nossas Forças Armadas.
De outra parte, pondo em xeque o slogan famoso "Brasil acima de tudo", que abraçou como mantra, o ex-presidente, em manifestação mais recente como apelo para crescer a pressão em seu favor, sugeriu ao futuro presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um aliado ideológico, que ao tomar posse retalie comercialmente o Brasil para pressionar as autoridades locais por um perdão geral. Nada mais antipatriótico e, claro, o primeiro nome da lista seria o dele.
Bolsonaro e os próximos a ele que são acusados no duro relatório que os indicia por atentaram contra valores democráticos somente serão capazes de zerar a discussão, trazendo-a ao plano sugerido com o apelo tardio por paz no ambiente político nacional, caso, de início, contestem todas as provas inseridas pelos investigadores. Negando a veracidade de documentos que indicam planos concretos de interromper a ordem institucional, através de ações que previam, até, assassinatos de adversários e autoridades, houve quem sugerisse algo próximo à instituição de campos de concentração, era admitida no planejamento a intervenção em poderes, enfim, coisa criminosa no sentido literal do termo. Da mesma forma que seria necessário contestar a veracidade de grande parte dos conteúdos das terríveis conversas captadas pela intercepção dos meios de contato entre eles. Não parece existir uma situação concreta que torne isso possível.
O vereador Gardel Rolim (PDT) já antecipa passos para se adequar à nova realidade com a qual lidará na Câmara de Vereadores de Fortaleza a partir de 2025. Após um tempo de protagonismo, sentado na cadeira de presidente, a intenção é fugir do ostracismo dos espaços comuns no plenário disputados à base de cotoveladas, havendo um projeto de ser candidato à Assembleia em dois anos. A ideia é aproveitar o tempo livre, sem as preocupações que o comando do Legislativo traz junto com o bônus político, para se consolidar como uma espécie de representante da Região Metropolitana. Pode ser uma forma de voltar ao mundo dos mortais.
Sobre a Câmara de Fortaleza, ainda, e o clima pós-eleitoral, chama atenção a falta de defesa da gestão José Sarto (PDT) em meio à onda recente de ataques que tem sofrido pelos problemas na transição e os sinais de que o quadro financeiro no município pode não ser aquele de equilíbrio que se pintava até outro dia. A turma aguerrida que fazia trocação (de discursos) no plenário com a oposição mantém distância dos microfones e deixa os críticos à vontade. É a política exatamente como ela é.
E o União Brasil, de repente, se transformou na noiva cobiçada. As notícias mais recentes dão conta de avanços numa intenção de atrair para a sigla o ex-prefeito Roberto Cláudio, que estaria de saída do PDT. Um grande reforço, sem dúvida, desde que algumas questões sejam resolvidas pelo caminho na perspectiva de uma chapa forte para 2026. Seria difícil, por exemplo,emplacar dois nomes do mesmo partido numa chapa majoritária a ser formada pela oposição, ou seja, RC ou o Capitão Wagner, imaginando-se que estejam correligionários à época, sobraria na composição. Parece ainda cedo para discutir isso, mas não resolvendo agora corre o risco de o problema explodir na hora errada, às portas da campanha.
Os vereadores de Juazeiro do Norte não estão deixando o prefeito Glêdson Bezerra (Podemos) curtir o feito histórico que obteve em 2024 com sua inédita reeleição. Foi acachapante a derrota em votação que aconteceu na semana de um veto de Glêdson a emenda que tinha sido aprovada no Legislativo para o projeto de reforma previdenciária do município. Apenas dois vereadores manifestaram-se pela manutenção, enquanto outros 15 apoiaram a derrubada, anunciando-se, agora, uma disputa judicial. "Vamos questionar", anunciou o líder no Legislativo, Rafael Cearense (Podemos) assim que o resultado se confirmou, avaliando que a manutenção do ítem praticamente anula os efeitos positivos do projeto para os cofres públicos municipais.
É possível que a solução anunciada para Assembleia, com a opção final por Romeu Aldigheri para a cadeira de presidente e os acordos fechados em torno das outras vagas na Mesa, acalme o ambiente político na perspectiva do governo estadual. No entanto, haverá resquícios que ficarão e não será interessante da parte do Palácio da Abolição esperar que a próxima temporada eleitoral chegue para controlar as pequenas fogueiras que seguem ativas. Gestos (falta deles) e palavras de nomes como Sérgio Aguiar, Guilherme Landim e Salmito Filho exigem leitura e talvez demandem ações mais urgentes.
O ano de 2024 não poderia deixar saldo melhor para Evandro Leitão (PT) ao combinar, no fechamento do calendário, sua vitória expressiva como prefeito de Fortaleza e, mais recentemente, no plano pessoal, a volta do Ceará Sporting à elite do futebol brasileiro. Lembre-se que ele começou a ganhar notoriedade pública como dirigente esportivo, antes mesmo de entrar na política. O desafio, a partir de 1º de janeiro, quando assume no lugar do prefeito José Sarto (PDT), é, daqui a um ano, numa perspectiva de análise mais curta, não deixar o fortalezense com aquela sensação dolorosa de que era feliz e não sabia. Pelo que tem insinuado o próprio Leitão, o cenário é de incerteza.
Finalmente vi alguém sair em defesa do general cearense Estevam Teóphilo Gaspar de Oliveira, acusado no relatório da Polícia Federal de ser figura-chave na tentativa de golpe que se orquestrou em 2022. À época comandante do grupo de Operações Terrestres (Coter) o oficial teria assumido o compromisso de liderar as tropas para levar o plano adiante pela força, se necessário, suprindo uma lacuna criada pelo próprio comandante do Exército, general Freire Gomes, que se insurgira contra a ideia. Numa entrevista ao canal Meio, no Youtube, o general Fernando Soares, responsável pelo Comando Militar do Sul naquele período, diz ter participado de todas as reuniões do Alto Comando do Exército e que nunca ouviu qualquer menção dele de apoio a uma ruptura institucional, dizendo-se surpreso com o que aparece na conclusão dos investigadores. Enquanto isso, o próprio General Teóphilo segue calado.
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